Militar que comanda a pasta teve atritos com filhos e guru do presidente
BRASÍLIA
O general Carlos Alberto dos Santos Cruz foi demitido nesta quinta-feira (13) da Secretaria de Governo da Presidência da República pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL).
A queda do ministro, antecipada pela Folha, é a terceira no primeiro escalão em menos de seis meses de mandato.
O porta-voz da Presidência, general Otávio Rêgo Barros, confirmou que Santos Cruz será substituído pelo general Luiz Eduardo Ramos Baptista Pereira, que é comandante militar do Sudeste.
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Desde que chegou ao Planalto, em janeiro, Santos Cruz se envolveu em seguidas crises com os filhos do presidente, além de um embate com o escritor Olavo de Carvalho, guru de Bolsonaro. A comunicação de governo era um dos principais pontos de embate.
O vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), estrategista do presidente nas redes sociais, chegou a fazer ataques públicos a Santos Cruz nos últimos meses.
Nesta quinta, o general divulgou uma carta com agradecimentos e desejou "saúde, felicidade e sucesso" a Bolsonaro "e seus familiares". O presidente, por sua vez, informou que a demissão "não afeta a amizade, a admiração e o respeito mútuo".
Santos Cruz foi avisado de sua demissão em reunião com o presidente e com o ministro Augusto Heleno, chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), que ocorreu 12h20 no Palácio do Planalto, pouco antes de Bolsonaro decolar para Belém para uma agenda de governo.
Antes de Santos Cruz, já haviam sido demitidos por Bolsonaro os ministros Gustavo Bebianno (Secretaria Geral), por causa da crise dos laranjas do PSL, e Ricardo Vélez Rodríguez (Educação), pelas falhas de gestão na pasta.
No caso de Bebianno, a queda também ocorreu em meio a embate com a ala ideológica do governo e após ataques de Carlos Bolsonaro.
Auxiliares do presidente disseram que a decisão de demitir Santos Cruz já estava tomada no início desta semana e que pesou a avaliação de que ele se opunha às decisões do núcleo duro do governo.
Pessoas próximas a Bolsonaro, principalmente as ligadas aos filhos do presidente, diziam haver um desalinhamento quanto à comunicação e uma visão diferente da dos demais governistas sobre a articulação política.
Desde que Fabio Wajngarten assumiu o comando da Secom (Secretaria de Comunicação), em abril, a avaliação no Planalto é a de que houve uma guinada no setor, aumentando a dissonância com Santos Cruz —que, por exemplo, se opunha a investir na campanha publicitária da reforma da Previdência.
Em 28 de maio, Wajngarten foi ao Senado e, sem citar Santos Cruz, disse que vinha tentando ganhar espaço no governo.
"Toda linha geral de estratégia de comunicação eu compartilho com o presidente. À medida que o tempo vai passando, vamos ganhando nosso espaço. Nem tudo são flores. A gente ainda tem muito para corrigir. Entendo que há equívocos ainda na comunicação", disse o secretário à época.
Assessores do Planalto citam também sinais de insatisfação com Santos Cruz em relação à articulação política nos últimos dias.
Deputados próximos ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disseram que ele tinha um ótimo diálogo com Santos Cruz e que avaliava que ele teria ido bem no posto se Bolsonaro tivesse entregado, de fato, a atribuição a ele.
Parlamentares do centrão, porém, disseram que ele não se encaixava na função por não ter carta branca de Bolsonaro, ficando engessado, irritando deputados e senadores.
Junto com outros militares, Santos Cruz foi um dos alvos de críticas do escritor Olavo de Carvalho nos últimos meses.
O ministro general reagiu às ofensas de Olavo aos militares que hoje trabalham no Palácio do Planalto, em especial o vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB).
“Eu nunca me interessei pelas ideias desse sr. Olavo de Carvalho”, disse Santos Cruz à Folha. Nem a forma nem o conteúdo agradam a ele", afirmou. “Por suas últimas colocações na mídia, com linguajar chulo, com palavrões, inconsequente, o desequilíbrio fica evidente”, criticou o ministro, em março.
Integram ainda a ala militar do Planalto os generais Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, o porta-voz, Otávio Rêgo Barros, o chefe da Secretaria-Geral, Floriano Peixoto, e agora o general Ramos.
Outro desgaste ocorreu em torno das disputas dentro do governo sobre regulamentação de veículos de imprensa —a Secom está subordinada à pasta de Santos Cruz.
Santos Cruz concedeu entrevista no início de abril à rádio Jovem Pan na qual comentou sobre a necessidade de evitar distorções nas redes sociais.
Ele afirmou ainda que a influência das mídias sociais é benéfica, mas também pode "tumultuar". Para ele, é necessário ter cuidado com a sua utilização, evitando ataques e o seu uso como "arma de discórdia".
Bolsonaro reagiu. Em mensagem publicada em sua conta oficial no Twitter, ele escreveu que recomenda "um estágio na Coreia do Norte ou em Cuba" para quem defender uma espécie de controle do conteúdo divulgado.
O escritor Olavo de Carvalho, um dos gurus do presidente, foi explícito ao endereçar as críticas. "Controlar a internet, Santos Cruz? Controlar a sua boca, seu merda", escreveu.
A comunicação do Palácio do Planalto tem sido palco desde o início do governo de uma disputa entre o núcleo militar e os chamados "olavistas", seguidores do escritor.
Um mês antes, Santos Cruz desautorizou pedido feita pela Secom para que as empresas estatais enviassem para avaliação prévia propagandas de perfil mercadológico.
O gesto foi interpretado por assessores palacianos como a primeira crise entre o militar e o empresário Fábio Wajngarten.
Na manhã desta quinta-feira, Santos Cruz esteve na CTFC (Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle). Foi convocado para explicar a divulgação, em 31 de março, de um vídeo que enaltecia o golpe militar.
O ministro atribuiu a divulgação ao descuido de um funcionário.
Após a comissão, sua assessoria informou aos jornalistas que ele não teria muito tempo para falar, pois havia sido chamado pelo presidente ao Palácio do Planalto.
Respondeu a apenas quatro perguntas, a maioria sobre a crise envolvendo o ministro Sergio Moro (Justiça), mas limitou-se a condenar a invasão das conversas do ex-juiz da Lava Jato.
A relação entre Santos Cruz e Wajngarten sempre foi distante. Embora a Secom esteja formalmente subordinada ao ministério, assessores palacianos disseram à Folha que o comportamento do secretário sempre foi visto como de alguém "insubordinado".
Episódio recente que gerou atrito entre eles foi a nomeação de um auxiliar do general como presidente do Conselho de Administração da EBC.
O coronel Nilson Kazumi Nodiri, que era assessor especial da Secretaria de Governo, assumiu o cargo. Tradicionalmente, o posto era ocupado pelo Secretário de Comunicação do Planalto.
QUEM É O GENERAL LUIZ EDUARDO RAMOS BATISTA PEREIRA, QUE ASSUMIRÁ A SECRETARIA DE GOVERNO
Chefe do Comando Militar do Sudeste desde maio de 2018, comandou a Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (Minustah) de 2011 a 2012. Também já foi vice-chefe de Estado-Maior do Exército e comandou a 11ª Região Militar, em Brasília, e a 1ª Divisão de Exército, no Rio de Janeiro (RJ).
Em abril, Bolsonaro participou de uma solenidade no Comando Militar do Sudeste, em São Paulo, ao lado de Ramos e falou sobre a convivência com o novo ministro em uma unidade em Campinas : "Meu amigo dos idos 1973, quando sentamos praça em março de 73, na Escola Preparatória de Cadetes do Exército."
"Pouca coisa mudou entre nós de lá para cá a não ser a nossa silhueta. A vontade, o espírito e o patriotismo continuam os mesmos."
Erramos: o texto foi alterado
Versão anterior deste texto se referiu incorretamente ao dia de 13 de junho como sexta-feira, em vez de quinta-feira.