domingo, 31 de março de 2024

60 anos do golpe; 39 anos de democracia- editorial FSP

 


Há 60 anos, os militares fulminaram pelo golpe o regime constitucional iniciado em 1946. Há 39 anos, o país enterrou a ditadura e instalou o seu mais longevo período democrático. É preciso relembrar, por motivos distintos e complementares, esses dois marcos.

A ruptura de 1964 ilumina alguns aspectos da atualidade, em meio às investigações da Polícia Federal sobre movimentações golpistas para impedir a sucessão presidencial decretada nas urnas em 2022.

O Exército de Humberto Castello Branco não é o mesmo Exército de Marco Antônio Freire Gomes. O primeiro aderiu em bloco e sem hesitar ao intervencionismo em voga na Força desde 1889. O segundo repeliu o assédio de um presidente da República autoritário.

O organismo político desenvolveu imunidade ao vírus do retrocesso. Segundo o Datafolha, 71% da população entende que a democracia é sempre melhor que qualquer outra forma de governo.

A insurreição que depôs João Goulart recebeu apoio de vários setores da sociedade civil, do empresariado à imprensa —inclusive o desta Folha, um erro já admitido pelo jornal. Em 2022 os nostálgicos da truculência ficaram isolados.

É lamentável, aliás, que o atual presidente se veja constrangido a evitar atos de governo a respeito do aniversário do golpe.

Rememorar as conquistas do regime democrático fundado em 1985 —e consolidado na Carta de 1988— completa o quadro dos ensinamentos suscitados pela efeméride e nos informa sobre as razões da solidez institucional do Brasil.

Os últimos dois terços das seis décadas que nos distanciam de 31 de março de 1964 foram percorridos ininterruptamente sob a democracia. Milhares de eleições foram realizadas na Nova República, com todos os resultados rigorosamente respeitados. Oposições e governos ganharam e perderam.

O período sob o regime das liberdades já é longo o suficiente para que mais da metade da população brasileira atual tenha nascido na vigência da democracia. Não passa pela cabeça da esmagadora maioria se submeter a tiranetes que decidem o que se pode fazer ou dizer no país.

A democracia controlou a inflação, equilibrou as contas externas, universalizou o acesso ao ensino básico e à saúde e estendeu um amplo colchão de seguridade social, feitos de que o regime anterior jamais chegou perto.

Não se cogita enfrentar as mazelas que persistem —como a má qualidade do ensino, a desigualdade da renda, a precária cobertura do saneamento e a baixa produtividade econômica— por outro caminho que não o do Estado democrático de Direito.

Os poucos celerados que recentemente desafiaram esse rochedo institucional responderão por seus atos nos tribunais. A eles estarão garantidos os direitos ao contraditório e ao devido processo, itens que jamais facultariam a seus opositores na ditadura que, em seus delírios, pensaram em reinstalar.

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