Brasil e Portugal viveram, de maneira quase simultânea, cenários que combinavam ações bombásticas de combate à corrupção e momentos de fragilidade econômica. A coincidência permite que se compare como cada país enfrentou a turbulência —e parece cristalino que o segundo se saiu melhor na empreitada.
Em entrevista concedida a esta Folha, o ex-primeiro-ministro socialista português José Sócrates (2005-2011), principal alvo da Operação Marquês, vê uma articulação entre Ministério Público, Justiça e setores da direita para prejudicá-lo.
Não por acaso, ele constrói um paralelo com Luiz Inácio Lula da Silva(PT), que se empenha em desqualificar a Lava Jato por meio do discurso de perseguido pelo Judiciário. Assim, açulou uma polarização política que em nada contribuiu na tarefa de retomar o crescimento —sem desconsiderar, claro, a gestão ruinosa de Dilma Rousseff.
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Portugal, contudo, seguiu por outro caminho. O quadro era de desânimo há três anos: as finanças públicas se encontravam em total desarranjo, e o premiê Pedro Passos Coelho, do Partido Social-Democrata (centro-direita), não conseguiu maioria para governar após as eleições parlamentares de 2015.
Formou-se, então, uma coalizão entre o Partido Socialista e outras legendas menores mais à esquerda, em geral refratárias a alianças —além dos verdes. A esse bloco deu-se a alcunha de geringonça, por sua insólita composição.
Sob o comando do premiê António Costa, o país deu início a uma expressiva recuperação por meio de uma agenda de ajustes que não seguia, ao pé da letra, as imposições dos credores externos —mas sem deixar de cumprir as regras financeiras da União Europeia.
Assim, o governo voltou a aumentar o salário mínimo e dar reajustes ao funcionalismo; em compensação, promoveu cortes de outras despesas e de investimentos em infraestrutura, o que reduziu o déficit orçamentário. A estratégia teve êxito e levou Portugal a uma expansão de 2,7% do PIB em 2017, melhor desempenho desde 2000.
O ciclo virtuoso fez florescer o turismo, importante fonte de receita. Um número crescente de brasileiros viaja ao país ou lá permanece para estudar ou fixar residência.
A situação econômica portuguesa ainda inspira cautela, e a geringonça começa a dar alguns sinais de desgaste. Entretanto parece haver uma base mínima de diálogo e convivência —inclusive do opositor PSD, que aponta falhas, mas reconhece méritos do governo— que muito se distancia da fraturada política brasileira.
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