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Cleide Silva, O Estado de S.Paulo
05 de maio de 2022 | 14h12
Atualizado 05 de maio de 2022 | 18h47
A Caoa Chery anunciou nesta quinta-feira, 5, que sua fábrica de Jacareí (SP) ficará fechada até 2025, período em que vai ser remodelada para produzir veículos elétricos e híbridos. Boa parte dos 627 funcionários da unidade serão demitidos e receberão indenização extra, segundo informou a empresa.
As indenizações serão negociadas com o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região. A entidade afirma que a empresa falou em 485 demissões, número que inclui todo o pessoal da produção e cerca de metade da administração. A fábrica produzia o SUV Tiggo 3x, que sairá de linha, e o sedã Arrizo 6, que passará a ser importado.
Como os funcionários da produção estão em licença remunerada desde 21 de março, nenhum carro foi produzido desde então. O presidente do Sindicato, Weller Gonçalves, chamou os trabalhadores para um assembleia nesta sexta-feira, 6, às 10h, para discutir medidas para evitar a suspensão das atividades da fábrica.
O grupo pretende ampliar a produção da unidade de Anápolis (GO), onde são produzidos os SUVs Tiggo 5x, Tiggo 7x e Tiggo 8. A empresa afirma que vai eletrificar todos os modelos de suas das marcas a partir de 2023.
"A empresa está atenta às demandas globais em relação à mobilidade sustentável e assume o compromisso com o Brasil e seus consumidores de eletrificar todos os modelos de seu portfólio", afirma em nota.
O grupo fundado pelo empresário Carlos Alberto de Oliveira Andrade, falecido em agosto do ano passado, aos 77 anos, informa que a adaptação da unidade de Jacareí terá como parâmetro os processos produtivos flexíveis já adotados na fábrica de Anápolis (GO), que já tem capacidade para produzir veículos híbridos.
Diz também que a suspensão dos processos industriais em Jacareí será compensada pela ampliação da produção em Anápolis, que está sendo preparada para lançamentos no segundo semestre. Com isso, mantém sua meta de comercializar 60 mil unidades no mercado nacional neste ano.
O investimento para os novos projetos está incluído no plano de R$ 1,5 bilhão para o período de 2021 a 2025. O grupo informa que será pioneiro no desenvolvimento e produção de veículos “verdes” no País.
O movimento da companhia ocorre em um momento em que a chinesa Great Wall passa a operar no Brasil com projetos de fabricação de carros eletrificados na fábrica adquirida da Mercedes-Benz em Iracemápolis (SP). A BYD, outra chinesa que já produz ônibus elétricos em Campinas (SP), está ampliando sua oferta de automóveis movidos a eletricidade por enquanto importados.
A fábrica de Jacareí foi construída pela chinesa Chery, que depois teve metade das ações adquiridas pela Caoa, e divide a produção de modelos dessa marca e da coreana Hyundai com a fábrica goiana.
A empresa afirma que a ação “faz parte da transição tecnológica da Caoa Chery que visa aumentar sua competitividade no âmbito nacional e internacional , seguindo um dos maiores movimentos tecnológicos da indústria automotiva mundial com forte foco no mercado brasileiro”.
Gonçalves afirma que a entidade desconfia da declaração da empresa de que retomará atividades em 2025 e afirma que a entidade "não vai aceitar o fechamento da fábrica". Ele lembra que o terreno onde a Chery está instalada foi doado pela Prefeitura, que será procurada para discutir a decisão da empresa.
O sindicalista também lembra que, no ano passado, a empresa contratou 280 funcionários com planos de produzir 40 mil veículos neste ano, ante 14 mil em 2021. A planta tem capacidade para 50 mil unidades ao ano, mas, desde sua instalação na cidade, em 2014, nunca atingiu esse volume. "O maior volume foi o do ano passado."
O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA Mario Luiz Sarrubbo, chefe do Ministério Público do Estado de São Paulo, o MPSP, autorizou licenças pagas para que dois promotores disputem as eleições de outubro próximo. Algo que a Constituição diz claramente que é proibido.
Tratam-se da midiática promotora Gabriela Manssur, que ingressou na carreira em 29 de agosto de 2003, e de seu colega Antonio Domingues Farto Neto, que está no Ministério Público desde 23 de outubro de 1990. As datas, disponíveis no Portal da Transparência do MPSP, são fundamentais nesse caso.
A carreira dos promotores e procuradores, também chamados de membros dos ministérios públicos, é regida pelo artigo 128 da Constituição. Ele foi alterado pela emenda constitucional 45, de 2004, que retirou as exceções até então previstas e passou a proibir sumariamente qualquer atividade político-partidária dos promotores e procuradores. Apesar disso, o Tribunal Superior Eleitoral, o TSE, validou dois anos depois as aventuras político-eleitorais de membros do Ministério Público que tenham entrado na carreira antes da Constituição ser promulgada, em 5 de outubro de 1988.
Quem chegou ao MP antes disso, portanto, vive num mundo de sonho. Pode disputar eleições fazendo campanha sem perder um centavo do gordo salário pago a promotores e procuradores, entre os mais altos do serviço público do Brasil. Se não forem eleitos, voltam à ativa no MP (apesar dos compromissos políticos assumidos durante as campanhas) e vida que segue.
Mas o doutor Sarrubbo decerto achou que ainda era pouco e permitiu a Manssur e Farto Neto, que só chegaram ao MP após 1988, gozarem do mesmo privilégio.
“O MPSP informa que a questão da participação de membros que ingressaram na instituição entre 1988 e 2004 no processo eleitoral não está pacificada pela Justiça Eleitoral e pelos tribunais superiores”, justificou-se o MPSP quando o questionamos. “Há precedentes em outras unidades do Ministério Público dos Estados e também no MPF”. Os precedentes mencionados são tentativas de chapelar a Constituição iguais às de Manssur e Farto Neto.
A nota prossegue: “As candidaturas, evidentemente, serão validadas ou não pela Justiça Eleitoral. Recusar de pronto as demandas apresentadas à instituição pelos promotores Gabriela Manssur e Antonio Farto, que tomaram posse neste intervalo, representaria interditar seus direitos políticos sem que tal situação pudesse ser corrigida no futuro”, argumentou o MPSP.
Ou seja: para se justificar, o MPSP tenta criar confusão onde não existe. Não há óbice algum à participação de promotores e procuradores em eleições – desde que, para isso, deixem a carreira no Ministério Público, como ordena a Constituição. A carta magna não “interdita direitos políticos” de promotores, mas sim veta a regalia de acumular a candidatura eleitoral a um vencimento privilegiado e uma posição que permite interferir no jogo político em benefício próprio – que o diga a Lava Jato.
“É uma não-resposta com base numa desfaçatez jurídica”, avaliou o jurista Conrado Hübner Mendes, doutor em direito e ciência política e professor de direito constitucional na Universidade de São Paulo, a USP. Mendes é um contumaz denunciante dos privilégios e abusos de membros dos ministérios públicos e do Poder Judiciário, a quem define como a “magistocracia”. Por isso, é perseguido em processos movidos por figuras como o procurador-geral da República Augusto Aras e o ministro Kassio Nunes Marques, o 01 de Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal.
“Ninguém tem direitos políticos interditados. Deltan Dallagnol, Sergio Moro e Wilson Witzel se exoneraram [para fazerem política e disputarem eleições]”, ele lembrou. Ou seja, bastaria a Manssur e Farto Neto pedirem para sair do MPSP, como determina a Constituição.
Dona de um discurso que se pendura num lugar entre o feminismo e o reacionarismo bolsonarista, Gabriela Manssur é filiada ao MDB e pré-candidata a deputada federal. Já há algum tempo ela divide seu tempo entre as atribuições no MP e o Instituto Justiça de Saia, que se propõe a empoderar as mulheres a fazerem o que desejarem, mas cujos site e página no LinkedIn contêm pouco mais que propaganda da promotora.
Apesar do que determina a Constituição, mesmo antes de se licenciar Manssur já se sentia à vontade para comparecer a eventos obviamente eleitoreiros, como um badalado almoço da fina flor da grã finagem paulistana com o presidente Jair Bolsonaro e seu ministro da Economia, Paulo Guedes, em abril de 2021, mês em que quase 90 mil brasileiros morreram de covid-19.
Em dezembro de 2021, último mês sobre o qual há dados disponíveis no Portal da Transparência – considerado ruim pela Transparência Brasil –, Manssur acumulou R$ 24.430,06 em verbas indenizatórias e R$ 16.844,55 de gratificação natalina ao salário base de R$ 33.689,1o. Assim, levou para casa, limpos, R$ 53.352,55.
Já Antonio Farto Neto é promotor em Sorocaba, cidade de 695 mil habitantes a 87km de São Paulo. Ali, foi promotor da Infância e da Juventude antes de passar a comandar a Promotoria do Meio Ambiente. Em seguida, “foi convidado a filiar-se ao PSC dentro da política da agremiação de incentivar candidaturas novas que apresentem um currículo de comprometimento com o conservadorismo e com a democracia”, informa o tradicional jornal local Cruzeiro do Sul. Quer ser candidato a deputado estadual.
Foi na redação do Cruzeiro do Sul, aliás, que Farto Neto protagonizou um episódio que nada fica à dever à censura da ditadura militar. Incomodado com uma greve geral convocada para se contrapor à reforma trabalhista de Michel Temer, em 2017, ele resolveu ir à redação e determinar como o jornal deveria cobrir a manifestação, ordenando entrevistas com o comando da PM e da guarda municipal. Segundo quem testemunhou a demonstração explícita de truculência, Farto Neto – que é conselheiro da entidade que publica o Cruzeiro do Sul – escreveu ele mesmo a manchete daquela edição.
Em dezembro de 2021, Farto Neto engordou o salário base de R$ 33.689,10 com R$ 24.430,06 de verbas indenizatórias, R$ 8.193,13 de gratificação de permanência, R$ 1.085,54 em remunerações temporárias e R$ 16.844,55 da gratificação natalina. Limpos, embolsou R$ 63.619,39.
Eu fiz contato com Manssur via Instagram, WhatsApp e pelo site do Justiça de Saias para perguntar se a promotora desconhece o artigo 128 da Constituição e a emenda constitucional 45/2004, ou, do contrário, por que os ignorou. Também liguei para seu telefone celular e deixei recado na caixa postal. Não houve resposta.
Busquei por Farto Neto na Fundação Ubaldino do Amaral, publicadora do Cruzeiro do Sul, e na sede do MPSP em Sorocaba. Pedi à secretaria do órgão para que transmitisse a ele meu pedido de entrevista. Também enviei perguntas a um e-mail pessoal dele fornecido pela Ubaldino do Amaral. Farto Neto não me respondeu.
O procurador-geral Sarrubbo também concedeu licenças com vencimentos para outros dois promotores do MPSP que são membros da categoria desde antes de 1988 e, por isso, estão protegidos pelo que decidiu o TSE: Marcos Antonio Lelis Moreira, de São José do Rio Preto, e Fernando Capez, já licenciado para ser chefe da Fundação Procon no governo João Doria, do PSDB.
“Ingressei no MP em 23 de dezembro de 1986. A lei orgânica me dá o direito de estar descompatibilizado e receber vencimentos”, me disse Lelis. “É uma questão legal. Se a lei me permite isso, não vejo nenhum incômodo. E, se houver algum incômodo, me aposento a qualquer hora. Tenho 45 anos de serviço público”. Lelis, filiado ao bolsonarista Avante “faz um ano, já”, quer ser deputado estadual.
Para dedicar o tempo a movimentar a própria campanha com posts em homenagem a qualquer data que apareça no Instagram, Lelis irá seguir recebendo os R$ 33.689,10 do salário base de promotor. Que, em dezembro de 2021, ele engordou o contracheque com R$ 1.470,73 de verbas indenizatórias, R$ 18.281,77 de gratificação natalina, R$ 8.347 de abono de permanência e mais R$ 561,48 a título de remunerações temporárias. Limpos, foram R$ 64.688,93.