domingo, 15 de junho de 2014

‘O mercado brasileiro mudou, e a geografia do emprego é outra’ ( Leonardo Trevisan)


Pesquisador da área de carreiras analisa crescimento das oportunidades de trabalho fora das grandes capitais

Agronegócio. Crescimento da área plantada no País teria impulsionado aumento de vagas no interior (Imagem: Eduardo Monterio/Divulgação)

LEONARDO TREVISAN, professor da PUC-SP
O que era desconfiança virou fato: o emprego cresce fora das grandes capitais. E a diferença é grande. No primeiro trimestre deste ano, as seis maiores capitais do País tiveram queda de 9% na abertura de vagas com carteira assinada, na comparação com o mesmo período do ano passado. No entanto, no resto do Brasil, a oferta de novos postos cresceu 22%, na mesma comparação. Os dados são do IBRE, da Fundação Getulio Vargas, com base no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados.
Por que tem mais emprego no interior? Produtividade no trabalho do agronegócio, por exemplo. Nos últimos 30 anos, a área plantada de grãos cresceu 42%, enquanto a produção cresceu 228%. O ganho de produtividade, portanto, foi de 3,2% ao ano. Esse avanço foi sustentado primeiro pela forte geração contínua de nova tecnologia, via Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) com pesquisa e desenvolvimento aplicada.
Segundo, para usar bem a nova tecnologia precisa gente mais qualificada, e foi também o que aconteceu. Pesquisa da Embrapa mostrou que, em 2013, 53% dos agricultores já usavam o conceito de “agricultura de precisão”, com automação de processos, nos nove estados mais produtivos do País.
Na nova geografia do emprego, a renda do agronegócio tem forte efeito multiplicador nas outras atividades, serviços especialmente. E, sem dúvida, esse avanço só foi possível porque o conjunto da mão de obra está mais educado, como mostrou a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) do IBGE.
No Brasil, das 91,2 milhões de pessoas ocupadas, no primeiro trimestre deste ano, 47,5 milhões delas (52%) possuíam ensino médio completo, cursavam ensino superior, ou já o tinham concluído. Em 2005, a condição de ensino médio concluído alcançava só 35% dos ocupados. Em 2012, 49,3%; no ano de 2013, foram 50,3% e, em 2014, consolidou maioria com maior grau de escolaridade.
Na prática, o mercado de trabalho brasileiro já mudou. A geografia do emprego é outra. O perfil do trabalhador também é outro. A disputa por vaga dependerá, cada vez mais, da capacidade de atender ao pedido de mais produtividade. Aceitar a ideia de educação continuada é a melhor forma de atender este “pedido”. Seja qual for o ramo de atividade.
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A lenta inovação


O ESTADO DE S.PAULO
15 Junho 2014 | 02h 06

Recursos para as empresas aplicarem em projetos de inovação existem, boa parte está sendo utilizada, mas os resultados em termos de ganhos de produtividade e competitividade são poucos. A contínua perda de participação do produto nacional no mercado doméstico de bens industrializados, constatada em pesquisas frequentes das associações representativas do setor, está se transformando na prova mais dramática de que, se não se tornar mais competitiva, e com rapidez, a indústria brasileira poderá ser condenada a contentar-se apenas em atender a nichos de um mercado que já dominou.
Esta talvez seja a conclusão mais objetiva do Fórum Estadão - Inovação, Infraestrutura e Produtividade, realizado pelo Estado, em parceria com a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), que reuniu representantes do governo, empresas e instituições de pesquisa.
Como ficou claro nos debates e exposições, embora indispensável, por si só a inovação - isto é, a criação, modernização ou transformação de sistemas e métodos produtivos, de produtos ou serviços e de modelos de gestão e de comercialização que abram ou ampliem mercados - não é capaz de assegurar o aumento da competitividade de uma empresa ou de uma economia. Ela precisa vir acompanhada de outros fatores, como infraestrutura adequada, sistema econômico que facilite e estimule a atividade empresarial, além de disponibilidade de recursos para investir.
Entre os pontos positivos destacados durante o Fórum Estadão está o fato de que cresceram, nos últimos anos, os recursos públicos destinados a apoiar as empresas que investem em pesquisa e desenvolvimento. Eles estão disponíveis por meio de programas criados pela Finep e pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e há demanda, uma indicação positiva de que o tema inovação ganhou relevância no meio empresarial, como observou o presidente da Finep, Glauco Arbix.
É preciso reconhecer, porém, que, apesar dessa melhora, o Brasil investe pouco em pesquisa e desenvolvimento. A diretora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) para a área de inovação, Fernanda De Negri, lembrou que, nos países desenvolvidos, as empresas investem de 2% a 2,5% do PIB em pesquisa em desenvolvimento, enquanto no Brasil elas investem apenas 0,5% do PIB.
Exemplos de outros países deixam claro que as empresas mais inovadoras e de crescimento mais rápido basearam sua expansão na conquista do mercado internacional. O foco no mercado externo, onde certamente são muito maiores as oportunidades do que no mercado doméstico, implicou a necessidade de oferta de produtos e serviços inovadores e, sobretudo, competitivos. "Quem atua no mercado externo é mais competitivo e inova mais", observou, durante o Fórum Estadão, o secretário de Inovação do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Nelson Fujimoto. Boa parte das empresas brasileiras, no entanto, concentrou sua atenção no mercado interno, que durante muito tempo foi fechado a diversos produtos importados, o que retardou a busca de produtividade e competitividade.
Além de mais recursos para pesquisa e desenvolvimento que levem à inovação, especialmente do setor privado, o avanço da competitividade da economia brasileira requer outras medidas, muitas delas de iniciativa do poder público.
É preciso dotar o País de infraestrutura suficiente para facilitar o escoamento da produção e reduzir os custos da atividade produtiva. Os países de rápido crescimento nas últimas décadas, como os asiáticos, demonstraram que uma economia só é capaz de crescer e se modernizar rapidamente se dispuser de pessoal preparado, o que exige um sistema educacional de qualidade. Há, no Brasil, profissionais qualificados, mas em número insuficiente para permitir o salto de competitividade que o País precisa dar. Além disso, as instituições de pesquisa, especialmente as ligadas às universidades, precisam aproximar-se das empresas.
Em inovação e produtividade, dinheiro é importante, mas não é tudo.

Demagogia contra os carros EDITORIAL Estadão

15/06/2014 09:13
O Estado de SP| O Estado de SP

O prefeito Fernando Haddad, em dupla com seu secretário de Transportes, Jilmar Tatto, acaba de dar mais uma demonstração de que elegeu o carro como bode expiatório de sua incapacidade de tomar as medidas que se impõem para melhorar o transporte coletivo da cidade - no seu caso, o serviço de ônibus. Depois do engodo das faixas exclusivas - que acaba de ser comprovado por dados da SPTrans sobre o pífio aumento de 1 km/h na velocidade média dos ônibus que por elas circulam -, a Prefeitura acaba de anunciar a construção de 400 km de ciclovias, que acarretarão a supressão, segundo Tatto, de 30 mil a 40 mil vagas de estacionamento.
Quando as faixas começaram a ser implantadas, reduzindo o espaço dos carros, o governo municipal mandou um recado aos descontentes - que passassem a utilizar ônibus, pois sua velocidade iria aumentar e torná-los mais atraentes. Haddad e Tatto não perdiam ocasião de fustigar os donos dos carros - como se estivessem descobrindo a pólvora - que a prioridade é o transporte coletivo. Os descontentes que se adaptassem. Vão certamente fazer a mesma coisa com os 400 km de ciclovias anunciados e suas consequências.
Sua construção deverá estar concluída até o fim de 2016, coincidindo com o término do mandato de Haddad. Um projeto-piloto, de 1,6 km, está sendo construído entre o Largo do Paiçandu e a Estação Júlio Prestes, na região central. Vias importantes como a Avenida Paulista - no canteiro central - e as Ruas Vergueiro e Domingos de Moraes estão entre as que receberão as ciclovias.
"Vamos tirar vagas dos carros para uma ocupação do espaço público pelas bicicletas. É evidente que há sempre o conflito com o estacionamento do carro. Talvez por isso até hoje não foram implementadas ciclovias na cidade", afirmou Tatto. Está implícito aí que os governos anteriores - o de Marta Suplicy também, do qual ele participou? - não tiveram como o atual a clarividência de perceber a importância das ciclovias para o correto aproveitamento do espaço público e a determinação para dar consequência prática a isso.
Além de terem sido agraciados pela rara capacidade de tratar mais adequadamente que os outros administradores o espaço público e pelo privilégio de fazer "descobertas" importantes, como a de que o transporte coletivo deve ter prioridade numa cidade como São Paulo, Haddad e Tatto demonstram ainda possuir agudo senso prático, que lhes permite escolher soluções ao mesmo tempo baratas e de grande alcance.
Para que esperar a conclusão dos 150 km de corredores projetados até 2016, cujo custo médio é estimado em R$ 29 milhões por quilômetro, se as faixas são muito mais baratas - R$ 50 mil por quilômetro? Em um ano, inundou-se a cidade de faixas - 300 km, quando a previsão era de 150 km até o fim do governo. Com as ciclovias não será diferente - a R$ 200 mil por quilômetro, elas sairão por R$ 80 milhões.
Por um preço relativamente baixo, o atual governo mexe na estrutura viária da cidade de forma improvisada, sem planejamento e com muita demagogia. Uma irresponsabilidade. Consertar tudo isso não será fácil nem barato. Supondo, só para argumentar, que as ciclovias anunciadas fossem necessárias - o que é no mínimo duvidoso -, onde estão os estudos técnicos consistentes que as justificariam? Ou Haddad pensa construir 400 km delas, assim, sem dar maior satisfação ao distinto público, eliminando 40 mil vagas de estacionamento, numa cidade que carece delas?
Tanto a cidade carece que o próprio Haddad abriu licitação para a construção de três garagens subterrâneas, no Mercado Municipal e nas Praças Fernando Costa e Roosevelt.

É fácil encher o peito e, demagogicamente, iniciar uma cruzada contra os carros. Difícil é responder o que se fará com os milhões de pessoas que os utilizam diariamente - estima-se que os carros são responsáveis por um terço dos deslocamentos. Proclamar a prioridade ao transporte coletivo - que ninguém contesta - não basta. É preciso melhorá-lo de fato, para servir de alternativa aos carros.