quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

Opinião, FSP Sem café. nem açúcar

Doria não disfarça sua pretensão de usar o Bandeirantes como trampolim para o Planalto

O governador de São Paulo, João Doria
O governador de São Paulo, João Doria - Zanone Fraissat/Folhapress
Por quase um quarto de século, o PSDB dominou a política paulista. Sua hegemonia, ao menos na forma à qual o eleitor se habituou, termina em 2019 com uma pantomima —comandada, paradoxalmente, pelo novo governador tucano, João Doria, que não disfarça sua pretensão de usar o Bandeirantes como trampolim para o Planalto. 
Nos discursos de posse, Doria prodigalizou críticas a seu partido, que enxerga necessitado de reestruturação e de sintonia com anseios da população manifestados pelo voto —referência à eleição de Jair Bolsonaro (PSL), mencionado três vezes.
Para Geraldo Alckmin, presidente do PSDB e tucano que mais tempo passou no governo paulista, sobrou uma única menção nominal. No mais, o empossado dirigiu-lhe alusões que beiraram a descortesia, como ao dizer que São Paulo agora teria comando e posição.
Declarou, também, que o palácio se tornará local de trabalho, que abrirá mão de morar nele e que não permitirá ali romarias de prefeitos em busca de cafezinho. Foi sua maneira acre de ridicularizar a política tradicional, tão bem encarnada no ex-governador. 
O pós-tucano tampouco economizou citações ao Brasil e aos “brasileiros de São Paulo”. Apresentou-se desde já como presidenciável, tendo escolhido sete ex-ministros para compor seu secretariado. Como se estivesse na posse de Bolsonaro e não na própria, disse que fará privatizações sem medo de bandeiras vermelhas e caras feias. 
Na Prefeitura de São Paulo, Doria comportou-se como alguém de passagem. Ungido candidato por Alckmin, o recém-prefeito de pronto passou a disputar com o padrinho a candidatura à Presidência. Sem sucesso, impôs-se como postulante ao governo estadual.
Após aderir a Bolsonaro e invectivar contra espectros socialistas, venceu a eleição. A estada de pouco mais de um ano no governo municipal, entretanto, deveria servir-lhe de lição de humildade e não de húbris: deixou longa lista de promessas não realizadas, como o anúncio de que acabaria com a cracolândia.
Agora, prioriza acabar com o crime organizado que São Paulo exporta para outros estados. Uma tarefa hercúlea, que não resolverá com bravatas de rigor policial.
Se pretende demonstrar firmeza de imediato, Doria poderia ser mais incisivo na cobrança de explicações do secretário da Casa Civil que resgatou de Brasília, Gilberto Kassab (PSD), ora sob investigação na esteira da Operação Lava Jato.

Imprensa é oposição, FSP

Jair Bolsonaro segue os passos de Trump, Lula e Dilma

Só está surpreso com o tratamento que a imprensa está tendo do governo Bolsonaro quem esteve em coma na última década ou não usa redes sociais. Jornalistas, blogueiros e cidadãos críticos ao PT em seus anos no poder, e que mantêm o mesmo espírito para analisar as ações do novo presidente e de sua equipe, apenas têm visto os ataques partirem de outro lado. 
Essa batalha entre governantes e a imprensa é antiga para quem é gato escaldado e, de fato, teve equilíbrio e isenção para analisar e reportar os fatos. Jair apenas deixou claro que está em guerra e que vai cercear a liberdade da categoria, se puder. Não é coincidência. É o jeito de operar dos poderosos. 
Bolsonaro, além de seguir os passos de Donald Trump na tentativa de desmoralizar o jornalismo profissional, segue o que Lula e Dilma fizeram desde sempre. Instiga a militância contra veículos de comunicação e jornalistas por trás de histórias que não são favoráveis a ele. 
Até pouco tempo, essas mesmas pessoas eram xingadas de tucanos, coxinhas, golpistas, fascistas, hostilizadas e ameaçadas todas as vezes em que ousavam examinar com rigor as ações do PT e de seus representantes, que já apontavam a imprensa como inimiga do povo. 
Há pouco o que fazer contra a cegueira ideológica, tanto da direita quanto da esquerda radicais. São pessoas menos capazes de avaliar quando estão erradas, segundo conclusão de cientistas da University College London. Os entrevistados mostraram autoritarismo, intolerância e resistem a mudar suas crenças ainda que diante de evidências.
O mesmo tipo de doença que contagiou petistas e simpatizantes dos últimos governos faz vítimas entre os eleitores de Bolsonaro. A imprensa não está contra esse ou aquele presidente. “Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados”, já dizia Millôr Fernandes. Ao menos é assim que deveria ser. E, ao fazer oposição, vamos apanhar sempre.