Rubens Cardia
A barragem da Usina Hidrelétrica de Capivara, no Paraná, tem atraído a atenção dos moradores da região. Junto à “Ponte Caída”, divisa dos municípios de Sertaneja e Sertanópolis, o braço do rio Tibagi, que alimenta a usina, secou tanto que a ponte da antiga estrada, que tinha sido encoberta pelas águas da represa de Capivara, está completamente aparente.
Em épocas normais somente a parte da estrutura do lado mais alto da ponte podia ser visto e em épocas de cheia a ponte desaparecia completamente. Não só a ponte está à mostra, mas também dezenas de árvores mortas que ficavam submersas.
No local as águas recuaram mais de 100 metros em cada margem, transformando o leito da represa em pasto ou deixando o lodo rachado com fendas de mais de 20 centímetros de profundidade.
A situação do Tibagi, que é parte da bacia do rio Paranapanema, ilustra bem a gravidade da crise hídrica que se abateu sobre as principais bacias produtoras de energia do país em 2020, que vem obrigando o governo a acionar térmicas mais caras para poupar água nos reservatórios.
Considerado a principal caixa d'água do setor elétrico brasileiro, o subsistema energético que envolve as regiões Sudeste e Centro-Oeste está hoje com pouco mais de 16% de sua capacidade de armazenar energia em hidrelétricas.
Em entrevista nesta segunda (7), o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, disse que o governo vem tomando as medidas para garantir o abastecimento e negou possibilidade de racionamento de energia no país.
"Não há possibIlidade alguma de racionamento nem de blecaute por conta dessa situação hídrica", afirmou, destacando que os dois últimos meses tiveram os piores volumes de chuva da série histórica. Para dezembro, as autoridades do setor elétrico também esperam chuvas abaixo da média.
Um dos rios mais importantes de São Paulo, que faz a divisa do estado com o Paraná, o Paranapanema recebeu apenas em um mês de 2020 volume de chuvas equivalente à média histórica. Nos outros, os volumes ficaram bem abaixo, mantendo uma tendência que já vem sendo observada nos últimos anos.
"Vem um chuvisqueiro que serve só para manter a agricultura", lamenta Nicolas Carmona Carmona Nebreira, 68, que é proprietário de um pesqueiro na região e diz que a situação se repete pelos últimos cinco anos. Nebreira lembra que outras atividades econômicas, como pesca e turismo, também são afetadas pela crise.
“[O município paranaense] Primeiro de Maio é uma região turística do Paraná que depende das águas da represa", afirma. "E com o nível baixo o turismo é prejudicado e a cidade toda sofre. Tive uma retração de uns 60% em meu negócio."
Seu vizinho teve que interromper a atividade de aquicultura, pois não há oxigênio suficiente na água para a criação de peixes em tanques rede. Mesmo que sai de barco para pescar, só encontra peixes pequenos: os maiores fugiram em busca de mais água.
Os rios Tibagi e Paranapanema têm dez hidrelétricas, três delas com reservatório para armazenar água. A situação é ruim em todas: Chavantes está com 21,94% de sua capacidade, Jurumirim tem 14,89% e a maior delas, Capivara, tem 5,59%.
Flávio Santiago, 38, costuma frequentar a represa de Capivara para pescar e afirma que nunca tinha visto o nível das águas tão baixo. "Com o nível normal, as águas ficam a poucos metros da ponte, mas agora para chegar na beirada tem este barranco todo", aponta.
Marcas escuras nas pilastras de sustentação da ponte indicam que a água já chegou a bater uns 9 metros do nível atual. O baixo nível da represa de Capivara impede a saída de barcos a motor, diz o construtor autônomo Odair Valdivino, 54, pelos riscos de que as hélices batam no fundo do rio ou em barcos.
Valdivino costumava pescar e navegar de caiaque na represa, mas diz que atualmente, em muitos lugares só é possível chegar de caiaque. Ele usa a ponte da antiga estrada como exemplo do ineditismo da situação. "Em época de cheia não dá para ver nada", afirma. "Agora ela está toda fora d’água."
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