quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Planalto desiste de Chalita no ministério


O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - O Palácio do Planalto decidiu excluir o deputado Gabriel Chalita (SP) da reforma ministerial preparada pela presidente Dilma Rousseff. Ele era cotado para assumir a pasta de Ciência e Tecnologia após ter apoiado a candidatura de Fernando Haddad em São Paulo no 2º turno, mas foi descartado após as acusações de que teria recebido propina quando era secretário da Educação do Estado, na gestão Geraldo Alckmin (PSDB).
Para compensar o PMDB, Dilma planeja pôr o partido do vice-presidente Michel Temer no Ministério dos Transportes, hoje comandado por Paulo Sérgio Passos, que é do PR, embora a direção da legenda diga que ele integra a "cota pessoal" da presidente. A ideia de Dilma é abrigar o deputado Leonardo Quintão, do PMDB de Minas, na vaga hoje ocupada por Passos, mas ela ainda não bateu o martelo sobre a indicação.
Quintão abriu mão da candidatura a prefeito de Belo Horizonte, no ano passado, para apoiar o petista Patrus Ananias, que perdeu a eleição para Marcio Lacerda (PSB), aliado do senador Aécio Neves (PSDB). O deputado fez o gesto atendendo a um pedido de Dilma. Agora, o governo poderá pagar a fatura. O dilema da presidente é onde abrigar o PR .
Dilma disse a parlamentares que não quer transformar o ministério em um "paulistério", com maioria dos representantes de São Paulo, e pediu a auxiliares indicações de outros Estados, principalmente de Minas. Hoje, dos 38 ministros, 11 são de São Paulo.
Hoje, há quatro ministros do PT que sonham com a cadeira de Alckmin. Alguns têm chance de obter o aval do partido, outros não, mas o fato é que Alexandre Padilha (Saúde), Aloizio Mercadante (Educação), Marta Suplicy (Cultura) e José Eduardo Cardozo (Justiça) são os nomes do primeiro time à espera da bênção de Dilma e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
"Me inclua fora dessa", desconversa Padilha, que já programou a transferência do seu domicílio eleitoral do Pará para São Paulo. Mercadante, por sua vez, repete como mantra que só pensa em seu trabalho na Educação. "É nisso que estou focado", diz.
Nas fileiras do PMDB, Chalita também é pré-candidato ao governo de São Paulo. O peemedebista nega as acusações de enriquecimento ilícito e diz não ter envolvimento com fraudes no governo paulista. / VERA ROSA, TÂNIA MONTEIRO e DÉBORA BERGAMASCO

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Homem novo, truque velho



SÃO PAULO - Gilberto Kassab vai-se tornando o político dos sonhos de qualquer governo. Inclina-se a apoiar todos eles, e de todos participar com seu partido, sem importar-se com a cor da camisa.
Agora o seu sucessor na prefeitura desta capital descobriu mais uma utilidade de Kassab. O líder do PSD aceita numa boa posar de bode expiatório para as mazelas da cidade sob a gestão do "homem novo", o petista Fernando Haddad.
Alagou? Deu pane nos semáforos? Caíram centenas de árvores? Apagou a luz? Embolou o tráfego? Tudo culpa do Kassab. O ex-prefeito resmunga um pouco, mas assimila o golpe, como assimila as vaias de petistas nos encontros públicos do partido de Lula, seu dileto aliado.
A velha tática de acusar a "herança maldita" de gestões passadas soa cômica nesse caso. Haddad franqueou ao kassabismo um pedaço generoso da sua administração -a estatal de eventos SPTuris, com seus gordos contratos e salários.
Na habitação, o feudo ficou com o fotogênico Paulo Maluf, outro ex-prefeito antes amaldiçoado pelo petismo. Numa conta simples, o governo do homem novo carrega em seu DNA traços marcantes dos caciques que fizeram o que fizeram na cidade nos últimos 20 anos.
Marcante foi também o primeiro teste para Haddad mostrar, na prática, a sua originalidade e o seu compromisso com as promessas. A montanha da ampla flexibilização alardeada no programa de inspeção veicular pariu um rato quando chegou à Câmara. Um vexame para quem acaba de sair das urnas com 3,4 milhões de votos.
Mas a máquina de atribuir responsabilidade aos outros não deu trégua. A prefeitura pôs-se a "pressionar" o governador do Estado para que estabeleça inspeção obrigatória em veículos da Grande São Paulo.
Quando vai começar a gestão nova de Fernando Haddad? A velha já começou.
Vinicius Mota
Vinicius Mota é Secretário de Redação da Folha. Foi editor de Opinião (coordenador dos editoriais) e do caderno Mundo. Escreve a coluna São Paulo, na página 2.

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Para Bacha, Brasil sofre de 'doença holandesa'


RAQUEL LANDIM / SÃO PAULO, FERNANDO DANTAS / RIO - O Estado de S.Paulo
Nem os economistas ortodoxos parecem ter dúvidas de que está em curso uma "desindustrialização" no Brasil. A perda de relevância da indústria é tão grave que o País foi diagnosticado com "doença holandesa" - um mal que se abateu sobre a Holanda em 1960, quando o aumento do preço dos gás atraiu capitais e valorizou o câmbio, reduzindo a competitividade dos produtos manufaturados.
O diagnóstico da "doença holandesa" é de Edmar Bacha - um dos "pais" do Plano Real - e está no livro O Futuro da Indústria no Brasil, da Editora Civilização, que chegou às livrarias na sexta-feira. O livro reúne artigos de economistas renomados, que participaram de dois debates na Casa das Garças, tradicional reduto tucano.
Na introdução, Bacha e Mônica Baumgarten de Bolle, diretores da Casa das Garças, afirmam que os dados são "contundentes": a indústria de transformação teve seu auge no País em 1985, quando respondeu por 25% do Produto Interno Bruto (PIB). Essa participação caiu para 15% em 2011 e pode ter chegado a 12% no ano passado.
Bacha se debruçou sobre o período recente e concluiu que, entre 2005 e 2011, a "desindustrialização" foi uma consequência "natural" dos anos de "bonança externa", em que a explosão do preço das commodities e a condição de "queridinho" do mercado trouxeram uma "enxurrada" de capitais para o Brasil.
O raciocínio do economista é mais sofisticado que a tese de que a culpa é do câmbio forte. Ele explica que a abundância de capitais permitiu ao brasileiro consumir mais, reduziu o desemprego a níveis muito baixos, especialmente no setor de serviços. "A doença holandesa está associada à bonança externa. Os salários subiram mais rápido que os preços. Isso estrangulou a indústria", disse Bacha.
Competitividade. O fraco desempenho da indústria no Brasil nos últimos quatro anos tem como principal causa a piora da sua competitividade, segundo o capítulo escrito pelos economistas Beny Parnes, professor da PUC-Rio, e Gabriel Hartung, do banco BBM. Eles compararam o custo da indústria brasileira com Estados Unidos, Alemanha, Itália, Espanha, Japão, Coreia, Cingapura e Taiwan, entre outros países.
No Brasil, entre 2006 e 2011, os salários médios em dólares cresceram 96% (14,4% ao ano), bem mais do que em todas aquelas economias. O segundo maior crescimento entre os países pesquisados foi o da Austrália, onde houve alta dos salários em dólares de 54% (9% ao ano).
A disparada dos salários em dólares combinou-se com uma aumento da produtividade da indústria brasileira no mesmo período de apenas 9%, ou 1,7% ao ano - um ritmo similar ao das economias avançadas, mas muito inferior ao dos países asiáticos.
Parnes e Hartung explicam que seria de se esperar que países em desenvolvimento, como o Brasil, tivessem crescimento da produtividade superior ao do mundo desenvolvido. Isso ocorre porque os emergentes podem rapidamente fazer o "catch-up" (eliminar a defasagem) em relação a tecnologias já conhecidas, enquanto os países ricos precisam necessariamente inovar para dar saltos de produtividade.
No seu trabalho, os dois economistas fazem análises cuidadosas que indicam que nem a queda global da indústria nem problemas de demanda podem explicar completamente a parada industrial no Brasil nos últimos anos. Eles apontam que "é mais fácil obter avanços de produtividade no setor industrial", mas isso não está ocorrendo na velocidade desejada.
A bonança externa reduziu a participação da indústria na economia brasileira, mas Sérgio Lazzarini, professor do Insper, e Marcos Yank, especialista em temas globais, estão longe de ver a especialização em commodities como uma "maldição" e querem acabar com o "mito" de que commodities são produtos de baixo valor agregado.
Eles calculam que extrair minério de ferro gera R$ 507 mil de valor agregado por trabalhador, acima dos R$ 395 mil da metalurgia e dos R$ 238 mil do setor de equipamentos de informática.
Remédio. Bacha não está otimista sobre o futuro da indústria no Brasil. Ele defende a adoção de uma política industrial, mas diferente dos modelos utilizados nos últimos anos. E receita um remédio amargo para o empresariado: mais abertura comercial.
"A solução é abrir a economia. O Brasil é apenas 3% do PIB global. Não é fechando o mercado que a indústria vai ganhar competitividade e comprar insumos mais baratos." A indústria não precisa produzir "tudo" e deve se especializar.