segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Decisão liminar anula patente de remédio contra a hepatite C no país, FSP


Pedido analisado pela Justiça partiu da presidenciável Marina Silva (Rede)


BRASÍLIA e SÃO PAULO
A Justiça Federal do Distrito Federal deferiu pedido de liminar da candidata da Rede, Marina Silva, e anulou a patente sobre o sofosbuvir, medicamento que cura a hepatite C em mais de 95% dos casos. 
A decisão do juiz Rolando Spanholo, da 21ª Vara da SJDF (Seção Judiciária do Distrito Federal), foi assinada no domingo (23). Segundo o documento, ao dar a patente do sofosbuvir para a farmacêutica americana Gilead, o INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) contraria manifestação do CNS (Conselho Nacional de Saúde) e poderia inviabilizar o cumprimento da meta assumida pelo Brasil de erradicar a doença até 2030.
"É inquestionável que a situação envolvendo a dramática situação dos doentes com hepatite C (que depositam no SUS a esperança da cura) exige uma pronta e firme intervenção do Poder Judiciário", diz o texto. "Afinal, estamos falando da vida de quase um milhão de brasileiros que não podem ser largados à própria sorte (lembrando que, por ano, no Brasil, essa brutal doença ceifa a vida de aproximadamente 3.000 pessoas)." ​

Paciente faz exame para diagnosticar hepatite C
Paciente faz exame para diagnosticar hepatite C - Fernando Nascimento/Folhapress
Ana Lemos, diretora-geral dos Médicos sem Fronteiras, organização que entrou com representação junto ao ministério público federal questionando a patente, comemorou o parecer. "A decisão da justiça é importante porque considera que a análise da patente não pode ignorar seu impacto sobre a saúde pública e a própria vida das pessoas", disse.

Pedro Villardi, coordenador do Grupo de Trabalho em Propriedade Intelectual (GTPI), foi na mesma linha.  "É uma decisão acertada do judiciário brasileiro, é impensável que o INPI pense que decisões técnicas devam ser emitidas desconsiderando a função social da propriedade e a garantia constitucional do direito à saúde", disse.
Países como Egito, Argentina e China não concederam a patente à Gilead e produzem os genéricos. Outras nações, como o Chile, estudam quebrar a patente (licenciamento compulsório) do sofosbuvir.
A candidata havia criticado a decisão do instituto nas redes sociais na terça-feira (18).
"O caso do sofosbuvir, cujo genérico já foi sintetizado pela Fiocruz e autorizado pela Anvisa, é de interesse de saúde pública. O governo deveria liberar imediatamente a fabricação do genérico", disse nas redes sociais.
Antes do sofosbuvir, que revolucionou o tratamento da hepatite C em 2014, o tratamento mais eficaz curava apenas cerca de 50% dos casos. O Ministério da Saúde anunciou um plano para eliminar a hepatite C até 2030, e o SUS passou a tratar todos os pacientes com os novos antivirais, e não apenas os doentes mais graves.
Um convênio entre Farmanguinhos-Fiocruz e Blanver obteve registro da Anvisa para fabricar o sofosbuvir genérico. Em tomada de preços no início de julho no Ministério da Saúde, a Gilead ofereceu o sofosbuvir a US$ 34,32 (R$ 140,40) por comprimido, e a Farmanguinhos ofertou o genérico a US$ 8,50 (R$ 34,80).
Hoje, o ministério paga US$ 6.905 (R$ 28.241) pela combinação de marca. Com a nova proposta, passaria a pagar US$ 1.506 (R$ 6.160), com a Fiocruz e a Bristol. Dada a meta de tratar 50 mil pessoas em 2019, isso significaria uma economia de US$ 269.961.859 (R$ 1,1 bilhão) em relação aos gastos com a combinação sem o genérico.
A Gilead afirmou que ainda não foi notificada sobre a decisão judicial e "não comenta sobre assuntos dessa natureza fora dos autos do processo." "Aproveitamos para reforçar que, para a Gilead, a concessão de patentes equivale ao reconhecimento da inovação dos seus medicamentos, que não tem relação com prática abusiva de preços ou monopólio do mercado", disse a empresa, em nota. 
A assessoria do INPI afirmou que o instituto ainda não foi intimado oficialmente, portanto não irá se pronunciar.  ​
Angela Boldrini , Letícia Casado e Patrícia Campos Mello
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