Pelas pesquisas, milhões de americanos acreditaram no Pizzagate, os boatos de que Hillary Clinton tinha ligações com uma quadrilha que aprisionava crianças no porão de uma pizzaria em Washington, a Comet Ping Pong, para usá-las como escravas sexuais.
O que você, leitor, faria se acreditasse em algo assim? Tentaria libertar as crianças ou faria avaliações negativas das pizzas ali vendidas? A maioria dos que se deram ao trabalho de fazer alguma coisa optou pela segunda alternativa. Um único indivíduo, Edgar Welch, invadiu a pizzaria atirando para libertar as crianças. Foi preso. Convenha-se, porém, que, no pressuposto de que a crença seja autêntica, foi Welch, não os críticos culinários, que tomaram a atitude razoável. Como entender isso?
O cientista cognitivo Hugo Mercier, de quem sou fã, arrisca uma explicação para esse e outros paradoxos envolvendo crenças em "Not Born Yesterday". Mercier, contrariando a expressão "nasce um otário a cada segundo", sustenta que humanos não somos uma espécie ingenuamente crédula. Se fôssemos, a seleção natural já teria assegurado nossa extinção. Segundo o pesquisador, contamos com mecanismos sofisticados de avaliação e aceitação de crenças. Não são à prova de falhas, mas funcionam bem.
Mercier distingue o que chama de crenças reflexivas das intuitivas. As primeiras dizem respeito a coisas que não afetam diretamente nossas vidas. Crer que a Terra é plana não muda nosso dia a dia. Mas experimente acreditar que a Lei da Gravidade foi revogada e se jogue de precipícios. O custo dessa crença seria proibitivo. É por isso que não vemos muitas comunidades de antigravitacionistas.
As crenças reflexivas, porém, são baratas. Como elas não nos cobram atitudes, podemos utilizá-las para funções sociais que vão além da sobrevivência. Posso proclamar minha crença até em coisas implausíveis para mostrar lealdade a meu grupo, caso do Pizzagate.
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