PRIVATIZANDO
Captação de recursos deve ser de até R$ 9 bilhões, mas a base do governador aprovou emenda destinando apenas 30% do valor para melhoria dos serviços
por Rodrigo Gomes publicado 06/09/2017 15h35
EDUARDO CARMIM/BRAZIL PHOTO PRESS/FOLHAPRESS
Projeto da holding é de autoria do governador Alckmin e busca aumentar a participação do mercado na Sabesp
São Paulo – A Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) aprovou ontem (5) o Projeto de Lei (PL) 659, de 2017, de autoria do governador Geraldo Alckmin (PSDB), que cria uma holding – grupo que detém a posse majoritária de ações de outras empresas – para exercer o controle da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). A justificativa do governo paulista para a medida é captar até R$ 9 bilhões no mercado que deverão ser aplicados na ampliação dos serviços prestados pela companhia. No entanto, a base do governador aprovou emenda destinando apenas 30% do valor que vier a ser arrecadado para melhoria dos serviços de fornecimento de água e captação de esgoto.
A oposição foi contra o projeto e tentou emplacar uma emenda para que 100% dos recursos captados com a venda de ações fossem destinados à melhoria dos serviços. A proposta foi rejeitada pela base aliada ao governador. "O Estado não está fazendo essa operação para investir no saneamento. Tanto é que a bancada do PT fez uma emenda dizendo que 100% dos recursos obtidos com a venda das ações dessa nova empresa deveriam ser revertidos em saneamento público. A base do governo disse não", lamentou o deputado Alencar Santana, líder do PT na assembleia.
Para os parlamentares de oposição, não há garantia de que os dividendos dos negócios da Sabesp serão aplicados para a universalização da coleta e tratamento de esgoto e do fornecimento de água à população paulista. Regiões como a Baixada Santista e Campos do Jordão, locais de intenso movimento turístico em épocas diferentes do ano, ainda despejam esgoto sem qualquer tratamento nos rios. Já a capital paulista segue dependente de sistemas de abastecimento que não garantem segurança hídrica em caso de falta de chuvas, como ocorreu na crise de 2014 e 2015.
Para o presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente (Sintaema), Rene Vicente, o projeto interessa apenas ao mercado, que vai ter mais espaço para interferir nas políticas da empresa. “Isso pode colocar a universalização do saneamento à população em segundo plano para privilegiar a busca por lucro, mais do que já ocorre hoje”, afirmou.
Desde 2002, a Sabesp tem capital aberto, com ações negociadas nas Bolsas de Valores de São Paulo (BM&FBovespa) e Nova Iorque (NYSE). O governo paulista mantém metade das ações e permanece sócio majoritário da companhia. Mas boa parte do lucro obtido, que poderia ser investido em saneamento, acaba sendo destinado ao pagamento de dividendos aos acionistas. De 2003 a 2013, a companhia distribuiu R$ 4,3 bilhões entre os investidores.
Após dois anos de um período de severa seca na região metropolitana de São Paulo (2014-2015), a Sabesp lucrou R$ 2,947 bilhões em 2016. Desse montante, R$ 823,5 milhões foram destinados aos portadores de ações da empresa. No entanto, os investimentos da companhia caíram – em 2016, apenas R$ 5,3 milhões foram destinados a investimentos.
Na avaliação do assessor de saneamento da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU), Edson Aparecido da Silva, mesmo que o governo paulista detenha menos ações, não perde o controle acionário da empresa, mas sofrerá mais influência. “Com a criação de uma holding, a tendência é que os acionistas tenham maior poder de decisão nos rumos da empresa. Essa proposta tende a ampliar a privatização do saneamento básico, com a pulverização de ações, sob argumento de que é necessário buscar recursos para ampliar investimentos”, completou Silva.
Em audiência na Alesp na semana passada, o presidente da Sabesp, Jerson Kelmann, defendeu o projeto e disse que ele não representa a privatização da empresa. "Ele não se destina à privatização da Sabesp, mas capitaliza recursos. É uma maneira de trazer dinheiro para a companhia", disse. Kelman alegou que a operação é necessária para que mais obras sejam estendidas à população. "Seja na água ou no esgoto, isso não significará a perda do controle. A Sabesp continuará sendo uma empresa estatal", afirmou.
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