José Aníbal
Embora os cardeais do setor elétrico prefiram a expressão “adequar a companhia à nova realidade do mercado”, a intenção do governo de vender pedaços da Eletrobrás -- divulgada pela Reuters -- é senão o resultado da expropriação de ativos sofrida pelas empresas com a MP 579.
Sem se desfazer de parte do patrimônio, a estatal não conseguirá funcionar sob as novas regras. Do sonho petista de criar uma “super elétrica” brasileira ao esfacelamento da “Petrobras” do setor, bastou um estalar de dedos.
Primeiro foi a canetada mágica que decretou o corte dos custos da energia sem alterar a cobrança de impostos. Depois, como o governo planejou novas usinas mas se esqueceu das linhas de transmissão, o prejuízo de R$ 5 bilhões (até aqui) com a energia térmica emergencial iria sobrar para o consumidor -- arruinando a redução da conta de luz prometida na TV.
A solução foi mudar a regra retroativamente e socializar as perdas. Para esconder o vexame, espetaram a conta nas empresas, no mercado livre e até no Luz para Todos. Agora os cardeais se voltam para a desconstrução do “modelo” que nem sequer acabaram de criar.
No caso da conta pelo uso das térmicas, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), órgão interministerial responsável pela proposição de diretrizes estratégicas, foi usado para alterar a regulação em caráter retroativo.
Agora a Aneel intervém num mercado cujas normas foram definidas pelo próprio governo em dezembro passado. Se forem adiante, os cardeais terão o poder de desfazer transações já realizadas, institucionalizando a expropriação do caixa das empresas. É como tentar atrair o investidor gritando “xô”!
A transferência dos prazos de sazonalidade para fevereiro de 2013, ao invés de dezembro de 2012, se deveu única e exclusivamente ao desejo dos agentes do governo de corrigir decisões anteriores. Agora pretendem cancelar a norma definida por eles mesmos há três meses, e então pegar de volta o que garantiram anteriormente.
Nenhuma desculpa, por esfarrapada que seja, foi elaborada a tempo para justificar a intervenção econômica nas empresas. Mas para um bom entendedor não há dúvida: trata-se da tentativa improvisada de remediar o desarranjo institucional em cascata desde a imposição do novo “modelo”.
A captura das instituições, o caos regulatório e a intervenção nas empresas obviamente têm impactos sombrios num setor que, por sua importância e complexidade, deveria ter a estabilidade legal e regulatória preservadas, bem como o bom ambiente para investidores.
Tudo somado, tornam-se evidentes as consequências do apetite eleitoral fora da hora e de uma visão de mundo ultrapassada, autoritária e estatizante.
A máquina de propaganda do governo demoniza à vontade seus desafetos. Mas os fatos estão aí. Os contratos em vigor não valem rigorosamente nada, 70% das obras de transmissão e 60% das obras de geração em andamento estão atrasadas e uso das térmicas pode custar R$ 11 bilhões até o final do ano.
O setor elétrico está desgovernado.
José Aníbal é economista, deputado federal licenciado (PSDB-SP) e secretário de Energia de São Paulo. Escreverá aqui sempre às quartas-feiras.
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