Encontrar os limites de atuação do Poder Legislativo e do Poder Executivo em políticas públicas e decisões administrativas é a principal competência do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo. Esta tarefa é exercida no julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs), propostas pelo governador, prefeitos, Assembleia Legislativa, Câmaras Municipais, Ministério Público, partidos políticos e associações de classe e empresariais contra normas aprovadas.
Em 2022, o Órgão Especial colocou em pauta 1.030 ADIs. No mérito, foram julgadas 911 – 30% a mais do que no ano anterior, seguindo a tendência geral desse tipo de demanda. O estado e 320 municípios tiveram leis questionadas na corte.
O índice de inconstitucionalidade das normas chegou a 89%, no todo ou em parte: 810 ADIs procedentes e 101, improcedentes. O mesmo índice foi constatado em 2021, menor apenas do que os 90% de inconstitucionalidade de 2012, ano em que o Anuário da Justiça São Paulo publicou pela primeira vez este ranking.
Para se ter uma ideia, no Supremo Tribunal Federal, o índice de inconstitucionalidade foi de 67,5%, em 2022. Ao todo, os ministros julgaram 382 ADIs no mérito – 257 delas procedentes no todo ou em parte.
Em São Paulo, o município de São José do Rio Preto saiu do 3º lugar para o topo do ranking de inconstitucionalidade em 2022. Das 44 leis julgadas, apenas cinco tiveram o texto totalmente aprovado pelos desembargadores. O principal autor dessas ações foi o prefeito da cidade, numa clara disputa política com a Câmara Municipal. Três ações foram propostas pelo Psol e duas, pela Procuradoria-Geral de Justiça de São Paulo.
Uma das leis questionadas tratava do plano de prevenção aos impactos da covid-19 na economia local, em que o Poder Legislativo autorizava o Executivo a conceder incentivos fiscais por decreto. De acordo com o Órgão Especial, decreto de prefeito não pode conceder isenções e incentivos. Para isso, é necessária a edição de lei específica. O STF (ADI 1.247) já firmou entendimento de que é vedado ao Legislativo conferir essa prerrogativa ao Executivo, sob pena de ofensa aos princípios da separação de poderes e da reserva constitucional de competência legislativa.
O passe livre no transporte público aprovado pelos vereadores da cidade para pacientes pré e pós-transplante e a gestantes carentes também foi derrubado pelo TJ-SP. A iniciativa parlamentar invadiu a competência do prefeito, a quem cabe fixar o valor dessas tarifas. Os desembargadores destacaram ainda o fato de as isenções terem sido definidas sem estimativa do impacto orçamentário, o que é vedado. A criação de despesas deve vir acompanhada da indicação de recursos para custeá-las, reforça a decisão.
Este entendimento da corte não é novo e, inclusive, foi ratificado pelo STF em 2019, com base no artigo 113 do ADCT (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), incluído pela Emenda Constitucional 95/2016.
Outro tema recorrente nos julgamentos do Órgão Especial é a criação de cargos em comissão. Na ADI contra a lei de São José do Rio Preto que criou diferentes cargos para a Semae (Serviço Municipal de Água e Esgoto), a corte reafirmou que cargos técnicos só podem ser preenchidos por servidores públicos. Na decisão, citou a tese de repercussão geral do STF firmada no Tema 1.010, que pacificou a questão.
Em segundo lugar no ranking de 2022, ficou Itapecerica da Serra. Foram 34 leis contestadas e 32 delas reprovadas pelo Órgão Especial, no todo ou em parte. A cidade de Santo André também teve 34 leis em julgamento, mas o índice de procedência das ações foi menor, de 79%, o que a levou ao 3º lugar no ranking.
O Ministério Público de São Paulo é o maior autor de ADIs no estado. Em 2022, teve êxito em 94% das ações: das 434 propostas, apenas 25 foram julgadas improcedentes pelo Órgão Especial. Em entrevista ao Anuário da Justiça, o procurador-geral de Justiça, Mario Sarrubbo, disse que o MP-SP tem atuado “para afirmar a constitucionalidade de leis que asseguram e concretizam direitos sociais fundamentais impugnadas sob o espectro da violação a separação de poderes, bem como para declarar a inconstitucionalidade de leis que criam abusivamente cargos em comissão, instituem tributos indevidamente, reajustam subsídios de agentes políticos eletivos dentro da legislatura, ou ainda por omissão na fixação de percentual de cargos em comissão reservados a servidores de carreira, nas quais obtemos expressivas vitórias, inclusive na construção de teses em repercussão geral como os temas 1.010 e 970, este último referente à constitucionalidade de leis que vedam sacos e sacolas plásticas”.
Os prefeitos são quem mais respondem às ADIs (459), seguidos pela Mesa Diretora das Câmaras Municipais (436).
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