quarta-feira, 3 de junho de 2020

Sara Winter, alvo de operação das fake news, é expulsa do DEM após ameaçar ministro do STF, FSP

Ativista de grupo de extrema direita publicou vídeos contra Alexandre de Moraes e liderou protesto em frente ao Supremo

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SÃO PAULO

O DEM anunciou nesta terça-feira (2) a expulsão de Sara Winter do partido. A ativista é uma das investigadas no inquérito das fake news, do STF (Supremo Tribunal Federal). Winter publicou vídeos nas redes sociais ameaçando o ministro Alexandre de Moraes, relator da investigação.

Winter está entre os líderes do chamado movimento "Os 300 do Brasil", grupo armado de extrema direita formado por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, que acampam em Brasília. No domingo (31), ela liderou um protesto em frente ao STF acompanhada de manifestantes usando máscaras e carregando tochas.

O Democratas afirma que Winter foi expulsa "pelo descumprimento dos deveres éticos previstos estatutariamente". "É importante ressaltar que o Democratas repudia, de forma veemente, quaisquer atos de violência ou atentatórios ao Estado de Direito, ao Regime Democrático e às instituições brasileiras", disse, em nota, ACM Neto, presidente do partido e prefeito de Salvador.

Em vídeos divulgados em suas redes sociais, Winter fez ameaças públicas a Moraes. "Juro por Deus, essa era minha vontade. Eu queria trocar soco com esse filho da puta desse arrombado. Infelizmente, não posso”, disse Sara.

"Pena que ele [ministro] mora em São Paulo. Se ele estivesse aqui, eu estava lá na porta da casa dele, convidando ele para trocar soco comigo", afirmou.

Na postagem, a ativista fala ainda que Moraes nunca mais encontrará paz na vida, depois de ter tomado o que ela classificou como "a pior decisão da vida" do magistrado.

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"Você me aguarde, Alexandre de Moraes. O senhor nunca mais vai ter paz na vida do senhor. A gente vai infernizar a tua vida."

A bolsonarista completa: "A gente vai descobrir os lugares que o senhor frequenta. A gente vai descobrir quem são as empregadas domésticas que trabalham para o senhor. A gente vai descobrir tudo da sua vida, até o senhor pedir para sair”.

Grupo pró-Bolsonaro 300 do Brasil em manifestação contra o STF, 31/05
Grupo pró-Bolsonaro 300 do Brasil em manifestação contra o STF, 31/05 - Reprodução/Youtube

O acampamento chamado Os 300 do Brasil, do qual Sara Winter é líder, tem participantes armados, como a própria coordenadora afirmou em entrevista à Folha. Ela disse, contudo, que as armas são apenas para autodefesa. O porte de armas em manifestações é proibido pela Constituição.

Um dos objetivos do grupo é treinar militantes dispostos a defender o governo Bolsonaro. A ativista também teve breve passagem pelo Ministério dos Direitos Humanos, cuja titular é Damares Alves.

O grupo passou a ser investigado pela Procuradoria-Geral da República, no âmbito do inquérito instaurado no fim de abril para apurar as recentes manifestações antidemocráticas. A apuração foi autorizada também pelo ministro Alexandre de Moraes.

A organização liderada por Sara refuta o suposto caráter violento do movimento e rejeita o rótulo de milícia armada. Os integrantes têm feito acampamentos em Brasília. São mais de 700 membros em diversas partes do Brasil, de acordo com o comando do grupo.

A ativista, cujo verdadeiro nome é Sara Fernanda Giromini, fundou o Femen Brasil, grupo famoso por protestar de topless, e depois se converteu ao conservadorismo.

Antonio Delfim Netto O que é centrão, FSP

Nos últimos 4 anos, o centrão foi fundamental na aprovação dos projetos para corrigir os efeitos da recessão (2014-16)

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O Brasil está terrivelmente triste. A Pátria Amada corre risco de vida. Ao seu velório antecipado, compareceu todo o governo. O que deveria ser uma “reunião ministerial”, revelou-se um teatro de horror. Sua gravação demonstra uma estúpida ingenuidade política. Sua divulgação uma mancha infeliz na dignidade nacional.

Obviamente, isso não foi produzido pelo famoso “centrão”, aquele que, na simplificação acrítica do imaginário de Bolsonaro, incorporaria todos os males e impediria o exercício da política republicana. Tal afirmativa encontra resguardo no comportamento efetivo do tal “centrão” (seja lá o que ele for) nas votações dos últimos quatro anos? Não!

O presidente Jair Bolsonaro, durante entrevista ao chegar no Palácio da Alvorada
O presidente Jair Bolsonaro, durante entrevista ao chegar no Palácio da Alvorada - Pedro Ladeira - 22.mai.2020/Folhapress

Vejamos. Neles, a Câmara dos Deputados, sob a presidência de Rodrigo Maia, aprovou pelo menos cinco leis (Lei do Teto, Reforma Trabalhista, Lei das Estatais, Lei das Agências, Reforma das Aposentadorias) e mitigou os exageros propostos pela administração portadora de preconceitos identitários de inspiração evangélica. Todas com o propósito de corrigir os efeitos da recessão (2014-16). E, recentemente, tem sido expedita na aprovação das medidas contra a pandemia, contra
os votos dos que se pensam “progressistas”.

É um fato incontroverso. Em qualquer república presidencialista multipartidária, regulada por um Estado democrático de Direito, se o presidente e o seu partido não obtiverem a maioria nas urnas, devem —necessariamente— ir ao Congresso procurar o seu “centrão”: um acordo com outros partidos para construí-la e dividir com eles o poder de administrar o país. Quem não reconhece esse fato como “natural” recusa a democracia.

Foi com essa estratégia que Bolsonaro iniciou seu projeto iliberal, “tudo o que está aí é corrupto e eu vim para matá-lo”. Negou-se a dividir o poder, identificou o “centrão” (exatamente quem se opunha aos seus excessos) com a “corrupção”, o que foi fácil num país infeliz que está sempre à espera de um “mito”. Agora confrontado, socorre-se, corretamente, do “centrão” para tentar governar, sob crítica feroz dos que ainda continuam a criminalizar a atividade política, que ele estimulou.

Nossas instituições oficiais de controle das atividades administrativas (Ministério Público e Tribunal de Contas da União) são hoje cada vez mais rigorosas, aplicadas e competentes. Ajudadas por uma imprensa livre, competitiva, esperta e investigativa, constituíram-se num eficiente e rápido sistema de contenção da corrupção. Foi isso que transformou o “velho e guloso” centrão, naquele “virtuoso centrão” que dá governabilidade a todas as democracias presidencialistas multipartidárias do mundo.

Antonio Delfim Netto

Economista, ex-ministro da Fazenda (1967-1974). É autor de “O Problema do Café no Brasil”.