Disputas municipais seguem lógica própria, mas as circunstâncias permitem enxergar neste pleito semelhanças com uma eleição de meio de mandato americana.
Nos EUA, a votação para o Congresso no segundo ano de governo de um presidente projeta o futuro e traz recados do eleitorado.
Os recados de agora no Brasil são muitos. O número de prefeituras, especialmente de capitais, ajuda a estabelecer o valor do passe para partidos quando são formadas alianças nacionais.
Desta vez, as siglas de centro, incluindo as que se notabilizam pelo fisiologismo (centrão), aumentaram seu poder de barganha.
O DEM é um caso em destaque, porque pode ser o estofo para mais de uma candidatura de centro-direita: Luciano Huck, João Doria ou a opção por um nome próprio, Luiz Henrique Mandetta.
O ex-PFL fortaleceu-se, ao conquistar três capitais (Florianópolis, Curitiba e Salvador), número que pode crescer para cinco (Rio de Janeiro e Macapá). No total, fez 462 prefeitos, com 98,5% das eleições definidas.
O PSD, do eterno adesista Gilberto Kassab, é outro que sai em alta para negociações futuras, sobretudo porque criou seu próprio fenômeno eleitoral, o prefeito reeleito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil.
Kalil deve ser aliado cobiçado daqui a dois anos, especialmente se vier com força para disputar o governo de Minas Gerais. No cômputo geral, o PSD teve 652 prefeitos, terceira maior força.
Outros expoentes do centro, como PP e MDB, também elegeram prefeitos em profusão. Revigorada, a velha política poderá servir como um elemento novo a se esgueirar entre os polos do bolsonarismo e do petismo.
São as pontas do espectro político que saem machucadas. Contrariando a prudência e sua própria decisão inicial na campanha, o presidente Jair Bolsonaro não resistiu a seus instintos e enfiou-se onde não deveria.
Suas derrotas em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador e Recife são simbólicas. Candidatos alinhados ao presidente tiveram algum sucesso apenas em Belém e Fortaleza.
Sem partido, ele pode aproximar-se de vez do Republicanos, que teve um bom desempenho, com 208 prefeitos eleitos e passagem para alguns segundos importantes, como São Luís (MA) e Campinas (SP).
O partido da Igreja Universal já abriga dois dos filhos do presidente. Outra hipótese é se juntar ao PTB, com 213 eleitos. Menos provável é voltar ao PSL, que teve 91 conquistas.
Na esquerda, o PT desidratou mais um pouco seu número de prefeituras, de 256 eleitas em 2016 para 178 agora. Mas o partido pode melhorar um pouco o desempenho caso saia vitorioso em parte das 15 cidades em que disputa o segundo turno.
Os próprios petistas lembram que o desempenho municipal desastroso há quatro anos não impediu que o partido chegasse ao segundo turno da eleição presidencial em 2018, e elegendo a maior bancada no Congresso.
Ainda na esquerda, Ciro Gomes (PDT) sedimentou a aliança de seu partido com o PSB. Juntos os dois partidos tiveram 562 prefeitos eleitos, pouco mais que o do PT. Isso pode dar gás ao velho sonho de se formar uma alternativa não-lulista de esquerda.
E há, claro, a grande surpresa dessa eleição, o PSOL, que sai vencedor em qualquer hipótese. Se Guilherme Boulos ganhar em São Paulo, os psolistas entram com cacife alto para uma futura frente de esquerda. Se perder, o próprio Boulos tende a ser candidato presidencial, desta vez não mais destinado a figurar como nanico.
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