domingo, 15 de junho de 2014

'Para funcionar, metrópole tem de ser vertical'


EDISON VEIGA - O ESTADO DE S.PAULO
15 Junho 2014 | 02h 04

Dono de construtora, Otávio Zarvos defende que pessoas morem mais perto umas das outras

"Se o novo Plano Diretor vai ser um avanço, não é porque o prefeito é um gênio ou porque os construtores querem erguer mais prédios. É porque a sociedade já entende que uma metrópole precisa ser mais verticalizada para funcionar melhor." A frase é do administrador de empresas Otávio Zarvos, de 47 anos, proprietário da construtora Idea!Zarvos, grande responsável pela transformação pela qual passa o bairro da Vila Madalena - nos últimos dez anos, ele construiu (ou começou a construir) 19 prédios comerciais e residenciais por ali.
Zarvos não só gosta, como acredita no que faz. Seus prédios são autorais - assinados por arquitetos de primeiro time, como Isay Weinfeld, e os escritórios Triptyque, Nitsche e FGMF. Têm um conceito e identidade, não poderiam estar em outro bairro. "Eu gosto de arquitetura. E não acho que seria possível fazer esses prédios em outra região. Eles têm a ver com a Vila Madalena", afirma.
Quando lembram que ele é um dos "culpados" pela valorização imobiliária do bairro nos últimos anos, Zarvos não refuta. Mas se justifica.
"Há dez anos, a Vila só tinha vida noturna. Durante o dia, era completamente parada. Comecei a construir prédios de escritórios, propiciando que o sujeito que já gostava do bairro também trabalhasse aqui - muitas vezes, pertinho de casa", defende. "Isso é o máximo que eu posso fazer como urbanista sem ser prefeito da cidade."
Ele não quer ser prefeito. Mas acredita que a cidade será (ou seria) melhor se as pessoas morassem mais perto uma das outras. "O custo da infraestrutura cairia, e o metrô serviria melhor. O trânsito seria menor, já que os deslocamentos também seriam reduzidos", enumera.
"Não faz sentido sua empregada morar a 30 km de sua casa", afirma o empresário. Por isso, a verticalização. "Não sou bonzinho. Sei que com isso eu ganharia mais. Mas a cidade também ganharia", diz.
Respeito. Dos arquitetos, ele conquistou respeito. "Acho que o Otávio percebeu que as pessoas hoje querem morar de um jeito diferente - mais relaxadas, com menos pompa. Comunicou-se fácil com a sua geração", comenta Isay Weinfeld.
Para Lourenço Gimenes, do escritório FGMF, Zarvos conseguiu criar uma nova maneira de fazer empreendimentos, com uma postura diferente. "Ele apostou no caminho de valorizar o projeto e, com isso, conseguiu criar uma marca que usa o design como instrumento de venda e imagem. Hoje, outras incorporadoras tentam replicar seu sucesso, mas nem todas entendem que, para fazer bem feito, é preciso fazer com o estômago, não com a planilha", define.
Claro que, ao lado dos elogios, as críticas também vêm. "Como minha história é ligada ao bairro da Vila Madalena, sou cobrado pelos vizinhos. A comunidade sabe onde moro, sabe onde trabalho", explica Zarvos. "Mas mesmo os que são contra mais prédios costumam dizer que, entre um prédio feio e um prédio nosso, é melhor um nosso."

Energia de sol e vento


CELSO MING - O ESTADO DE S.PAULO
15 Junho 2014 | 02h 06

O Brasil está perdendo grande oportunidade de ampliar o uso de fontes alternativas de energia. Apesar do aumento da produtividade e da redução de custos, a energia eólica corresponde a apenas 1,1% na matriz elétrica brasileira e a fonte solar nem sequer é citada no Balanço Energético Nacional 2014 (BEN).
Em média, o megawatt-hora (MWh) gerado pelos ventos foi contratado por R$ 129,97 no leilão realizado no último dia 6 pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), valor 30% mais baixo do que os R$ 184,65 alcançados no primeiro leilão, em 2009. É uma energia já mais barata do que a gerada nas Pequenas Centrais Hidrelétricas - PCH (R$ 161,56) ou nas centrais processadoras de bagaço de cana (R$ 174,83), óleo combustível (R$ 192,52) e óleo diesel (R$ 203,59).
A redução de custos deveu-se principalmente à instalação no Brasil de fábricas de aerogeradores, pás e ao desenvolvimento de equipamentos mais potentes, como aponta Eliane Fadigas, professora do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (IEE/USP). "No Brasil, os ventos apresentam uma produtividade média de 42%, enquanto a europeia é de 25%", explica Elbia Melo, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeólica).
Velhos problemas ainda são enorme encrenca. Para Guilherme Valle, especialista em Energia da consultoria PwC, os principais entraves são os atrasos na instalação das redes de transmissão e as complicações que envolvem a concessão de licenciamento ambiental para instalação dos parques eólicos.
Eliane Fadigas também fala das dificuldades de natureza fundiária. Muitas áreas propícias à instalação dos cataventos não são regularizadas e não dispõem sequer de registro no Incra, por onde iniciativas assim têm de começar.
Nos Estados Unidos e na Europa, onde os parques eólicos eram considerados boa resposta ambiental, cresce a oposição de ambientalistas, pelos altos índices de mortandade de pássaros, geração de ruídos e "poluição visual".
Elbia Melo, da Abeólica, argumenta que as licenças ambientais brasileiras já consideram as rotas migratórias de aves desde 2000. Além disso, os avanços tecnológicos elevaram a altura das torres, o que tem evitado as colisões de pássaros e de morcegos. Ela também considera que o barulho deixou de ser problema, já que os equipamentos mais recentes produzem ruídos de até 50 decibéis, o mesmo produzido pelo funcionamento de um escritório situado na Avenida Paulista.
"No Brasil, os parques ficam fora dos perímetros urbanos e não geram esses impactos", diz. A Abeólica calcula que a participação da fonte eólica na matriz elétrica brasileira atingirá 5,2% até 2022.
Enquanto o setor eólico experimenta crescimento virtuoso, a geração de energia por fonte solar ainda engatinha. Em leilão realizado em novembro de 2013, nenhum dos 31 projetos emplacou. Como não sai negócio, não há preço de referência, informa a Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Outro leilão está previsto para o dia 10 de outubro.
A coordenadora do Grupo de Estudos em Energia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Antônia Diniz, reconhece que o setor enfrenta altos custos e a dependência de componentes importados para as células fotovoltaicas, a alma desse equipamento, que convertem a luz em energia elétrica.
A geração de eletricidade a partir de energia solar em residências é regulamentada pela Aneel desde 2012, mas os custos ainda são altos. A Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) calcula que a instalação de placas fotovoltaicas não sai por menos de R$ 20 mil para atender ao consumo médio de 300 quilowatts-hora por mês de uma residência em São Paulo. O consumidor levaria entre 7 e 14 anos para ter o retorno do investimento em economia na conta de luz, a depender da eficiência das placas na geração de energia.
Relatório da Agência Internacional de Energia (AIE) mostra que 80% dos investimentos em energia na Europa nos últimos 10 anos foram para fontes renováveis, 60% dos quais só para energia eólica e solar fotovoltaica. Para Suzana Kahn, professora da Coppe/UFRJ, o Brasil pode ficar para trás. "Independentemente dos problemas de abastecimento, essa é uma questão de segurança energética", diz. Aliadas a outras fontes geradas localmente, as energias eólica e solar podem ajudar a reduzir a dependência brasileira na importação de combustíveis. / COLABOROU DANIELLE VILLELA

Retomar o crescimento


AMIR KHAIR - O ESTADO DE S.PAULO
15 Junho 2014 | 02h 03


A vitória da seleção brasileira na inauguração da Copa foi um bom sinal para animar a esperança que pulsa no coração do brasileiro no principal esporte do País. As ameaças à não realização dos jogos não foi suficiente para impedir a presença e a circulação dos 60 mil torcedores que lotaram a Arena Corinthians. Foi um bom começo e pode durar até meados do próximo mês caso a seleção chegue à final. Depois disso as atenções se deslocam para a disputa eleitoral para os governos dos estados e Presidente da República.
As últimas sondagens dos principais institutos de pesquisa apontam a possibilidade crescente de ocorrência de um segundo turno. Nesse caso as propostas em debate poderão ficar mais claras aos eleitores, que estão ávidos por mudanças, mas não querem perder os avanços ocorridos na renda e no emprego, que são trunfos importantes do atual governo.
O tema do crescimento econômico será provavelmente o mais importante juntamente com a prestação dos serviços públicos na vida das pessoas. É o transporte coletivo, a mobilidade urbana, a segurança, a saúde, a moradia e o lazer, que precisam melhorar.
Pode-se afirmar que os dois últimos governos melhoraram a renda e sua distribuição, mas pouco fizeram para atender os anseios crescentes dos milhões de brasileiros que ascenderam à classe média e que reivindicam melhor condição de vida, a começar pela mobilidade urbana, que tira do brasileiro diariamente parcela significativa do seu tempo no trânsito e que foi agravada pela política de estímulo ao uso do automóvel. Esse estímulo atende à política do governo de aumentar a produção da indústria automobilística, que desde o governo Lula foi eleita o carro chefe do crescimento econômico devido ao seu elevado fator multiplicador para a geração de emprego.
O governo Dilma agravou ainda mais a mobilidade urbana ao retirar a tributação da Cide sobre a gasolina e impor à Petrobrás o subsídio à gasolina. Além disso, reduziu o IPI do automóvel. O resultado foi entupir mais ainda a saturada rede viária de transporte nas cidades.
As manifestações de junho do ano passado elegeram a mobilidade urbana como o pesado ônus que sacrifica toda a população que necessita circular nas cidades. A presidente prometeu melhorá-la, mas com essa política de privilegiar o transporte individual foi na direção contrária. Isso pode ser fator importante a pesar nas eleições contra si.
Crescimento. Quanto ao crescimento econômico este ano é mais um perdido e se atingir 1,5% vai dar a média de 1,9% ao ano para este governo, nível inferior ao período negro de 1981 a 2003, que atingiu média anual de 2,0%.
Vários erros ocorreram na condução da política econômica. Depois de crescer 7,5% no último ano do governo Lula, Dilma iniciou seu governo pisando no freio do crescimento ao decidir pela adoção de medidas macroprudenciais para encarecer o crédito, temendo a inflação. Quando percebeu o estrago causado pelas medidas macroprudenciais retirando-as já era tarde e o crescimento em 2011 caiu para 2,7%, carregando o estrago para 2012 que baixou mais ainda para 1,0%.
Não foi por falta de tentativas, no entanto, que o governo não conseguiu fazer o País crescer. Desonerou as empresas da quota patronal do INSS, reduziu tributos, lançou o pacote de concessões nos modais de transporte para atrair o investimento privado e tentou reduzir os juros, mas logo recuou diante da reação do sistema financeiro. As medidas se sucediam sempre com a promessa de retomada do crescimento. Como não ocorreu, a frustração foi tomando conta da sociedade, a tensão política e social foi crescendo e a popularidade da presidente despencando.
Creio que para retomar o crescimento é fundamental reduzir os preços da economia e para isso tirar a gordura do sobrepreço causado pelos juros que oneram os bens e serviços. Segundo a Associação dos Executivos de Finanças, Contabilidade e Administração - Anefac a taxa de juros ao consumidor para financiamentos em doze meses registrou as seguintes médias anuais: 119% em 2011, 102% em 2012, 90% em 2013 e voltou a subir este ano atingindo 101% no último mês. Isso significa dobrar os preços para financiamentos com prazo de doze meses. É fundamental desintoxicar o organismo do mal causado pelo excesso de juros. Ao reduzir o componente juro dos preços se atinge simultaneamente a redução da inflação e se ativa o crescimento econômico.
O desafio, portanto, é reduzir os juros e como fazer é a questão. Penso que se deve começar pelo sistema bancário. Os bancos no mundo todo vivem dos empréstimos que oferecem aos seus clientes. Aqui é diferente, pois o Banco Central presenteia os bancos com duas importantes fontes extras de lucros: os ganhos de tesouraria nas aplicações em títulos do governo com a Selic elevada e as tarifas bancárias exorbitantes que são praticadas. Ao reduzir a Selic ao nível internacional, que é o da inflação, e ao tabelar reduzindo as tarifas bancárias os bancos são direcionados à sua função principal que é a oferta de crédito. Assim, a concorrência se amplia e as taxas de juros refluem.
Ao reduzir a Selic cai a atratividade ao capital especulativo internacional, que retira anualmente do País em média US$ 10 bilhões em juros nas aplicações em títulos regados a Selic. Ao reduzir o ingresso deste capital especulativo o câmbio passa a fluir para novo ponto de equilíbrio que estimo próximo de R$ 3,00/US$. Isso ativa o sistema produtivo ao devolver parte da competitividade retirada das empresas pela apreciação cambial. A inflação que poderá ocorrer não deve servir de impedimento à decisão de colocar o câmbio no lugar. Quem exporta para cá regula o preço em dólar ao mercado. É a lei da concorrência. Com o novo câmbio não há que temer a elevação na mesma proporção dos preços em reais, pois se ajustam os preços em dólar. Contribui, também, para segurar a inflação, como mencionado, a redução do componente juros dos preços.
Trata-se de outra política econômica, focada no crescimento e com instrumento adequado ao controle inflacionário, que é a derrubada de preços intoxicados pelos juros.
Em apoio à redução de preços o governo deve estabelecer e implantar políticas voltadas à redução de custos das atividades essenciais à vida da população, especialmente, alimentação e transporte coletivo. Vale lembrar que a alimentação foi o vilão da inflação nos últimos dois anos, e políticas de estoques reguladores e de abastecimento contribuem para controle de preços e podem ser mais bem utilizadas para isso.