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Os astecas comiam cogumelos alucinógenos; os antigos hindus fumavam maconha; os romanos misturavam ópio ao vinho. Parece que nunca houve sociedade sem drogas.
Sem contar os usuários das drogas já regulamentadas, como álcool e tabaco, atualmente, entre 3,4% e 6,6% da população adulta do mundo utiliza drogas ilícitas, como maconha, cocaína e anfetaminas.
A maioria destes fará uso eventual, sem maiores consequências ao longo da vida. No entanto, de 10% a 13% desenvolverão problemas de saúde, como dependência, ou contaminação por HIV e doenças infecciosas. O que era para ser recreativo vira patológico.
De cada cem mortes no mundo, uma decorre de atividades relacionadas ao tráfico de narcóticos. Estima-se que os custos dos problemas de saúde relacionados ao uso de drogas ilícitas alcancem de US$ 200 bilhões a US$ 250 bilhões anualmente.
Os prejuízos causados pela atividade ilegal --mas muito lucrativa-- são absorvidos pelo conjunto da população. É como se o povo subsidiasse os traficantes com incentivos fiscais. É o pior de dois mundos.
Em 1961, a ONU aprovou sua Convenção Única sobre Entorpecentes com o objetivo de combater o problema das drogas por meio da repressão à posse, ao uso e à distribuição.
O documento, assinado por 184 países, tornou-se, em grande parte, base conceitual para a elaboração das legislações mundiais sobre o tema.
No entanto, mesmo em países com leis especialmente severas, como Arábia Saudita e Cingapura, o tráfico e o consumo de drogas persistem. O exemplo clássico da ineficácia desse enfoque, a Lei Seca, tentou proibir o consumo de álcool nos EUA entre 1920 e 1933. O que acabou conseguindo foi transformar Chicago num antro de crime e criar personagens da linhagem de Al Capone.
Enquanto se persegue a utopia do mundo sem drogas, o comércio internacional de entorpecentes movimenta cerca de US$ 300 bilhões por ano. Em lugar de contribuir com impostos, esse dinheiro paga propinas e estimula a corrupção das instituições democráticas.
A história mostra que parte da população mundial vai continuar se drogando. Mesmo que, para isso, tenha de desafiar as leis. Se políticas de repressão estrita funcionassem, o Irã não teria uma das legislações mais severas quanto ao tema e um dos piores índices de dependência de heroína do mundo.
Os países que resolveram enfrentar a questão por meio de políticas inovadoras, que consideram o tema como de saúde pública e incluem a descriminalização do consumo de drogas leves, como a maconha, têm tido resultados encorajadores na reabilitação de usuários e no combate à criminalidade e outras consequências negativas da dependência.
A proibição das drogas só dá lucro aos traficantes. Não elimina o consumo nem seus efeitos deletérios, mas impede o controle, a tributação e potencializa o problema. Torna-se um fator de corrupção. Mas, acima de tudo, é irrealista. É tempo de considerar que "um mundo livre de drogas", como quis a ONU, talvez não seja possível. O jeito é conviver com elas pagando o menor preço.
Alexandre Vidal Porto é escritor e diplomata. Mestre em direito pela Universidade Harvard, trabalhou nas embaixadas em Santiago, Cidade do México e Washington e na missão do país junto à ONU, em Nova York. Escreve aos sábados, a cada duas semanas, no caderno "Mundo".
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