Sistema político flexível acomoda presidentes sem apetite ou força para costura parlamentar
A aprovação da reforma constitucional que obriga o governo a honrar as emendas coletivas dos congressistas não deve ser vista apenas como resposta circunstancial ao presidente Jair Bolsonaro (PSL).
Inscreve-se num longo processo de ascendência do Legislativo federal em que superpoderes presidenciais vieram sendo mitigados.
Nessa marcha, asfixiou-se a margem para o Executivo negociar liberação de verbas por apoio parlamentar. Limitou-se sua prerrogativa de editar medidas provisórias.
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A Lei de Responsabilidade Fiscal minou o arbítrio dos administradores. Regulamentos e movimentações de parlamentares e operadores do direito inibiram o uso de canais extraorçamentários, como a Petrobras e o BNDES, pelo mandonismo do presidente da República.
O sistema resultante parece ter-se tornado plástico o suficiente para lidar com presidentes fracos, como foram Dilma Rousseff (PT) após a reeleição e Michel Temer (MDB) após o escândalo da JBS.
Também mostra flexibilidade para acomodar-se à simbiose entre a maioria do Legislativo e o Executivo —marca da primeira fase da gestão do emedebista— e, agora, à sua antítese. Bolsonaro, afinal, montou o ministério à revelia do Congresso, onde não faz questão de apoio majoritário regular.
Mas uma coisa é o Legislativo, fortalecido no processo, exibir capacidade de absorver choques sem produzir ruptura —e de preencher, até certo ponto, lacunas deixadas por presidentes sem força ou apetite para a costura parlamentar.
Outra, diversa, é esse dispositivo oferecer as respostas certas e tempestivas aos desafios do desenvolvimento do país. Apenas metaforicamente esse arranjo pode ser chamado de parlamentarismo branco. Na verdade, trata-se de um modo pouco produtivo e estável de operação do nosso presidencialismo.
Recordem-se as pautas destrutivas para as finanças públicas aprovadas no Congresso nos estertores do governo Dilma. Ou o parasitismo autoritário de caminhoneiros sob um Temer inerte em 2018.
O fato de hoje haver dois presidentes bem mais responsáveis na Câmara e no Senado representa um alívio apenas relativo e temporário, pois eles não comandam a maioria dos legisladores nem estarão no posto daqui a dois anos.
Se o objetivo é estabilizar as expectativas da população e dos agentes econômicos sobre o avanço da agenda reformista para tirar o país do buraco, nada é mais eficaz que a atuação decidida do presidente da República no sentido de estabelecer e manter uma base sólida de apoio no Congresso Nacional.
Jair Bolsonaro dá sinais de ter melhorado sua conduta. Diminuíram nas últimas semanas os estampidos de desarmonia vindos do seu governo. Falta assumir a tarefa de coordenar o pacto político no Congresso. No Brasil, não há substituto perfeito para semipresidentes.