O esquema de empresas de ônibus em São Paulo usadas para lavar dinheiro do PCC (Primeiro Comando da Capital), denunciado pelo Ministério Público nesta terça-feira (9), incluiu passado de ameaças e extorsões contra ex-perueiros, autônomos que dominaram o transporte público na capital durante boa parte da década de 1990.
As acusações recaem sobre a Transwolff, empresa de ônibus que atua na zona sul da cidade comandada por Luiz Carlos Efigênio Pacheco, o Pandora, preso durante operação da Promotoria nesta semana.
A empresa é alvo de pedido dos promotores de indenização por dano moral coletivo de R$ 596.290.746,00, mesmo valor da renda bruta declarado em 2021 à Junta Comercial.
No fim da década de 1990, a gestão do então prefeito Celso Pitta (1946-2009) deu início à tentativa de ordenação do transporte público em São Paulo, dominado, até então, pelas lotações, veículos irregulares que rodavam a cidade com passageiros conduzidos pelos chamados perueiros.
O vácuo na oferta do serviço de ônibus era vigente desde 1993, quando foi iniciada a privatização da CMTC (Companhia Municipal de Transportes Coletivos). Os contratos, até então restitos à companhia, foram diluídos por regiões da capital e assumidos por diferentes empresas.
Em 2003, o sistema de transporte público mudou mais uma vez, e a cidade foi dividida em oito regiões. Cada uma foi concedida a consórcios formados por cooperativas de profissionais autônomos que precisaram se organizar para aderir ao sistema de repasses da estatal SPTrans (São Paulo Transportes S/A), entre elas, a Cooperpam, que dominava as linhas da zona sul junto com a Cooperauthon.
Pelas regras, os cooperados detinham individualmente a licença de transporte de passageiros e os veículos. Em contrapartida, tinham que fazer repasses semanais às cooperativas. Em vez de concessionários, esses profissionais eram permissionários, quando não há prazo definido para o fim da concessão do serviço público.
Cabiam às cooperativas receber os pagamentos da SPTrans e repassá-los aos cooperados. Com o tempo, a Cooperpam foi absorvida pela Transwolff, e essa dinâmica passou a ser permeada por ameaças e extorsões aos cooperados, segundo o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado de São Paulo) do Ministério Público.
De acordo com os promotores, a situação se agravou a partir de 2008, quando houve redução dos valores dos repasses, sem nenhuma transparência. Tudo isso, segundo a Promotoria, para forçar os então cooperados a renunciarem a suas cotas e permissões sem qualquer tipo de compensação.
Antes disso, em 2006, o dono da Transwolff já tinha iniciado uma rotina de ameaças de agressões físicas aos cooperados que integravam a Cooperpam, ainda segundo o Ministério Público. Ex-cooperados relataram em ações judiciais terem sido coagidos a assinarem pedidos de demissão em que também se comprometiam a abrir mão de qualquer direito patrimonial e contrapartida financeira.
Ao menos 26 ações judiciais foram movidas por ex-integrantes da Cooperpam para cobrar os repasses previstos no estatuto social e que nunca teriam sido pagos após os desligamentos.
Os que recusavam as condições impostas eram descredenciados da SPTrans (São Paulo Transportes S/A), o que os impedia de rodar com os ônibus pela cidade, diz a Promotoria.
Nesse período, de 2015 a 2019, Pandora era dono da Transwolff (chamada de TW na época), e Robson Flares Lopes Pontes, responsável pela Cooperpam.
Pontes também foi preso na terça acusado de ser integrante do PCC; ele é irmão de Gilberto Flares Lopes Pontes, o Tobé, um dos líderes da facção criminosa, morto em 2021.
"A prática de amedrontar, ameaçar e forçar os cooperados a assinarem o indigitado termo ternou-se comum na rotina da Cooperpam, na medida em que, somente por meio da referida 'doação', poderia incorporar o patrimônio de seus cooperados", diz trecho da denúncia do Gaeco.
A empresa foi procurada pela reportagem, mas não respondeu.
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