sábado, 10 de julho de 2021

Governo Doria propõe dar à Cosan mais 20 anos de concessão da Comgás em SP, FSP

 

RIO DE JANEIRO

O governo de São Paulo propõe renovar por 20 anos a concessão da Comgás, maior distribuidora de gás encanado do país, controlada pelo grupo Cosan. A concessão vence em 2029, mas o governo defende que a renovação antecipada garante mais investimentos na rede e melhora a conta de gás.

A proposta será discutida em audiência pública da Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos de São Paulo) no próximo dia 19 e vem sendo questionada no mercado, que vê impactos negativos no setor de gás e sobre o consumidor paulista.

Entidade que reúne grandes consumidores de energia, a Abrace pediu à Arsesp que estenda o prazo em ao menos seis meses para debater o tema. "Não se vislumbra situação de urgência a ensejar a necessidade de se imprimir celeridade na análise", diz.

O pedido de prorrogação foi apresentado pela própria Comgás e é visto pelo governo João Doria (PSDB) como mais vantajoso do que uma nova licitação para escolher um concessionário ao fim do prazo do contrato ou de uma prorrogação mais perto do vencimento.

O governo alega que a empresa já realizou todos os investimentos estabelecidos em contrato e, sem a renovação, gastaria apenas R$ 360 milhões entre 2024 e 2029. A prorrogação do contrato cria novas metas, que demandariam R$ 4,1 bilhões no período.

Em nota, a Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente do estado diz que a companhia terá que ampliar a rede para atender 14 novos municípios em sua área de concessão, beneficiando 625 mil consumidores.

Responsável pela região metropolitana de São Paulo, a Comgás foi concedida em 1999 a British Gas e Shell por R$ 1,65 bilhão (o equivalente hoje a R$ 6,3 bilhões), um ágio de 120% sobre o preço mínimo do leilão. Em 2012, a Cosan comprou a parte da British Gas pelo equivalente a R$ 5,6 bilhões.

Hoje, o conglomerado do empresário Rubens Ometto tem 99,14% das ações da empresa, por meio da Compass, empresa do grupo que atua nos setores de gás e energia. A Comgás terminou o primeiro trimestre com 2,1 milhões de clientes e lucro de R$ 499 milhões.

O governo defende que a proposta de renovação do contrato prevê a renúncia, pela empresa, de R$ 1,5 bilhão que seriam repassados à conta de gás no ciclo tarifário que se inicia em 2024 por erros no cálculo das tarifas na última revisão e pela troca do IGP-M pelo IPCA como indexador do reajuste de 2021.

A mudança no índice foi negociada pelo governo do estado para aliviar a pressão sobre a tarifa, já impulsionada por reajuste de 39% promovido pela Petrobras no preço do gás natural e pela escalada do dólar, que impacta os custos de transporte do combustível.

Com o IGP-M, índice de inflação com maior impacto da taxa de câmbio, o reajuste médio na tarifa da Comgás seria de 34%, diz o governo estadual. Com o IPCA, ficou em 10%. O novo contrato prevê esse último índice como indexador das tarifas pelos próximos 20 anos.

A data dos reajustes será alterada de maio para dezembro, para reduzir os impactos no consumidor em um período de aumento de consumo durante o inverno.

Entre os investimentos obrigatórios, estão a construção de 15,4 mil quilômetros de rede de distribuição, expandindo o atendimento a ao menos 134 municípios, e a interligação com as outras duas concessionárias de gás do estado, a Naturgy e a GasBrasiliano.

Essa última cláusula é um dos alvos de questionamentos no mercado, pois poderia representar a saída de São Paulo da malha de transporte de gás do país, que hoje é responsável por essa interconexão. Sem as tarifas pagas pelas distribuidoras do estado, a tendência é de alta no valor repartido pelo resto do país.

A Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente diz não ver esse efeito. "Não há interesse em 'ilhar' o estado, mas permitir às demais distribuidoras e consumidores paulistas o acesso ao gás mais competitivo proveniente da Baixada Santista", afirma.

Grandes consumidores de energia argumentam ainda que o contrato apresentado pelo governo mantém a estrutura tarifária da concessionária, desconsiderando questionamentos a respeito de ganhos a mais no último ciclo tarifário, tema que vem sendo debatido na Arsesp.

Em pareceres divulgados em março, a área técnica da agência reconhece erros no cálculo que gerariam compensações tanto em favor da empresa quanto em favor dos consumidores. A primeira parcela está contemplada na proposta de renovação.

Do R$ 1,5 bilhão que a concessionária renunciará, R$ 600 milhões referem-se a valores que a concessionária teria direito após revisão de cálculos passados. O governo defende que a avaliação dos grandes clientes é equivocada e a renovação beneficiará os usuários.

A Abrace diz que não é possível calcular ainda o valor da renúncia, já que o crédito é objeto de recurso administrativo em análise na Arsesp, "sendo incerta sua real dimensão, razão pela qual a renúncia ao crédito não poderia ser incluída na minuta proposta".

A entidade defende também que o prazo da audiência pública é insuficiente para análise dos "mais de 50 documentos técnicos" que embasam a proposta.

"Apesar da relevância do tema e dos impactos jurídicos e econômicos associados, o prazo para oferecimento de contribuições é de 20 dias, o que praticamente inviabiliza a apresentação de contribuições devidamente fundamentadas", afirma.


Baixem o tom, fardados! Cristina Serra, FSP

 Generais, brigadeiros e almirantes deveriam ser os primeiros a querer esclarecer as gravíssimas denúncias de corrupção, reveladas pela CPI da Covid, que batem à porta de Bolsonaro e de uma penca de fardados. Mas o que estamos vendo é bem o contrário.

Como em outros momentos da nossa história, a cúpula das Forças Armadas e o Ministério da Defesa preferem esconder a sujeira embaixo do tapete, peitar as instituições democráticas e afrontar a Constituição e a sociedade civil. É esse o sentido da nota assinada pelo ministro Braga Netto e pelos três comandantes militares após a declaração do presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), de que há um "lado podre das Forças Armadas envolvido com falcatrua dentro do governo".

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Alguém duvida disso? A pior gestão da pandemia no mundo foi a de um militar brasileiro, o general da ativa Eduardo Pazuello. Agora, sabemos também que a alta hierarquia do ministério na gestão dele, toda fardada, aparece no "vacinagate", notadamente seu ex-secretário-executivo, o coronel da reserva Elcio Franco.

Depois de tantos anos restritos aos quartéis e às suas atribuições profissionais, os militares voltaram ao poder de braços dados com um sujeito desqualificado, medíocre, notoriamente ligado a esquemas criminosos, que vão de rachadinhas a milicianos, e que é sustentado no Congresso pelo centrão.

Cúmplices e agentes ativos de tudo isso, os militares vêm cantar de galo, atribuindo-se o status de "fator essencial de estabilidade do país". Ora, é exatamente o contrário. Senhores fardados, vocês deixarão uma herança de morte, doença, fome e corrupção. Querem enganar quem? Acham que estão em 1964?

Baixem o tom, senhores. O Brasil não tem medo de suas carrancas, de seus coturnos e de seus tanques. Generais, vistam o pijama e, quando a pandemia passar, organizem um campeonato de gamão na orla de Copacabana. É o melhor que podem fazer pelo país.

Hélio Schwartsman - Bolsonaro já era?, FSP

 

O perigo de golpe é mais um argumento pró-impeachment

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A pergunta que não quer calar é se a liquefação do governo já tornou Jair Bolsonaro eleitoralmente inviável ou se ainda corremos risco de vê-lo no páreo em 2022. Adoraria poder cravar a primeira opção, mas, especialmente depois de Bolsonaro em 2018, que eu jurava que não seria eleito, aprendi a não mais superestimar a racionalidade de meus coetâneos.

O último Datafolha mostra que os apuros por que passa o presidente são sérios. As avaliações negativas já chegam a 51%. Em termos de imagem, a situação é ainda pior. A maioria dos eleitores já vê Bolsonaro como desonesto, falso, incompetente, despreparado, indeciso, autoritário e burro. São adjetivos difíceis de combater numa campanha. E nem dá para dizer que a avaliação seja injusta.

O problema é que a eleição é só daqui um ano e três meses, tempo suficiente para muita coisa acontecer. Vale lembrar que o Brasil costuma reabilitar líderes que um dia pareceram casos perdidos pelas pesquisas, como Sarney e o próprio Lula.

No médio prazo, dois fatores poderiam ajudar Bolsonaro. A vacinação, que ele sabotou, avança e já começa a conter a epidemia. A economia também dá mostras de recuperação. Se o governo, em suas múltiplas incompetências, não tivesse gerado uma ameaça de apagão, as perspectivas seriam melhores.
Há ainda a possibilidade de Bolsonaro procurar uma saída "off label". Na verdade, quanto mais fraco ele fica, mais tentador o golpe lhe parece. Gostaria de poder dizer que as instituições são fortes e impossibilitam essa cartada, mas surgem das Forças Armadas sinais de que as coisas podem não ser assim. Se havia uma coorte democrática no comando militar, ela foi demitida em março.

Acho que o perigo de golpe é mais um argumento pró-impeachment. É preferível desferir um ataque frontal contra a pior administração da história quando ela está mais fraca a fazê-lo num momento em que tenha força para reagir.