Há problema quando não aprendemos com os erros das decisões passadas
Acabou o suspense. O Partido dos Trabalhadores tem seu candidato.
Em entrevista à Globonews no dia 6 de setembro, Fernando Haddad reconheceu alguns erros de Dilma que resultariam em uma pequena crise. A severidade da recessão em 2015-2016, porém, foi consequência de o PSDB não ter aceitado o resultado eleitoral.
A tese é quase divertida. Fica o desafio de um trabalho estatisticamente sério que mostre que a conjectura vai além de conversa de botequim.
O candidato parece ignorar o desastre fiscal do governo, que levou a dívida pública a passar de 50% para 70% do PIB em apenas três anos.
O que preocupa mais é a dificuldade de aprendizado. Lula não errou. Os empréstimos do BNDES, a reconstrução da indústria naval, a mudança do marco regulatório do petróleo, a construção das refinarias, e inúmeras outras medidas não foram erradas.
Recente estudo de Ricardo Barboza e Gabriel Vasconcelos documenta que cada R$ 1 emprestado pelo BNDES gerou R$ 0,50 de investimento.
Qualquer avaliação de custo e benefício das atividades dos BNDES no período petista começa com um desperdício de 50%. Para que a perda não seja inaceitável, nos outros 50% o ganho social do investimento, em excesso ao ganho privado, teria de ser surpreendentemente elevado para que as ações do banco não entrem na lista dos imensos desperdícios da década passada.
Eugênio Gudin em coluna para O Globo em 12 de maio de 1961, citando discursos do deputado Raul Gois, escreveu:
"Cita o ilustre deputado: 'Um navio de 10 mil toneladas, a ser construído em Jacuecanga, foi contratado por Cr$ 1.495.000.000,00, preço este que, devido aos favores contidos no contrato, já hoje ultrapassa a cifra de Cr$ 1.680.000.000,00. E um navio de 10 mil toneladas custa hoje, nos mercados internacionais, com a mesma especificação e a mesma velocidade do 'nacional', US$ 3.400.000,00, ou seja, em moeda brasileira, ao câmbio livre (não ao câmbio de custo) Cr$ 680.000.000,00, isto é, um bilhão de cruzeiros a menos que o navio 'dito nacional' ou construído no Brasil'."
Continua o texto de Gudin: "O Brasil está sofrendo por falta de transporte marítimo e não pelo fato de os navios serem construídos aqui, no Japão ou na China. Ora, o problema do transporte marítimo pode ser equacionado, resumidamente, em poucas palavras: Os navios gastam 50% do tempo nos portos; 27% do tempo em reparações e apenas 20% navegando. As tripulações são quase o dobro das dos navios de outras nacionalidades".
"Pois bem, esse problema, sem dúvida árduo e de penosa solução, resolve-se por uma mágica do Sr. Kubitschek, construindo navios no País pelo dobro ou o triplo do preço."
Não há problema se as discordâncias no debate público ocorrem, pois uns desejam enfrentar o problema fiscal por meio de elevação de receita e outros de queda de gasto. Norberto Bobbio já mostrou que esse é o debate natural e necessário em sociedades democráticas.
O problema ocorre quando não aprendemos com os erros das decisões passadas. Não à toa, repetimos o fracasso da indústria naval nos anos 1950, nos anos 1970 e agora nos anos 2000. Em todos os casos, o resultado foi um monte de estaleiros quebrados e pesada conta para os contribuintes.
Mestre Bobbio ficaria ainda mais espantado com a dificuldade dos economistas de "esquerda" com a aritmética.
Coluna de Alexandre Schwartsman, na quarta-feira (12) neste espaço, documenta as dificuldades do assessor econômico do PT, Marcio Pochmann, com os números e as quatro operações.
Samuel Pessôa
Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e sócio da consultoria Reliance. É doutor em economia pela USP.
Nenhum comentário:
Postar um comentário