A exoneração dos promotores do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco), anunciada na última sexta-feira, representa um revés para o inquérito sobre a autoria dos assassinatos de Marielle Franco e de Anderson Gomes, cometidos em 14 de março de 2018.
Responsável pelas investigações do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) sobre o duplo homicídio, o Gaeco se desfez justo quando queimava um dos últimos cartuchos para chegar aos mandantes: o cruzamento de dados digitais entregues pelo Google no recesso de fim de ano.
A remessa das informações encerrou uma longa e desgastante negociação com a Google americana, que relutava em fornecer dados sigilosos sobre seus usuários. Para dobrar resistências, o Gaeco então delimitou o campo de pesquisa. Traçou dois perímetros, com base na triangulação de antenas (ERBs), no local dos assassinatos, no Estácio, Zona Norte do Rio, e no local onde estava um dos principais suspeitos do mando do crime. Depois, reduziu a solicitação de clientes que pesquisaram na plataforma digital o nome de Marielle e outras combinações ligadas à vereadora dias antes dos crimes.
Linhas de investigação
O cruzamento dos dados dos perímetros, ainda sob análise, mostrará se houve algum contato entre o suspeito e os executores. Caso esse contato venha a ser comprovado, o inquérito sobre os mandantes estará resolvido.
Sobre a segunda linha de apuração, a das pesquisas no Google, a expectativa é apenas a de reforçar as provas já colhidas contra os executores, os ex-PMs Ronnie Lessa e Élcio Queiróz, que estão presos e serão levados a júri popular pelos dois assassinatos.
Porém, se os cruzamentos fracassarem, restarão apenas as quebras de alguns celulares apreendidos durante as investigações, uma eventual confissão dos réus para abrandar as penas ou ainda uma delação de presos, acusados de integrar a milícia de Rio das Pedras, na Zona Oeste do Rio, que teriam supostamente conhecimento sobre a autoria.
No momento, prevalecem três linhas de investigação sobre os mandantes. Todas estão relacionadas à atuação política de Marielle Franco, especialmente no campo dos direitos humanos e na questão fundiária. A vereadora pode ter esbarrado em interesses da milícia na Baixada de Jacarepaguá. Outra possibilidade é o crime de vingança, pela atuação do atual presidente da Embratur, Marcelo Freixo, quando era deputado estadual pelo PSOL e presidiu a CPI das milícias. Também não está descartada a hipótese de que a autoria se esgote no próprio executor, Lessa.
Ao tomar posse, o novo ministro da Justiça, Flávio Dino, anunciou que a investigação sobre o Caso Marielle seria prioridade em sua gestão. Como já existe decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido de reconhecer a competência das autoridades estaduais (MPRJ e Polícia Civil) para investigar o caso, a Polícia Federal (PF) só pode atuar se for chamada a colaborar pelas instituições fluminenses. Outra possibilidade, remota, seria a de comprovar graves falhas no trabalho de investigação.
Os 29 membros do Gaeco pediram exoneração na sexta-feira passada após a recondução ao cargo do procurador-geral de Justiça, Luciano Mattos. Eles alegam que havia um compromisso, assumido por Mattos, de aceitar a indicação do nome mais votado da classe, a colega Leila Costa. Em nota, o procurador-geral criticou os colegas por usarem os cargos para “fins eleitorais” da política interna, “colocando em risco a higidez dos trabalhos em andamento”.
Pela terceira vez, em quase cinco anos de investigação, o MPRJ mudará os promotores responsáveis pelo caso. Na Polícia Civil, a Delegacia de Homicídios da Capital (DH) já teve cinco titulares desde a morte de Marielle. Essas mudanças eventualmente obrigam os novos encarregados a começarem do zero, lendo dezenas de volumes sobre os crimes.
Com informações do Jornal O GLOBO.