11.nov.2020 às 23h15
A pandemia deve deixar um grande passivo trabalhista para o já sobrecarregado sistema judicial brasileiro. Até o momento, o número de ações que citam a pandemia em seus pedidos iniciais já chegam a 138 mil na Justiça do Trabalho.
Somadas, essas ações alcançam quase R$ 15 bilhões em verbas trabalhistas.
Levantamento feito a pedido da Folha pela Datalawyer, criador do “Termômetro Covid-19 na Justiça do Trabalho”, aponta que 14.604 processos trabalhistas citam a Medida Provisória 936 ou a regra originada nela, a lei 14.020, que permitiu aos empresários suspender contratos de trabalho ou reduzir jornada e salário de seus funcionários.
Caio Santos, diretor-executivo da Datalawyer, diz que é possível identificar apenas a menção das normas nos pedidos iniciais feitos por trabalhadores. Portanto, não é possível afirmar que em todas houve algum tipo de irregularidade nos acertos de demissões, por exemplo. O número ajuda, porém, a dar dimensão do potencial de novos processos.
Ao utilizar essas medidas emergenciais, os empresários se comprometiam a não demitir seus funcionários enquanto eles estivessem com contrato reduzido ou suspenso e, a partir do retorno, por um período igual ao da vigência da redução ou suspensão.
Para demitir sem justa causa nesse período de garantia de emprego, é necessário pagar uma indenização extra, encarecendo a rescisão. No país, 1,457 milhão de empregadores fizeram 19 milhões de acordos de redução de jornada e salário ou suspensão de contratos com seus funcionários para reduzir custos durante a crise.
Para a advogada Caroline Marchi, sócia trabalhista do Machado Meyer, a primeira questão relacionada à lei passível de judicialização é justamente o cálculo da indenização para a demissão de funcionários no período de vigência do acordo.
“Fiz o acordo para adotar a medida por 90 dias, mas vi que é melhor encerrar em 60 dias e demitir. Vou ter que indenizar, mas eu incluo os 30 dias restantes? Essa é uma discussão importante, de qual é a base de cálculo”, afirma.
O prolongamento da crise também começa a enfraquecer as vantagens da aplicação das medidas. A advogada diz que tem visto clientes optando por não renovar políticas de suspensão de contrato ou redução de salário e jornada para evitar compromisso com a estabilidade.
“Houve um opção até por suspender contratos de pessoas de grupo de risco, por exemplo, mas passa todo esse tempo e a pandemia não vai embora. Vai chegar uma hora que as pessoas vão ter garantia de emprego até além do meio do ano que vem”, afirma.
Essa perspectiva é o que, na avaliação do advogado Jorge Matsumoto, do Bichara Advogados, coloca em dúvida a legalidade da garantia de emprego.
O governo Jair Bolsonaro já prorrogou por três vezes a aplicação da medida. Quando foi apresentada na MP 936, ela valeria por até dois meses para a suspensão de contrato, e até três para a redução de jornada e salário.
A situação econômica ainda cambaleante e a adesão menor do que o Ministério da Economia projetou inicialmente fizeram com que, atualmente, as medidas cheguem a oito meses ao todo. Um trabalhador que fique com o contrato suspenso ou a jornada reduzida até dezembro deste ano, por exemplo, terá garantia de emprego até agosto de 2021.
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