domingo, 17 de fevereiro de 2019

Marketing da matança deixa país sem rumo no combate ao crime,Bruno Boghossian, FSP

Cultura de execuções extrajudiciais vira política de segurança, mas não resolve violência

Ao entrar para a política, o ex-juiz Wilson Witzel (PSC) deve ter perdido o hábito de ler os autos antes de dar uma sentença. O governador se antecipou às investigações e declarou que a operação policial que matou 13 pessoas em favelas do Rio, há nove dias, foi “uma ação legítima para combater narcoterroristas”.
Os parentes dos mortos admitem que eles estavam envolvidos com o tráfico de drogas. Dizem, porém, que eles haviam se rendido e foram executados. Nove deles foram mortos juntos, dentro de uma casa. A polícia afirma que não houve ilegalidade, mas prometeu investigar o episódio. Witzel não quis nem fazer o teatro.
O governador só está interessado no marketing do sangue. Comemorou uma operação que não fez nem cócegas nas grandes facções e tentou explorar o caso para fazer propaganda do suposto “rigor” com que pretende agir contra o crime.
Se Witzel acha que essa é a saída para resolver o caos da violência pública e combater o domínio territorial dos traficantes, o Rio está lascado.
O palavrório do governador chancela uma cultura de execuções extrajudiciais até em situações em que não há confronto armado. O pacote de Sergio Moro, que amplia as hipóteses em que policiais podem atirar sem sofrer punição, é um incentivo adicional ao justiçamento.
No ano passado, o governador Camilo Santana (PT) desviou o olhar dos 14 mortos num tiroteio entre policiais e assaltantes de banco nointerior do Ceará. “O fato é que eles estavam preparados para assaltar dois bancos e não conseguiram assaltar nenhum”, celebrou.
Acontece que seis pessoas eram reféns que haviam sido levados pelos oito bandidos. No início, Santana duvidou: “É estranho um refém de madrugada em um banco”. O governador levou três dias para pedir desculpas às famílias das vítimas.
Quem vê coloração partidária nas declarações de Witzel e Santana não percebe que a matança virou método de governo. Nenhum dos dois parece saber para onde está levando a segurança de seus estados.
 
Bruno Boghossian
Jornalista, foi repórter da Sucursal de Brasília. É mestre em ciência política pela Universidade Columbia (EUA).
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