A administração do presidente Jair Bolsonaro, prestes a atingir a marca dos 50 dias, oferece um primeiro esboço de seu modo de funcionamento, embora sujeito obviamente a transformações substanciais. Trata-se de um governo peculiar.
Quadros oriundos do alto oficialato das Forças Armadas constituem a espinha dorsal política. No Palácio do Planalto, nos ministérios e nas estatais, formam uma rede aparentemente articulada incumbida de tocar a máquina federal e de contra-arrestar os vetores estrambóticos que a todo momento espocam no seio do governismo.
A crise envolvendo o ministro da Secretaria-Geral, Gustavo Bebianno, foi a demonstração mais recente e ostensiva da ubiquidade da ala militar, que até a última hora trabalhou para mantê-lo no cargo.
Desde o início da gestão, generais atuaram para desarmar bombas plantadas pelo presidente da República, por seus filhos arruaceiros e por um chanceler que resolveu frequentar a franja lunática do movimento neopopulista.
Não se sabe, entretanto, se esse arranjo inusitado poderá conferir estabilidade duradoura ao governo.
Afinal, estamos diante de um presidente que, embora muito popular, ainda mal começa a fazer valer sua autoridade. Cedo ou tarde pode ter de arbitrar, por exemplo, disputas entre os generais e o czar da economia, Paulo Guedes.
A equipe econômica é a segunda escora a compensar as deficiências do mandatário. Guedes entendeu a centralidade da reforma da Previdência e parece disposto a sacrificar muito —demais até— do programa inicial de abertura externa da economia a título de não perder votos para a mudança do regime de pensões no Congresso.
A tramitação do projeto, ainda a ser apresentado à Câmara, beneficia-se do perfil do eleito para presidir a Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), bem como da experiência do assessor de Guedes para o assunto, o ex-deputado Rogério Marinho.
Mas figuras investidas da articulação política —os ministros OnyxLorenzoni (Casa Civil) e Santos Cruz (Secretaria de Governo) e o deputado Major Vitor Hugo (líder do governo)— inspiram insegurança, por falta de tarimba ou pelo histórico errático no Legislativo.
A opção de não trocar cargos no Executivo por apoio parlamentar também será testada, aliás.
Terceiro pilar do governo, Sergio Moro (Justiça) trilha senda ainda pouco decifrável. Seu pacote anticrime não terá prioridade na Câmara diante do debate previdenciário. Desafiam-no, na prática, as emergências de um país violento, bem como as sementes de escândalos com personagens governistas.
Fora desse triângulo que sustenta Bolsonaro, ideias e personalidades exóticas levitam em epifania.
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