12 de janeiro de 2014 | 2h 06
CELSO MING - O Estado de S.Paulo
A boa vontade das famílias brasileiras com a reciclagem de resíduos domésticos pode estar seguindo caminhos errados. As instruções para lavar as embalagens recicláveis antes do descarte e a separação de materiais como vidro, papel, plástico e metais nas conhecidas lixeiras coloridas incentivam consumo excessivo de água potável e elevam custos da coleta seletiva.
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É nesses termos que o professor Emílio Eigenheer, da Pós-graduação em Ciência Ambiental da Universidade Federal Fluminense (UFF), questiona certos procedimentos: "A que custos se devem aumentar os índices de reciclagem? A água tratada é um recurso valiosíssimo. É bobagem esse imaginário de que tudo tem que estar limpinho para ser reciclado".
O diretor executivo da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), Carlos Silva Filho, explica que não há necessidade de separar ou higienizar o lixo reciclável, bastando separar os secos dos orgânicos e garantir que não há resto de alimentos nas embalagens.
Primeiro, porque a coleta multifrações, na qual cada tipo de material é recolhido separadamente, custa quatro a seis vezes mais do que a coleta dual, na qual se separa apenas lixo seco e orgânico. Segundo, porque são as empresas especializadas que detêm conhecimento técnico sobre a composição das embalagens e o destino correto para cada uma delas. Para Silva Filho, também é despropositado gastar água com produtos que mais tarde serão tratados adequadamente.
Até 2012, o custo da coleta seletiva de resíduos ainda era 4,5 vezes superior ao modelo convencional.
O Brasil é líder mundial na reciclagem de latas de alumínio desde 2001, mas só 14% dos municípios possuem sistema de coleta seletiva, aponta pesquisa do Compromisso Empresarial para Reciclagem, Cempre, (veja o gráfico).
Em São Paulo, apenas 2% do lixo doméstico é recolhido pela coleta seletiva, embora o serviço atenda 46% dos domicílios. A Prefeitura pretende ampliar esse volume para 10% até 2016, com a instalação de quatro centrais mecanizadas de reciclagem, cada uma com capacidade de processar 250 toneladas por dia. De início, o objetivo é trabalhar com materiais secos em parceria com 22 cooperativas. Já o processamento de materiais orgânicos só deve ser implantado em 20 anos, afirma Júlia Lara, diretora de Planejamento da Autoridade Municipal de Limpeza Urbana (Amlurb).
Para Sabetai Calderoni, presidente do Instituto Brasil Ambiente e consultor da Organização das Nações Unidas (ONU) para gestão de resíduos sólidos, o modelo está demasiadamente centrado na reciclagem de embalagens. "São Paulo está vergonhosamente aquém do que poderia alcançar em coleta seletiva e esse novo sistema fará apenas o enfardamento dos resíduos para o setor privado."
De nada adianta o entusiasmo se falta esclarecimento à população sobre a melhor maneira de descartar e separar o lixo doméstico; se falta investimento do poder público na estrutura adequada de coleta seletiva; e se faltam condições para que a indústria recicladora receba materiais com constância e se desenvolva. / COLABOROU DANIELLE VILLELA