domingo, 10 de junho de 2012

A epidemia do vício, do site Opinião & Notícia


The Fix. Por Damian Thompson. Collins; 279 páginas; £18.99
Obesa, descontrolada, viciada em jogos, pílulas, pornografia, e apetrechos tecnológicos, a humanidade moderna se depara com tentações para as quais é mal equipada para resistir. Damian Thompson, um jornalista britânico que parou de beber após 14 anos de alcoolismo, produziu um relato informativo e divertido do que ele retrata como uma epidemia do vício.
A sua principal mensagem em The Fix é que os viciados não sofrem de uma doença. Ele argumenta que o comportamento do dependente é essencialmente voluntário: uma desordem cerebral química pode influenciar o dependente a fazer más escolhas, que, apesar da má qualidade, são escolhas. O ambiente também intensifica a tentação: o autor cita a epidemia de vício em heroína entre tropas norte-americanas na guerra do Vietnã. A maioria dos soldados descartou o hábito ao voltar para casa.
O livro – escrito em um estilo ágil que camufla a sua profundidade – presta uma atenção especial à química cerebral. Um conjunto de circuitos mentais diz às pessoas para consumirem o máximo possível: a comida que está aqui hoje pode ter desaparecido amanhã. Outras partes mais sofisticadas permitem que elas se restrinjam. A vida moderna, argumenta Thompson, está confundindo as partes inteligentes e superestimulando as funções mais primitivas que encorajam a perda de controle. A dopamina – o neurotransmissor associado ao desejo – desempenha um papel importante: Thompson a chama de “droga mestra”. Ela contribui para que as pessoas continuem a desejar coisas que já não lhes dão prazer.
As empresas miram em tais fraquezas, utilizando-se de tecnologia alimentícia para criar combinações de gordura, sal e açúcar. Designers de jogos de computadores testam seus produtos para torná-los viciantes.
Ou seja, tanto a necessidade de manipular sentimentos quanto a habilidade para fazê-los cresceram de modo colossal. Inovações produzem vícios baratos, fortes e insalubres fortemente vinculados ao que outrora eram atividades prazerosas ligadas a metas evolucionárias (nutrição, socialização e reprodução). Hoje em dia eles estimulam as pessoas muito além da satisfação de suas necessidades biológicas. Condicionados pela evolução para procurar prazer onde sabemos que podemos encontrá-lo, nos encontramos agora em um ambiente que “nos bombardeia com recompensas de que nossos corpos não precisam e que não ajudam em nada a garantir nossa sobrevivência como espécie”.
Reagir a isso, o autor argumenta, vai requerer que as pessoas recuperem a vigilância que seus ancestrais caçadores-coletores já tiveram em relação a riscos letais. Mas será que as pessoas estão dispostas a abandonar os seus vícios?

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Despresunção de inocência


Renato Lessa - O Estado de S.Paulo


Há poucas semanas, o País, se concedido direito à metonímia, abrigou um experimento que, sem exagero, é portador de motivos para orgulho. Refiro-me à instalação em palácio da Comissão da Verdade. Ainda que seus resultados práticos sejam incertos, e pertençam antes aos domínios das mais diferentes e opostas expectativas, o evento que marcou seu lançamento abrigou ares de condensação republicana. Isso não apenas pelo cuidado de ali incluir chefes de governo que, em graus diferentes, ocuparam seus postos por força de procedimentos legítimos, mas por sugerir que o tema da verdade - de alguma verdade, ao menos - pode ter lugar na vida pública. A própria presidente, de modo eloquente e incomum na história da República, demonstrou o que podem significar a ideia e a figura de chefe de Estado.

Apesar de incertos os efeitos futuros, houve desde já um efeito imediato, qual seja o de inserir o tema da verdade em casulo distinto do de seu lugar natural. A elucidação do que ocorreu com mortos, desaparecidos e torturados, além de conferir materialidade retrospectiva à experiência do estado de exceção, amplia o conjunto de informações disponíveis a respeito da história recente do País. Mesmo que inúmeras interpretações e atribuições de sentido possam ser construídas, acena-se com a possibilidade de uma "narrativa básica", tal como o fizeram os primeiros historiadores do Holocausto; o grande Raul Hilberg, antes de todos.

Assim, e por um átimo, o tema da verdade insinuou-se de modo invulgar em nossas reflexões a respeito do País. Bastou, contudo, uma conversa mal-ajambrada e mal explicada no escritório do ex-ministro Nelson Jobim, para que o tema fosse devolvido a seu estado habitual, o da indeterminação e do disfarce. Para dizê-lo de outro modo: os dias que sucederam à instalação da Comissão da Verdade foram, como quê, dias de certa suspensão da experiência ordinária da política; o mencionado encontro a três, e as versões desencontradas e incompatíveis entre si dali emanadas, constituiu-se, por oposição, como experiência de des-suspensão ou, se quisermos, de desabamento e de gravitação natural.

Céticos, penso, antes de descartar o tema da verdade, com a falta de hesitação típica de dogmáticos pós-modernos, têm por essa dama - a verdade - sincero respeito, além de considerável pudor. Isso a ponto de recusar inscrever o termo "verdadeiro" em qualquer predicado, atribuído a qualquer aparência. Céticos, sobretudo, não são necessariamente parvos: não saber onde está a verdade não impede a presença de uma sensibilidade para com o implausível. Juízos de plausibilidade são suficientes para que nos movamos no mundo e configuremos nossas orientações e escolhas. Há, por certo, no episódio um abismo insondável: qual dos três protagonistas "diz a verdade"? Questão grave, diante da qual muitos não hesitarão em apresentar respostas definitivas, todas movidas por inclinações afetivas e biliares. Como, então, lidar com o abismo da indeterminação da verdade, nesse caso?

Sugiro, no que segue, uma série de procedimentos aproximativos. Antes de tudo, parece ser sábio adotar algo que poderia ser designado como uma despresunção de inocência dos envolvidos. Se, do ponto de vista penal, o procedimento é inaceitável, do ponto de vista cognitivo a coisa pode ser útil: se há suporte para supor que o ex-presidente Lula quis "melar" o julgamento do mensalão, pela abordagem ao ministro Gilmar Mendes, há idêntica plausibilidade em supor que este quis "melar" a defesa, ao pôr a boca no trombone, e evitar o tratamento apropriado e institucional da suposta ofensa. 

Portanto, a abordagem do ocorrido poderia iniciar pela consideração de aspectos internos e inerentes. Há no âmago do evento uma série de implausibilidades: a casualidade do encontro, a amnésia do ex-ministro Jobim, a indeterminação da fonte para a matéria-denúncia, a participação do ministro Gilmar apenas como confirmador do trabalho dos repórteres, etc.

Uma abordagem externalista poderia partir de uma premissa simples: uma conversa dessa natureza não poderia ocorrer. Isso tanto por razões de ordem, digamos, republicanas, mas sobretudo pelo déficit de confiança, ao que parece, envolvido na interação. As hipóteses são todas abjetas: se a narrativa do ministro Gilmar Mendes corresponde à verdade, algo de grande gravidade terá ocorrido; se for inverídica, algo de gravidade grande se passou. 

De um ponto de vista consequencialista, ao que parece o episódio foi vencido por quem pretende garantir forte carga dramática ao julgamento prestes a ser feito, e em neutralizar juízes neófitos, supostamente gratos por suas investiduras. Não é recomendável ver na reação do ministro Gilmar nada mais do que manifestação de ultraje pessoal e institucional.
O pano de fundo disso tudo parece ser uma experiência de república na qual o direito penal vale como  recurso de inteligibilidade. Diante da indeterminação da verdade, e do esforço militante de fazê-la cada vez mais inapreensível e irrelevante, o desejo infrene de prender os inimigos vale como único recurso de fixação de sentido. Ao que parece, após uma breve incursão do espírito, estômago e fígado repõem suas pretensões a sedes fisiológicas da consciência política nacional.
RENATO LESSA É PROFESSOR TITULAR DE TEORIA POLÍTICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE, INVESTIGADOR ASSOCIADO DO INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DA UNIVERSIDADE DE LISBOA E PRESIDENTE DO INSTITUTO CIÊNCIA HOJE

Busca da eficiência energética,no Brasil Econômico


O gasto com combustível pode superar 35% do custo operacional de caminhões pesados em trajetos longos. Este consumo sobe 10% com falta de manutenção e até 25% com excesso de peso. Cerca de 40 mil veículos a diesel rodam fora dos padrões ambientais no estado, consumindo e poluindo mais.
E ainda há a má qualidade do diesel nacional, que prejudica a saúde e diminui a vida útil dos motores. O resultado da falta de eficiência? Perda de competitividade, má qualidade de vida e emissão anual de 40 milhões de toneladas de CO2.
Tema pouco debatido no Brasil, sobretudo numa época de estímulos à compra de veículos como meio de aquecer a economia, a eficiência energética de combustíveis é questão central num cenário de transição para a economia verde e de busca por ganhos de competitividade no setor produtivo.
Vale lembrar que São Paulo tem ainda uma Política Estadual de Mudanças Climáticas para cumprir - cortar 20% da emissão de poluentes até 2020. O primeiro passo de uma política de eficiência energética de combustíveis é a redução da demanda e do desperdício no transporte.
Como 93% das cargas no estado circulam por rodovias, a dinamização da infraestrutura, a integração da rede multimodal e o planejamento logístico têm sido prioritários na revisão do Plano Diretor de Transportes.
Só em projetos já inclusos no PPA 2012-2015 da Secretaria de Logística e Transportes, estima-se a economia anual de 1 bilhão de litros de derivados de petróleo a partir de 2020, além de 2,6 milhões de toneladas de CO2 a menos.
O mesmo se dá no transporte de passageiros. A partir de 2020, a extensão da rede de metrô, trens metropolitanos e monotrilhos deve poupar 880 milhões de litros de gasolina e 470 milhões de litros de diesel por ano, evitando a emissão de 2,2 milhões de toneladas de CO2.
A implantação de corredores metropolitanos pela EMTU até 2014 fará crescer o número depassageiros e cair o tempo de deslocamento, otimizando o uso da frota. Estima-se uma melhoria de 25% na relação passageiro por litro de diesel, além da substituição do carro pelo ônibus por 30% dos novos usuários.
A gama de ações é ampla: vai do reforço do controle da regulagem e do peso dos caminhões à substituição de energéticos poluentes; da melhoria da qualidade dos combustíveis à pesquisa e teste de novas fontes.
Também são importantes os aperfeiçoamentos logísticos, como a redução das viagens com caminhão vazio, e o estabelecimento de metas de eficiência para veículos, com etiquetagem e políticas de alíquotas diferenciadas para os mais econômicos e menos poluentes.
No mundo todo, os programas de eficiência em combustíveis resultaram em ganhos superiores a quaisquer outras iniciativas de promoção da competitividade com sustentabilidade.
O Plano Paulista de Energia, a ser lançado em breve, dá grande ênfase à questão, inclusive estabelecendo uma audaciosa meta global de economia. Seria importante um alinhamento das políticas estaduais correlatas ou o estabelecimento de diretrizes nacionais únicas ou integradas. Os ganhos seriam exponenciais.
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José Anibal é secretário de Energia do estado de São Paulo