Presidente do Conselho Deliberativo da Oxfam Brasil, presidente emérito do Instituto Ethos e conselheiro da Rede Nossa São Paulo e do programa Cidades Sustentáveis; é idealizador do Fórum Social Mundial
Em 5 de outubro, no programa Roda Viva, da TV Cultura, a empresária Luiza Helena Trajano, a mulher mais rica e uma das mais influentes do Brasil, dona do Magazine Luiza, citou a desigualdade como um dos maiores senão o maior problema brasileiro. Ela tem toda razão. As nossas desigualdades —econômica, social, de gênero, de raça, territorial e na representação política— estão entre as maiores do mundo. Exemplo disso é o fato de que apenas 1% da população possui 48% da riqueza nacional.
Ao mesmo tempo, somos a nona economia do mundo. Nosso problema não é falta de recursos, mas a sua distribuição. Uma das estruturas que sustenta e alimenta as nossas desigualdades é o sistema tributário. Em nosso país, quem tem mais paga menos, e quem tem menos paga mais tributos. O sistema é regressivo, taxando mais o consumo e menos riquezas e patrimônios. Brasil e Estônia são os únicos países do mundo que não taxam lucros e dividendos. É um sistema anticonstitucional, já que a nossa Carta Magna determina que reduzir as desigualdades é um dos princípios e objetivos fundamentais do Brasil.
Durante o Roda Viva, quando questionada se aceitaria pagar um imposto sobre grandes fortunas (como é usual em muitos países e até uma demanda de muitos bilionários conscientes pelo mundo), Luiza Helena disse que não gostaria de pagá-lo pelo temor de que o dinheiro seja usado de forma indiscriminada e ineficaz pelo governo. Ela se disse a favor de distribuir recursos, mas desde que tivesse controle sobre seu destino, que fossem bem empregados.
O imposto sobre grandes fortunas existe em muitos países e consta da nossa Constituição. Milionários americanos comandados por Bill Gates pediram recentemente serem mais taxados como forma de reduzir as desigualdades. A proposta da Reforma Tributária Solidária, elaborada pela Fenafisco (Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital) e pela Anfip (Associação Nacional dos Auditores Fiscais) e organizada pelo professor Eduardo Fagnani, propõe uma taxação que varia de 0,5% a 1,5% sobre as 59 mil pessoas (apenas 0,028% da população) com patrimônio superior a R$ 10 milhões. Essa taxação renderia R$ 40 bilhões por ano. O Bolsa Família custa R$ 35 bilhões por ano.
Conheço Luiza Helena há muitos anos. Tenho grande admiração por ela. Sempre, desde a fundação da empresa, advogou e principalmente praticou a responsabilidade social com o genuíno interesse de melhorar a vida das pessoas. Sempre enxergou o resultado financeiro da empresa não como fim, mas como meio de contribuir para melhorar a comunidade e o país. O sucesso da empresa demonstra que praticar a responsabilidade social compensa.
Faço então uma proposta para Luiza Helena: que encampe a ideia de taxar a fortuna dos mais ricos. Os recursos arrecadados com este imposto seriam integralmente destinados a um programa que garanta uma renda mínima para os brasileiros e brasileiras mais pobres.
O programa teria um conselho, com a participação da sociedade, incluindo Luiza Helena e alguns outros milionários brasileiros, que fiscalizaria a correta aplicação dos recursos. Atenderia desta forma à preocupação da grande empresária sobre a necessidade de garantir o uso adequado deste imposto.
Já está mais do que comprovado que programas de transferência de renda para os mais pobres ajudam a reduzir as desigualdades e até reativam a economia. Nossas desigualdades inviabilizam qualquer projeto de um país melhor. Isso passa necessariamente por redistribuir recursos. Esses recursos para os paupérrimos não viriam dos pobres, como sugeriu nosso ministro da Economia, mas dos mais ricos.
Para isso, são necessários vontade política e apoio e participação da sociedade. O engajamento daqueles que têm poder econômico, político e consciência social, como Luiza Helena, é fundamental.
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