segunda-feira, 23 de novembro de 2020

DEM de Milton Leite tem candidatas com verba pública calibrada mas resultado irrisório nas urnas, FSP

 Ranier Bragon

BRASÍLIA

Comandado pelo vereador Milton Leite, o DEM da cidade de São Paulo destacou-se nas eleições por números grandiosos, para o bem e para o mal.

O partido elevou em 50% sua bancada na Câmara Municipal, em comparação com 2016, teve o segundo vereador mais votado, o próprio Milton Leite, mas também abrigou sete concorrentes a vereadora que estão na lista dos dez candidatos com o voto mais caro da cidade —ou seja, aqueles que receberam considerável dinheiro público para a campanha, mas que, ao final, saíram das urnas com resultado irrisório.

Milton Leite foi o vereador que mais recursos públicos teve para sua campanha, em todo o país, de acordo com as prestações de contas feitas até agora. Ele recebeu R$ 2,4 milhões da verba eleitoral do DEM.

O sucesso que obteve nas urnas —teve quase 133 mil votos, atrás apenas de Eduardo Suplicy (PT)— contrasta com o fracasso de ao menos sete candidatas do partido que declararam até agora despesas eleitorais que vão de R$ 64 mil a R$ 284 mil, mas que não chegaram nem a 600 votos cada uma.

Dessas sete candidatas, cinco se declararam negras.

Vereador Milton Leite, que comanda o DEM na cidade de São Paulo - Facebook do parlamentar

De acordo com as regras eleitorais definidas pelo Supremo Tribunal Federal com base na legislação existente, os partidos políticos precisam destinar as verbas públicas de campanha proporcionalmente aos candidatos negros —determinação que passou a valer a partir de 2020— e às mulheres, nunca em patamar inferior a 30%.

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Em 2018, a partir de reportagens da Folha, estourou o escândalo das candidaturas laranjas, mulheres usadas pelos partidos para simular o recebimento e uso do dinheiro eleitoral que, na prática, ia para outros candidaturas masculinas ou para outros fins.

A prática pode ter ocorrido também nas atuais eleições, também conforme mostrou a Folha, já que o ranking daqueles candidatos com alta soma de dinheiro público em suas campanhas e pouquíssimos votos é formado majoritariamente por mulheres e negros, em contraste com o que ocorre se levados em conta os concorrentes de uma forma geral.

Os dados eleitorais dessa reportagem são fruto de compilação feita pelo Movimento Transparência Partidária, com base em ferramenta desenvolvida pela agência de dados Volt Data Lab.

Das sete candidatas do DEM de São Paulo com o voto mais caro das eleições, a que ocupa a primeira posição é Evelyn Chavez, que declarou despesa de campanha de R$ 284 mil de recursos públicos do DEM e obteve apenas 242 votos, ficando na 893ª colocação.

Ela é filha de imigrantes bolivianos e pautou sua campanha —cujos registros estão em suas redes sociais e em fotos de atos de campanha enviados à Folha pela assessoria de Milton Leite— com a promessa de representar a comunidade do país vizinho que vive na capital paulista.

Nos últimos 20 anos, os bolivianos têm sido, de longe, a nacionalidade mais comum dos que chegam ao Brasil: quase 57 mil deles se registraram entre 1999 e 2019, segundo levantamento feito pela Folha com dados da Polícia Federal, cerca de 20% do total de estrangeiros de todas as nacionalidades nesse período e o dobro do segundo lugar da lista, os chineses.

Folha tentou contato com Evelyn por meio do telefone informado por ela à Justiça Eleitoral, mas não obteve resposta.

Nas despesas que afirma ter feito, Evelyn listou a contratação de 69 pessoas que teriam cumprido a tarefa de realizar "atividades de militância e mobilização de rua". Seus gastos declarados incluem também a locação de quatro veículos, R$ 2.100 de consumo de combustível, R$ 30 mil para advogado e R$ 40 mil para um produtor de vídeos do YouTube, entre outros.

Por meio de sua assessoria, o vereador Milton Leite afirmou que não considera ter havido erro na estratégia de direcionamento de verba para as candidatas e que todas elas fizeram campanha.

"O Democratas foi o segundo partido com maior votação nominal na cidade de São Paulo. Portanto, todas as 62 candidaturas tiveram sua importância dentro da estratégia que proporcionou as seis cadeiras obtidas na Câmara Municipal de São Paulo, um crescimento de 50% em relação ao resultado de 2016", afirmou.

A assessoria de Milton Leite também encaminhou à Folha fotos de eventos de campanha e registros de impulsionamento de conteúdo das candidatas no Facebook.

"Desde o início, o DEM apostou em candidaturas que refletissem nossa sociedade. Por isso uma chapa tão diversa. O partido contemplou a todos de maneira equitativa, não destinou as maiores quantias de recursos apenas para os candidatos com chance de serem os puxadores de voto. Ademais, o partido disponibilizou um suporte individual aos candidatos, tanto para a campanha de rua quanto para a digital", afirmou.

Milton Leite é o principal aliado no Legislativo dos tucanos João Doria e Bruno Covas, e um dos políticos mais populares da região sul da capital paulista.

Ele ampliou sua influência por meio da canalização de centenas de milhões de reais em verbas estaduais e municipais para obras no ano eleitoral para seus redutos. Tudo amplificado pela campanha a vereador mais cara do Brasil.

Conforme mostrou reportagem da Folha do início deste mês, era improvável andar pelos diversos distritos da zona sul sem encontrar propaganda do vereador, muitas vezes perto de obras da prefeitura recém-realizadas ou em andamento.

Campanha de Milton Leite na zona sul de São Paulo - Karime Xavier / Folhapress

Uma das maiores vitrines propagandeadas por Leite foi o anúncio da duplicação da estrada do M’Boi Mirim, uma obra de DER (Departamento de Estradas de Rodagem), do governo Doria, em convênio com a prefeitura, que vai receber investimentos de R$ 446,8 milhões.

O DER está sob o guarda-chuva da Secretaria de Estado de Logística e Transporte, cujo titular é João Octaviano Machado Neto, uma indicação de Milton Leite.

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