E o BC tinha razão
Os mais otimistas já falam em 6,5% como ponto final do ciclo de cortes da Selic
Fernando Dantas *, Impresso
08 Setembro 2017 | 05h00
Quando Ilan Goldfajn tomou posse na presidência do Banco Central (BC) em 9 de junho do ano passado, as expectativas do mercado eram de que o IPCA, o índice oficial da meta de inflação, atingisse 5,5% em 2017 e 5% em 2018 – acima, portanto, do objetivo de 4,5%. Já a mediana das projeções da Selic, a taxa básica de juros manipulada pelo BC, indicava o nível de 11% no final deste ano e de 8,5% ao fim de 2018.
A economia despencava no olho do furacão da pior recessão em um século, e o mercado projetava uma queda de 3,6% do PIB em 2016 (o número final foi exatamente esse), depois de já ter caído 3,8% em 2015.
O recém-empossado presidente do BC teve de tomar decisões difíceis desde o início. Ele recusou a ideia de introduzir uma meta de inflação “ajustada”, acima dos 4,5%, para 2017, como tentativa de evitar maior sacrifício da economia. A seu ver, era vital enterrar de vez a percepção, ligada à gestão anterior, de que o BC não perseguia a meta para valer.
Nas duas primeiras reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) sob o comando do novo presidente, a Selic foi mantida em 14,25%, mesmo com a economia nas cordas. Era necessário esperar sinais mais concretos de convergência da inflação para a meta.
As decisões do BC foram reforçadas pela entrada na diretoria da instituição e no Copom, a convite de Ilan, de dois dos melhores macroeconomistas do Brasil, Carlos Viana e Tiago Berriel. Viana reformulou a comunicação nos documentos do BC, tornando-a mais direta e menos cifrada.
A partir de 19 de outubro do ano passado, quando o Copom decidiu reduzir a Selic para 14%, iniciou-se o longo e profundo ciclo de cortes da taxa básica, que ainda não acabou.
À medida que os cortes foram se sucedendo e aumentando de tamanho, de 0,25 ponto porcentual para 1 ponto, a economia não reagiu como esperado. A inflação, entretanto, despencou, surpreendendo com repetidas quedas além do que era previsto pelos analistas. O IPCA acumulado em 12 meses saiu de 8,84% em junho de 2016 para 2,46% em agosto de 2017.
Ilan e seus companheiros sofreram muitas críticas por terem supostamente “errado a mão”, demorando para cortar a Selic e piorando a recessão. A “prova” seria a inflação “baixa demais”. Efetivamente, o IPCA pode ser até menor que 3% em 2017, rompendo o limite de tolerância para baixo.
É útil, de qualquer forma, comparar as expectativas do mercado de quando o presidente do BC assumiu, mencionadas acima, com as atuais. Hoje, a mediana do mercado para o IPCA de 2017 está em 3,38% (esse número deve cair) e a de 2018, em 4,18%. A projeção para a Selic é de 7,25% no final de 2017 e 7,5% ao fim de 2018.
Ah, mas o que aconteceu com as previsões do PIB, que teria sido tão castigado pela política monetária do BC?
Quando Ilan assumiu, eram de crescimento de 1% em 2017 e de 2% em 2018. Hoje são de alta de 0,5% em 2017 e de 2% em 2018. O detalhe é que, com as recentes surpresas positivas em indicadores de atividade, a tendência é que essas projeções subam tanto para este ano quanto para o próximo.
Mas o sucesso da política monetária não para por aí. Diversos analistas interpretaram o comunicado da reunião do Copom terminada na quarta-feira, quando a Selic caiu para 8,25%, como indicativo de que o ciclo de cortes pode ir até um pouquinho mais longe do que se pensava. Os mais otimistas já falam em 6,5% como ponto final.
É verdade que Ilan contou com a sorte: um cenário internacional muito favorável, que valoriza o real, o que ajuda a reduzir a inflação; e uma tremenda queda dos preços de alimentos. Por outro lado, esses fatores que o BC não controla também explicam por que a inflação caiu tão abaixo da meta.
A moral da história é que ter um BC autônomo que de fato cumpre o seu dever de perseguir a meta de inflação só traz benefícios para todos os brasileiros.
* COLUNISTA DO BROADCAST E CONSULTOR DO IBRE/FGV