terça-feira, 9 de abril de 2024

|Ensinar! Quem consegue?, José Renato Nalini - OESP

 É truísmo afirmar que o maior problema brasileiro é a falta de educação. Em todos os níveis e sob todos os aspectos. Incompreensível que, diante dessa constatação irrefutável, não se valorize mais a profissão docente. O professor só é prestigiado em poesia, em textos edificantes, no capítulo lendário das tradições. Não o é na prática.

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Visitei inúmeras escolas e fazia questão de entrar de sala em sala de aula. Educandos de todas as idades. Costumava indagar qual a preferência deles em relação ao futuro pessoal. O que gostariam de fazer?

Nunca surgiu, espontaneamente, a profissão professor. É um sintoma de que não se valoriza aquele encarregado de transmitir lições que preparem o aluno para a vida.

Houve tempo em que pessoas famosas, quando entrevistadas, se recordavam de seus mestres. Mantinham a memória afetiva em redoma, atribuíam ao talento de quem os ensinou o sucesso obtido pelo discípulo.

Hoje tenho a sensação de que os estudantes sequer sabem o nome do professor ou professora. Parece desaparecida a prática de enaltecer esses guias. Algo que ocorria no ensino jurídico no século passado. É que hoje todos são convidados a ensinar, sem o prévio preparo, essencial a quem se disponha a formar novos quadros.

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É preciso aprender a ser professor? Acredito que sim.

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O grande Lafayette Rodrigues Pereira, era instado a voltar a lecionar na Faculdade de Direito e respondia a quem insistisse com ele: “Não posso, menino, ensinar; não tenho mais tempo para estudar!”. Para quem estranhasse a resposta, aduzia: “Cujácio, e era Cujácio, estudava catorze horas de um dia para dar uma lição no dia seguinte”.

Hoje, o ensino de direito é intercalado por noticiário da mídia espontânea, que acompanha a produção dos tribunais e acompanha, a cada dia, as múltiplas interpretações que se extraem da prolífica normatividade editada sem cessar.

Os cursos jurídicos estão a servir o sentimento de beligerância que se afasta do ideal de Justiça, como ela deveria ser concebida. A finalidade do direito é harmonizar, é pacificar, é fazer cessar a discórdia e contribuir para a obtenção do diálogo. Um país que tem mais Faculdades de Direito do que a soma de todas as outras existentes no restante do planeta deveria ser um exemplo de permanente prática na composição consensual das controvérsias. Não é assim.

O Brasil já chegou a ter cem milhões de processos judiciais em curso. Hoje, reduziu-se para cerca de setenta e sete milhões. Dos quais, vinte e um milhões estão na Justiça Paulista, a maior da República e uma das maiores do globo.

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Tudo chega, inevitavelmente, à apreciação do Judiciário. Insignificâncias, questões administrativas, formais, despidas da conflituosidade que justificaria por em ação um equipamento dispendioso, complexo e, por isso mesmo, lento e nem sempre eficaz.

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Sim. Um processo judicial que termina, após percorrer quatro instâncias – juiz de primeiro grau, tribunal local, Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, para permanecer no caminho da Justiça comum estadual, a maior estrutura brasileira – nem sempre significa a solução do problema que angustiou as partes. É uma resposta jurídica, não necessariamente completa e justa.

Se existisse um curso de formação de docentes para o universo jurídico, ele precisaria inverter essa cruel equação que hoje persiste, ranço da importação de um modelo arcaico, o de Coimbra. Quando Pedro I trouxe as duas primeiras Faculdades de Direito para o Brasil que se tornara independente de Portugal, serviu-se daquele que o Imperador conhecia: o ensino jurídico ministrado na Universidade de Coimbra.

Era o ano de 1827. O modelo coimbrão era inspirado em Bolonha. A Universidade de Bolonha é do século XIV. Mas ensinava-se direito ali, desde o oitocentos. Eram mil anos de experiência. Trazidos sem qualquer adaptação ao Império do Brasil. E assim permaneceu até hoje.

Ensinar a ensinar, uma tarefa da qual não se desincumbem, ao menos como deveriam, os responsáveis pela educação jurídica. Poucos os que percebem que a obtenção de um acordo é muito mais vantajosa. Os protagonistas do drama participam da obtenção do ajuste. A solução é mais aceita, pois legítima. E poupa-se aquele insumo que ninguém consegue recuperar ou devolver: o tempo.

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