Joelmir Tavares
SÃO PAULO
Na quarta-feira (6), João Doria sentou e ouviu. Por duas horas, 57 dos 94 deputados estaduais fizeram perguntas e pedidos ao governador.
Depois ele falou: reiterou aos membros da Assembleia Legislativa a promessa de se reunir com eles todo mês e estabelecer “um debate aberto e franco” tanto com apoiadores quanto com opositores.
As negociações para a formação da base de sustentação do governo do PSDB indicam que a aproximação será mesmo necessária. A divisão na nova legislatura, que assume em 15 de março, vai impor obstáculos ao Palácio dos Bandeirantes.
Três blocos começam a se desenhar, num prenúncio de que as condições para Doria passar projetos serão menos confortáveis do que as encontradas por seus antecessores.
Além das tradicionais base e oposição, completará o clima de cisão a ala que prega independência —alinhamento ao governo em pautas específicas, mas com atuação crítica e eventualmente contrária a interesses do Executivo.
A Casa é historicamente alinhada ao governo, que está nas mãos do PSDB, com alguns hiatos, desde 1995 —foram sete vitórias seguidas de governadores da legenda. A nova legislatura, no entanto, é atípica em vários sentidos.
A começar pelo encolhimento dos tucanos, que sairão das atuais 19 cadeiras para 8, passando de maior bancada a terceira. Fica empatada com a do PSB, partido do ex-governador Márcio França, que disputou o segundo turno com Doria.
A conta soa mais otimista para o governo se forem somados os eleitos por partidos que estavam na coligação do tucano. Com os nomes de PSD, DEM, PP e PRB, a ala presumidamente fechada com Doria chega a 27.
Ao derretimento do PSDB se soma outro fator: a maior bancada no Legislativo paulista passa a ser a do PSL. Hoje sem representante na Casa, a legenda do presidente Jair Bolsonaro saltará para 15.
Tem em seus quadros, por exemplo, a professora Janaina Paschoal, com seus 2 milhões de votos, um recorde.
O PSL anuncia que será da turma dos independentes. Votará com o governo em pautas com as quais concorda, como privatizações e redução do tamanho do Estado, mas poderá se opor em outros projetos.
“Apoiaremos o que for bom, rejeitaremos o que for ruim”, diz Janaina, ao explicar que ela e os colegas vão fazer a análise projeto a projeto. “O que interessa é o bem público.”
Outro polo no grupo independente é o PSB, que tem oito deputados (mesmo número do PSDB) e quer atrair siglas como PV, Solidariedade e Avante, cada uma com um eleito, além de PPS (2) e PR (6).
“Acredito que possamos chegar a 20 deputados”, diz Caio França (PSB), que é filho do ex-governador e foi reeleito. “Não seremos base, mas também não seremos oposição por oposição. Queremos ter liberdade”, afirma ele.
“A Assembleia precisa retomar o protagonismo e ser mais combativa. Que deputados cumpram seu papel fiscalizador, que projetos do governo possam ser corrigidos, que CPIs possam acontecer com mais liberdade.”
O grupo de Caio deve brigar com o PSDB pela adesão de outras siglas. Aliados de Doria tentam também levar para a base bancadas intermediárias e nanicas. No quadro atual, qualquer migalha é pão.
O deputado Carlão Pignatari (PSDB) diz que os sinais são positivos. “Algumas pessoas do PSL já nos procuraram e virão para a base. É um cenário novo, sem dúvida, mas o governo está seguro e disposto a negociar ponto a ponto.”
“O que vai ser diferente é que terá mais radicais à direita e à esquerda”, fala o tucano.
Da esquerda possivelmente sairão as principais contestações ao Bandeirantes. O PT (que caiu de 14 para 10 deputados, mas ainda é a segunda maior bancada) se diz disposto a capitanear a oposição.
O PSOL (com 4 integrantes) também marchará nessa direção. “A Assembleia foi até aqui uma casa muito confortável para as oligarquias”, afirma a psolista Isa Penna, eleita para seu primeiro mandato. “Faremos oposição ao Doria, e uma oposição de expressão.”
Outra particularidade da nova Assembleia é a fragmentação partidária nunca antes vista: 24 partidos têm representantes. Nas próximas semanas, a organização de forças deve ficar mais clara.
A definição passa pela eleição da Mesa Diretora, que ocorre já no dia da posse dos novos legisladores. Arranjos partidários estão sendo costurados para a escolha do presidente, mas não necessariamente se refletirão na base.
O PT, por exemplo, caminha para repetir a parceria com o PSDB na disputa interna e apoiar a reeleição do tucano Cauê Macris para o cargo, mas depois se descolará dele.
Petistas dizem agir pragmaticamente para ter espaço na direção da Casa —desde 2002 ocupam a Primeira Secretaria, segundo posto mais importante na estrutura interna. Mesmo com assento na mesa, farão oposição a Doria.
Além da candidatura de Cauê, estão colocadas as de Janaina Paschoal e Daniel José (Novo), ambos independentes em relação ao governo. O PSOL conversa com outros partidos para lançar um nome do campo chamado de oposição democrática.
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ROBERTO XAVIER DE CASTRO
Há 22 horas