quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Andrade apareceu; cadê Haddad?, Roberto Dias, FSP

Ebulição cerebral vista no passado parece ter esfriado

As carteiras escolares da ciência política da USP foram, ao menos nos anos 90, habitat frequente de gente decepcionada com a oferta em sala. Tal ambiente era menos perceptível nas aulas de um professor novato de nome Fernando Haddad.
Dedicado e didático, ele tinha especial paixão por debater as teses de Joseph Schumpeter, gênio austríaco que na primeira metade do século 20 ofereceu novos caminhos para compreender a evolução da sociedade.
Schumpeter formatou uma visão cética, pessimista, sobre o capitalismo e a democracia. Espigada a partir de raiz marxista, sua mais famosa expressão evoca a disrupção intrínseca ao sistema —a “destruição criativa” dos empreendedores.
A comparação intelectual favorece Haddad não apenas perante Bolsonaro; ao contrário da última candidata do PT, não precisa listar título que não tem. Também soma mais experiência administrativa do que Lula e Dilma antes da posse, além de ter trabalhado no mercado financeiro.
Mas em algum lugar desse percurso a ebulição cerebral daquele jovem professor parece ter esfriado.
Sua capacidade de autocrítica tende a zero. Único petista a não chegar ao segundo turno paulistano, ele já deveria ter formado explicação melhor para a derrota do que dizer que o eleitor foi induzido a erro —de resto uma muleta de simplificação da lógica política schumpeteriana.
O vazio lógico enche sua campanha. A propaganda petista apaga a existência de Dilma, mas ele finge que isso não acontece. A prisão de Lula (“injusta”) e a Lava Jato (“pretendo aperfeiçoar parte da legislação”) são tratadas como se fossem eventos independentes. O “novo” PT sorri ao lado de Renan como um dia o fez com Maluf. As propostas para a economia não atravessam o pântano das generalidades populistas, mas ele as formula como obviedades.
A estratégia eleitoral fez o “Andrade” crescer e aparecer. Falta agora Haddad mostrar qual destruição criativa poderia provocar na terra arrasada de seu partido e de seu país. 
Roberto Dias
Secretário de Redação da Folha.

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