sexta-feira, 7 de junho de 2019

A Petrobrás, o Supremo e o jogo das corporações, Celso Ming, OESP

Celso Ming, O Estado de S.Paulo
06 de junho de 2019 | 21h00


Nesta quinta-feira, o colegiado do Supremo Tribunal Federal corrigiu uma distorção pretendida por algumas das corporações que atuam no País. Definiu que uma empresa estatal pode vender subsidiárias sem ter de submeter sua decisão à autorização prévia do Poder Legislativo.
A questão específica da Petrobrás começou no final de maio, quando, depois de longo processo de licitação interna orientado pelo Tribunal de Contas da União, a direção decidiu vender uma de suas redes de gasodutos, a Transportadora Associada de Gás, a TAG, para a francesa Engie e para o fundo canadense Caisse de Dépôt et Placement du Québec, a CDPQ, por US$ 8,6 bilhões.
Sessão do STF
Supremo Tribunal Federal (STF) favoreceu a Petrobrás ao permitir que empresas possam vender subsidiárias sem ter de submeter sua decisão ao aval do Poder Legistativo Foto: ERNESTO RODRIGUES/ESTADÃO-6/12/2018
Os sindicatos dos petroleiros e de operadores de refinarias recorreram ao Supremo para suspender essa venda. Baseavam-se num despacho assinado em caráter liminar pelo ministro Ricardo Lewandowski, em junho de 2018, que deu provimento a um recurso de funcionários e sindicalistas da Caixa Econômica Federal. Essa liminar determinava que toda a venda de empresa estatal tinha de passar por autorização prévia do Legislativo.
Os petroleiros que pretendem sustar a venda da TAG foram atendidos dia 26 de maio por nova liminar, desta vez assinada pelo ministro do Supremo Edson Fachin. Essa decisão foi a que passou a ser examinada nesta semana pelo colegiado do Supremo.
A questão principal em jogo não é a de que a Petrobrás, que foi esmerilhada pela corrupção, pela má administração e pelo inchaço do seu quadro de funcionários, precisa ser saneada e reduzir sua dívida asfixiante e, portanto, precisa de certa autonomia para vender seus ativos.
Há duas questões a considerar mais importantes do que essa. A primeira é a de que a administração do patrimônio público não pode ser emperrada por questões puramente ideológicas ou por interesses de funcionários que não querem perder as benesses de que desfrutam apenas por pertencerem aos quadros de uma empresa estatal.
A outra questão é a de que a economia e os investidores precisam de chão firme onde pisar, precisam de previsibilidade. Não podem tomar decisões importantes e despejar recursos vultosos em projetos ou em empresas já constituídas diante de um quadro persistente de incerteza jurídica.
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A TAG detém uma rede de gasodutos de cerca de 4,5 mil quilômetros de extensão. Foto: André Valentim/Agência Petrobras
A argumentação de fundo também tem seu peso e foi sintetizada no voto do ministro Luís Roberto Barroso, o terceiro a se manifestar. Não se pode exigir autorização do Legislativo para a venda de uma subsidiária de uma empresa-mãe, se para sua criação não foi necessária essa licença. Por outra argumentação, a Constituição, cuja defesa é a principal razão de ser do Supremo, não pode respaldar o agigantamento do Estado nem tampouco o interesse de certas corporações que claramente contrariam o interesse público.
A decisão do Supremo favorável à Petrobrás foi tomada com algumas diferenças pontuais expostas por alguns ministros, que não prejudicam o principal. Do ponto de vista das estatais, elimina a pinimba corporativista de que tudo tem de passar por processos políticos bem mais complicados e, muitas vezes, enviesados, que, na prática emperram o processo.

CONFIRA

» Risco Brasil
O gráfico ao lado mostra a evolução do mais expressivo indicador de risco do Brasil. Trata-se do Credit Default Swap (CDS-5), o índice que define o adicional sobre os juros de referência que o investidor internacional vem cobrando para ficar com o título-padrão do Brasil, o Título do Tesouro de 5 anos. A queda do CDS-5 nas últimas semanas sugere que, apesar do alto grau de incertezas que permeiam a vida econômica e política do Brasil, o investidor internacional continua disposto a assumir o risco Brasil.

Aprendendo com quem transformou a educação no Brasil, FSP

É necessário pôr fim à narrativa paralisante de que nada funciona no país

Todo ano, lideranças educacionais vão visitar a Finlândia, Singapura ou Xangai. Com a divulgação dos resultados do Pisa, o interesse pelo processo de ensino por trás do excelente desempenho dos jovens de 15 anos dessas economias aumenta o turismo em educação.
Faz sentido se inspirar no sucesso em qualquer área de atividade humana e replicar bons exemplos. No entanto, as diferenças de condições entre comunidades demandam certa contextualização de soluções e os mais céticos acabam atribuindo os resultados positivos à renda mais alta ou à cultura dos países que as abrigam. 
Vale sempre a pena olhar com prioridade para o que dá certo no país e sair da narrativa paralisante de que aqui nada funciona. Há experiências educacionais de sucesso espalhadas em estados e municípios e certamente temos muito a aprender com elas.
Foi a partir disso que, ao criar uma rede de líderes educacionais fluminenses, a primeira ideia que ocorreu ao Ceipe, um centro da Fundação Getulio Vargas voltado à melhoria da política educacional no Brasil, foi levá-los ao município do interior do Ceará que conta com o melhor Ideb do país.
Sobral, uma cidade com um nível socioeconômico baixo e uma população de pouco mais de 200 mil habitantes, tem se destacado não só por assegurar aos alunos uma aprendizagem excepcional mas por continuar melhorando ao longo dos anos.
O que esse grupo de secretários e gestores educacionais pôde ver em reuniões, palestras e visitas, ouvindo relatos de técnicos, docentes e diretores de escola, foi um forte alinhamento de todos em torno de um receituário que funciona.
Há um currículo claro, investimento em formação continuada de professores, com bons materiais de apoio, avaliações unificadas que fornecem informações a todos sobre o que cada aluno está aprendendo e boa gestão escolar. O que não viram: salas de aula sem professores, infraestrutura sofisticada ou tablets com cada aluno.
Mas, em conversa com o prefeito de Sobral, ele me adiantou que havia, até bem pouco, duas coisas faltando para que essa educação de qualidade pudesse desenvolver plenamente os jovens e ajudar a resolver outros problemas do município. 
Trata-se do ensino de habilidades socioemocionais e da presença de psicólogos em cada escola, para atuar junto a adolescentes com risco de abandono escolar. Foi o investimento mais recente. 
Afinal, é necessário contar com um currículo que contemple as competências do século 21, entre as quais a empatia e a autorregulação, e evitar que jovens abandonem a sala de aula e engrossem os exércitos da economia paralela. 
Que o estado do Rio possa, de fato, aprender com essa experiência!
Claudia Costin
Diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais, da FGV, e ex-diretora de educação do Banco Mundial.

A seguir: mais protestos, Ruy Castro , FSP

No Reino Unido, mês passado, um cidadão protestou contra a saída de seu país da União Europeia atirando um milk-shake —de banana com caramelo, apurou-se depois— em Nigel Farage, líder do partido do brexit. Outros políticos britânicos têm sido atingidos com milk-shakes, sem distinção de sabor. O resultado é sempre constrangedor —a vítima tem o paletó, a camisa e o rosto lambuzados de sorvete, leite e xarope, o que a obriga a ir lavar-se. A não ser, claro, que se lamba. 
Cada um protesta como pode. Como a maioria dos políticos não se ofende ao ter a mãe xingada, os ativistas lhes atiram coisas. O francês Nicolas Sarkozy levou uma torta no rosto em 1997, na Bélgica, e ainda nem era presidente. Seu sucessor, François Hollande, em 2012, sofreu um ataque com farinha jogada por uma mulher. Em 2009, em Bagdá, o presidente americano, George Bush, foi alvejado com dois sapatos atirados por um iraquiano. E, em 2010, José Serra, candidato à Presidência pelo PSDB, no Rio, levou uma bolinha de papel na calva. Pela violência do ato, conduziram-no a um hospital.
Nigel Farage é amparado após ser atingido por milk-shake em Newcastle, na Inglaterra
Nigel Farage é amparado após ser atingido por milk-shake em Newcastle, na Inglaterra - Scott Heppell - 20.mai.19/Reuters
Não se deve confundir um protesto com um atentado. O atentado é um protesto radical, principalmente quando resulta em morte, como aconteceu com os americanos Abraham Lincoln, John Kennedy e Martin Luther King. Quando falha, vira comédia, como as tentativas da CIA de matar Fidel Castro, com um charuto envenenado, uma bomba dentro da bota e uma bola de beisebol explosiva. 
O presidente Bolsonaro, que já foi alvo de um atentado, gosta de protestos. Outro dia promoveu um, a seu próprio favor. Mas, como não para de chamar o país para a briga, tudo indica que atrairá cada vez mais protestos —contra ele. 
No Cazaquistão, há pouco, um jovem foi preso ao protestar com um cartaz em branco. Se fizerem isto contra Bolsonaro, ninguém sentirá falta dos dizeres. Todos saberão o que o cartaz quer dizer.


Ruy Castro
Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues.