A decisão da Petrobras de reter o pagamento dos dividendos extraordinários numa reserva tem por trás pelo três variáveis em jogo.
Duas dessas variáveis impactam diretamente o Orçamento do governo neste ano e em 2025 e vão muito além da receita extra que a União teria com os dividendos extraordinários, como acionista majoritária da companhia.
A trava no pagamento dos dividendos dificulta qualquer equação para a companhia aceitar acordo de encerramento de litígios com a Receita Federal com base nas regras da lei do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais).
Ao contrário da receita de dividendos extraordinários, que não está prevista no Orçamento de 2024 (isso mesmo), o ministro Fernando Haddad (Fazenda) conta com o dinheiro do acordo de transação tributária para o cumprimento da meta fiscal de zerar o déficit.
Não se sabe ao certo quanto a Fazenda está contando de receitas da Petrobras com a lei do Carf. Mas Haddad já disse que um terço do ajuste fiscal prometido para este ano viria do Carf. E a expectativa do ministro era de que boa parte dessa arrecadação viesse da Petrobras.
Como a empresa vai agora justificar se desfazer de caixa para fazer uma transação tributária diante da retenção dos dividendos por razões de cautela para enfrentar dificuldades no futuro que ameacem a credibilidade do plano de investimentos?
Se a própria empresa resolveu formar uma reserva grande para o futuro, não faria sentido algum fazer um acordo que tiraria dinheiro do seu caixa.
É certo que, sem pagar pelo menos uma parte dos dividendos, será muito mais complexo avançar numa negociação com o Carf.
Acordo que, aliás, já seria um processo difícil em condições normais, exigindo um processo de aprovação que inclui acionistas minoritários. Antes do impasse com os dividendos, já sabia que os valores seriam bem menores do que os R$ 30 bilhões que Haddad contava no ano passado.
A segunda variável em jogo tem reflexo no tamanho do espaço fiscal que o governo Lula tem para aumentar despesas em 2025 e fazer mais investimentos públicos.
Pelas regras do novo arcabouço fiscal, se os recursos de um eventual acordo para encerrar litígios ingressarem ainda no primeiro semestre deste ano no caixa do Tesouro, essa arrecadação entrará no cálculo para a definição do tamanho do crescimento das despesas no ano seguinte. Até o limite de alta de 2,5% real permitido na nova regra fiscal.
Quanto maior for a arrecadação da transação da lei do Carf, mais próximo o governo consegue chegar no teto de 2,5%, ampliando o espaço que Lula terá à disposição para gastar mais no penúltimo ano do seu governo.
É bom ressaltar: receitas oriundas de dividendos das estatais não podem entrar nessa conta pelo arcabouço fiscal.
A terceira variável diz respeito à calibragem do tamanho da reserva técnica que a Petrobras precisa fazer para não diminuir o nível de confiança da execução do plano de investimentos dentro do seu limite de endividamento.
Em outras palavras, qual o percentual de pagamento de dividendos que mitigaria a queda do nível de confiança da execução do plano caso haja um choque não previsto, no futuro, que deixe a empresa menos resiliente.
Importante destacar que a Petrobras tem um caixa robusto e a reserva técnica dos dividendos não pode ser usada para ampliar investimentos.
Se essa cautela técnica é muito grande, como os conselheiros decidiram, não há outra coisa a dizer: a estatal está vendo um risco elevado no futuro. Se esse risco existe, o governo não tem como sustentar as duas variáveis anteriores.
Calibrar o tamanho da distribuição dos dividendos extraordinários passa a ser essencial para resolver o impasse a partir de agora.
Fora o embate político entre o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, e o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, que pode terminar na queda de um ou de outro, a crise mostrou que faltou não só uma comunicação profissional da companhia, mas também mais informações para a tomada de decisão do Conselho de Administração.
É preciso resolver logo o estrago, que macula não só a imagem da Petrobras, mas também a política econômica de Haddad que tenta garantir segurança para os investidores aplicarem seus recursos no país.
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