segunda-feira, 17 de setembro de 2018

Precarização maior é o desemprego, Celso MIng , OESP

Celso Ming, O Estado de S.Paulo
01 Setembro 2018 | 17h00

Certas expressões são tão repetidas que passam a ser consideradas verdadeiras, sem que antes seu significado tenha passado por um mínimo de análise crítica.

Carteira de trabalho: seguro-desemprego
Com o mercado de trabalho ainda cambaleante, desalento bate recorde Foto: Tiago Queiroz/Estadão
Uma dessas expressões é a tal precarização do trabalho. Até mesmo juízes do Supremo que votaram contra a terceirização irrestrita aferraram-se ao conceito da precarização do trabalho, que acontece, justificaram eles com exibição de estatísticas, nas condições do emprego terceirizado.
Antes de prosseguir, vamos ao enunciado-síntese da Coluna. Precarizadas são as condições do atual mercado de trabalho, situação que não é apenas a do Brasil. Mais precarizados do que os postos de trabalho em empresas terceirizadas é o desemprego, que hoje alcança 12,9 milhões de trabalhadores mais 4 milhões entregues ao desalento no País.

Quem usa o argumento da precarização, em geral, faz a comparação errada. Emprego não precarizado, para essa gente, é o da minoria contratada por grandes empresas, em geral estrangeiras, que garantem todos os benefícios da lei mais alguns. E não a situação da grande massa de trabalhadores brasileiros.
Quase sempre, os sindicatos cuidam dos interesses dessa minoria que goza de empregos de qualidade e não liga a mínima para os desempregados e subempregados. Lutam por melhores salários e melhores condições de trabalho dos que participam dessa elite sindicalizada, e não pela melhora de vida dos que estão ralando por aí.
O processo de inserção do brasileiro no mercado de trabalho está longe da conclusão e, no entanto, todo o sistema enfrenta hoje dois impactos enormes de outros dois fatores adversos. O primeiro deles é o avanço da economia asiática, especialmente chinesa, que vai dizimando empregos e salários no mundo.
O segundo fator é impressionante crescimento da utilização da automação intensiva e da tecnologia digital, que está dispensando mão de obra, em setores até recentemente altamente empregadores de pessoal, como o comércio, os bancos e a construção civil.
Não é mais verdade que o aumento da oferta de postos de trabalho depende apenas do crescimento econômico. O Brasil e outros países poderão voltar a exibir PIBs portentosos e, no entanto, o emprego não crescerá na mesma proporção. Não há solução satisfatória para esse fenômeno socioeconômico com graves consequências políticas.
O mercado de trabalho brasileiro enfrenta agora problema semelhante ao do ensino. Nos anos 60, acusaram o então governador de São Paulo Abreu Sodré de ter provocado a deterioração do ensino público no Estado. Ele respondeu algo como: “A prioridade foi dar escola para todos, o que foi cumprido. Nessas condições, não dá para garantir a mesma qualidade do ensino para todos.”
Pergunta: é mais importante proporcionar algum avanço do emprego, ainda que em condições precarizadas, ou continuar exigindo excelência das condições de trabalho quando há tanto desemprego e quando o Brasil (e o mundo) passa por transformações rápidas que provocam grande dispensa de mão de obra?
CONFIRA:

PIB nanico 

A principal informação divulgada sexta-feira com as Contas Nacionais não foi o pibinho decepcionante do segundo trimestre, de apenas 0,2% sobre o trimestre anterior. Foi a revisão do PIB do primeiro trimestre, que cresceu apenas 0,1% e não 0,4%, como havia sido divulgado. Essas revisões são esperadas e continuarão a acontecer, especialmente num trimestre, como o segundo, tão impactado pela greve dos caminhoneiros em maio. De todo modo, o avanço do ano dificilmente ficará superior a 1,5%.

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