terça-feira, 10 de maio de 2022

Romance 'Pagu no Metrô' traz episódios inéditos vividos por Patrícia Galvão em Paris, OESP

 Maria Fernanda Rodrigues, O Estado de S. Paulo

10 de maio de 2022 | 05h01

Se Pagu no Metrô fosse um livro de não ficção, esse texto começaria por seu final – pela descoberta que Adriana Armony fez sobre a última passagem de Patrícia Galvão (1910-1962), com câncer, pela França, nos anos 1960, enquanto pesquisava uma outra temporada dela em Paris, três décadas antes. Mas o livro é um romance, e contar isso pode estragar a experiência de leitura. 

Pagu
Adriana Armony descobriu, em envelope lacrado, foto de quando Pagu foi presa em Paris Foto: Archives Nationales de Pierrefitte-sur-Seine/Editora Nós

Uma nota: Pagu no Metrô pode ser uma obra de ficção, mas tudo ali relacionado à pesquisa é verdade. O alerta é da autora, que tirou uma licença no colégio Pedro II, no Rio, onde é professora, para fazer seu pós-doutorado que envolvia tentar refazer os passos de Pagu e descobrir o que aconteceu com a autora de Parque Industrial entre 1934 e 1935, quando ela deixa o então marido Oswald de Andrade e o filho pequeno, Rudá, para se engajar na luta contra o fascismo na Europa. Em 2019, Adriana embarcou para a França e mergulhou nesta investigação, porque uma leitura feita anos antes, que acabava antes do fim, a tinha deixado com a pulga atrás da orelha.

Essa curiosidade começou quando leu Paixão Pagu (Agir) – ou Autobiografia Precoce, na edição de 2021 da Companhia das Letras. Escrito em 1940 como uma “carta-confissão” ao seu segundo marido, Geraldo Ferraz, o texto acaba com o relato sobre sua passagem pela União Soviética. Mas depois houve Paris, e o que aconteceu lá foi muito pouco retratado em obras sobre Pagu.

“O que me fascinou nesse texto foram as várias camadas e a complexidade da Pagu. E o que me chamou a atenção é que a carta se interrompe quando ela chega a Paris. E que ela não tem um fecho. Termina ali, com ‘Stalin, o nosso guia. O nosso chefe’. Ora, como uma carta não tem uma despedida? Como ela estava escrevendo da prisão, pode ter interrompido ali. Mas esse final parece irônico porque ela já estava meio desiludida com o comunismo. Fiquei pensando: ‘O que será que aconteceu com ela em Paris que não é mencionado?, ‘que silêncio é esse?’, ‘o que esse silêncio quer dizer?’. A imaginação de romancista voa”, conta a escritora, que, em Paris, empreendeu uma grande pesquisa pelos labirínticos arquivos de polícia e de hospitais e em bibliotecas para tentar preencher algumas lacunas biográficas. E preenche.

Pagu
Pagu, em foto de 1929 Foto: Acervo Geraldo Galvão Ferraz

O livro que lemos, escrito quase em tempo real, narra a saga dessa personagem, Adriana, escritora, em sua busca por respostas, suas descobertas e suas próprias aventuras. 

Adriana, que faz, antes, uma bela apresentação de Pagu e do contexto histórico, começou a pesquisa pelos arquivos da polícia, porque sabia que ela tinha participado de manifestações, e ouviu logo que boa parte do material tinha sido queimada na Segunda Guerra Mundial. Procurou por Patrícia Galvão, Pagu, Léonie Boucher, nome que ela usou lá, em seus 20 e poucos anos.

Deu sorte na segunda vez – e depois de novo. De inédito, e que tudo bem revelar aqui, está um dossiê com detalhes de sua prisão, a ordem para que deixasse o país, os endereços em que ela viveu e a informação de seu desaparecimento da vista das autoridades. 

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A autora encontrou um dossiê sobre Pagu, que ajuda a preencher lacunas biográficas de sua passagem por Paris nos anos 1930 Foto: Archives Nationales de Pierrefitte-sur-Seine/Editora Nós

E mais. Na pasta de Pagu, Adriana encontrou um envelopinho lacrado. “Olhei de um lado, olhei do outro. Pensei: não vou perguntar se posso abrir. Se dissessem que não, eu nunca saberia o que tinha lá. Abri e encontrei uma foto da Pagu, que ninguém conhece, tirada lá quando ela foi pega.” É a foto dupla no começo deste texto, e que ilustra a edição da Nós – apesar, segundo a autora, da tentativa da família de impedir sua reprodução. Ao longo de sua vida na militância, Pagu foi presa mais de 20 vezes. 

Já se sabia que Pagu havia sido internada no final de 1934 na França, mas acreditava-se que era por causa de ferimentos sofridos em alguma manifestação. A pesquisadora não encontrou esta internação, mas descobriu outra – ou, quem sabe, seu real motivo: uma metrorragia (hemorragia no útero). “Fiquei pensando, será que foi um aborto? Será que foi uma agressão e ela teve um aborto?” 

Com essas e outras descobertas e pistas, Adriana foi visitar os lugares mencionados e, passando pelas ruas em que Pagu andava, imaginado a história vivida por ela 85 anos antes, se deixou levar pelo sonho e delírio enquanto mergulhava mais fundo nessas histórias. 

Adriana Armony
Romancista e pesquisadora, Adriana Armony viveu um ano em Paris, em busca de Pagu Foto: Acervo pessoal

Era tempo de protestos na França, e os coletes amarelos desafiavam a polícia e tomavam as ruas de Paris. Na tradicional Lavagem da Madeleine daquele ano, nasceu a ala Mulheres da Resistência – e Bolsonaro foi alvo dos protestos. “Comecei a imaginar Pagu ali. Achei que tinha muito a ver a luta contra o fascismo lá e a luta contra o fascismo da Pagu.”

E como Adriana sai desse livro? “Mais múltipla. Encontrei muitas mulheres dentro da Pagu e se desdobrando de dentro de mim. Muitas identidades em uma mulher que viveu tanto tempo atrás cujas histórias, reflexões e sentimentos continuem em mim e em tantas outras mulheres.”

Pagu no Metrô

Autora: Adriana Armony

Editora: Nós (144 págs.; R$ 62; R$ 43,40 o e-book)

Ministro França participa de evento em templo da Universal e encontra cúpula da igreja, FSP

 

O ministro das Relações Exteriores, Carlos França, participou no último sábado (7) da Cerimônia da Troca das Bandeiras no Templo de Salomão, da Igreja Universal do Reino de Deus, em São Paulo.

O ministro Carlos França (à esq.) cumprimenta o bispo Renato Cardoso, genro do fundador da Igreja Universal dos Reino de Deus, em evento no Templo de Salomão - Itamaraty

A cúpula da entidade estava presente, incluindo o deputado federal Marcos Pereira (Republicanos-SP) e o bispo Renato Cardoso, genro do fundador da igreja, Edir Macedo.

A Universal é uma das principais apoiadoras do presidente Jair Bolsonaro (PL) no meio evangélico e deve se engajar fortemente na campanha de reeleição dele. Em janeiro, a Folha Universal, jornal da igreja, escreveu em editorial que não é possível ser cristão e de esquerda, numa referência ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

No evento, houve a troca das 142 bandeiras representando os países onde a Universal atua. Participaram representantes de corpo diplomático de 33 países, além do chanceler. É a segunda vez que a Universal troca as bandeiras. Na anterior, em 2019, o então chanceler, Ernesto Araújo, não compareceu.

"O Brasil é um país de grande diversidade cultural e de convívio harmonioso entre pessoas que professam os mais diversos tipos de fé. A diplomacia brasileira tem promovido o diálogo entre religiões como instrumento essencial do combate à discriminação religiosa", disse o Itamaraty, que divulgou o evento em suas redes sociais.

Em homenagem ao Dia das Mães, as bandeiras foram içadas por mulheres. Houve também a apresentação da Orquestra Sinfônica da Polícia Militar do estado de São Paulo.

Cristina Serra Lula, Alckmin e o sopro da história, FSP

 O anúncio da chapa Lula-Alckmin eleva o nível da campanha pré-eleitoral e muda a agenda e a qualidade do debate político, contaminado até agora pelo golpismo de Bolsonaro. É claro que a sombra do golpe não desaparece, até porque golpismo não é exclusividade do presidente e de seus seguidores mais fanáticos.

Arthur Lira inventou um grupo de trabalho para discutir o semipresidencialismo, um sistema em que, basicamente, o presidente eleito ganha, mas não leva. E surgiu por aí a ideia de um segundo turno com os três candidatos mais votados no primeiro. São casuísmos risíveis e delirantes, golpismo light.

Os movimentos de Lula mostram que ele está ciente dos riscos. O petista é o primeiro candidato a apresentar um vice. O histórico de Lula e Alckmin nos cargos públicos que ocuparam não diz tudo sobre o governo que poderão conduzir se eleitos. Mas assinala respeito à democracia e à civilidade.

O gesto político de união é uma mensagem poderosa para um país empobrecido, faminto, fraturado pelas desigualdades e intoxicado de violência. A aliança comandada pelo petista junta sete partidos até o momento, quase todos velhos aliados.

Os discursos da dupla, apelando para a superação de divergências do passado, deixam a porta aberta para a ampliação da frente. Muitas outras lideranças de perfil democrático poderiam juntar-se em torno do compromisso de derrotar o bolsonarismo. Algo que emulasse o espírito das Diretas Já, nos anos 1980.
Guardadas as diferenças de momento histórico, é importante destacar que os líderes daquele tempo souberam fazer a transição da ditadura para a democracia e construir o pacto que culminou com a Constituição de 1988, a mesma que a extrema direita quer desmantelar.

O Brasil terá que ser reerguido a partir de escombros enquanto o mundo assiste a uma guerra que irá redesenhar a nova ordem mundial. Para ter alguma voz neste processo, é preciso perceber para onde está soprando o vento da história.