"Previsão do tempo: Tempo negro. Temperatura sufocante. O ar está irrespirável. O país está sendo varrido por fortes ventos. Máx.: 38º, em Brasília. Mín.: 5º, nas Laranjeiras". Com essa previsão do tempo, publicada na primeira página do Jornal do Brasil em 14 de dezembro de 1968, o jornalista Alberto Dines (1932-2018) tentava driblar a censura para noticiar o AI-5, que deu poderes de exceção aos generais para reprimir opositores da ditadura.
Naqueles dias, atitudes como a de Dines poderiam resultar em prisão, tortura e morte. Transposta para o Brasil hoje e guardadas as diferenças históricas, a alegoria meteorológica é de assombrosa atualidade. Sob Bolsonaro, doentes morrem por falta de ar. As instituições sufocam. Ele e sua súcia de bandoleiros semeiam tormentas toda vez que ameaçam com golpe.
Escumalha da ditadura, Bolsonaro, se pudesse, mandaria todos os jornalistas para a "ponta da praia". Nesta semana, contrariado com uma publicação, o boca-suja do Planalto despejou seu vocabulário de espelunca contra a imprensa, mais uma vez. Aos gritos, o presidente-sem-decoro da República mandou o jornalismo brasileiro para a pqp e que os jornalistas enfiassem latas de leite condensado "no rabo".
A grande imprensa, em geral, aceitou os xingamentos da maior autoridade do país sem reação que não o silêncio e a cabeça baixa. Quem cala consente, rebaixa sua dignidade e deixa portas abertas para coisa pior. A perplexidade não pode ser individual nem ficar restrita às redes sociais. Os grandes veículos deveriam se juntar às entidades representativas do setor para exigir, no mínimo, uma reparação judicial.
Na campanha de 2018, a imprensa naturalizou Bolsonaro, dando-lhe o benefício de uma falsa equivalência entre dois "extremos" inexistentes. Seus ataques ao jornalismo não podem ser naturalizados. A reação a eles requer coragem e inteligência. O exemplo de Dines mostra que já fomos capazes disso. E em momentos mais difíceis.
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