quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

Globo compra direitos e embarga publicação de livro sobre corrupção na Fifa, FSP

Obra tem versão traduzida para o português e foi lançada em junho nos EUA

Danielle BrantPaulo Passos
NOVA YORK e SÃO PAULO
Lançado nos EUA em junho de 2018, o livro “Red Card: How the U.S. Blew the Whistle on the World’s Biggest Sports Scandal” (“Cartão Vermelho: Como os EUA Revelaram o maior Escândalo Esportivo Mundial”), do jornalista Ken Bensinger, relata com detalhes o escândalo de corrupção da Fifa, revelado em 2015.
A exclusividade para a publicação no Brasil foi comprada pela Globo Livros, editora do Grupo Globo, em 2015, quando a obra ainda estava em produção. O lançamento no país era previsto para maio, antes da Copa do Mundo, mas foi adiado. Há uma versão em português da obra, que é vendida em Portugal desde junho.
“É muito estranho, porque eles compraram, me pagaram, uma pessoa da Globo mostrou a meu agente o manuscrito em português, e era para ser publicado em maio, em junho, em julho, e nunca foi publicado”, afirma Ken Bensinger à Folha.
Capa da versão portuguesa do livro de Ken Bensinger
Capa da versão portuguesa do livro de Ken Bensinger - Reprodução
Dona de direitos de TV de torneios da Fifa, a Globo é citada quatro vezes no livro. Em duas, o grupo aparece quando J.Hawilla é perfilado. 
O empresário —morto em 2018— foi delator na investigação das autoridades americanas. Ele admitiu ter pago propina para dirigentes na compra de direitos de transmissão de torneios da Fifa e da CBF. 
Ao contar a história de Hawilla, o livro cita que ele trabalhou na Globo, primeiro como repórter e depois como chefe do departamento de Esporte da emissora, nas décadas de 1970 e 1980.
Em outro trecho, Bensinger informa o quanto a Globo pagou à Fifa pelos direitos de TV das Copas do Mundo de 2010 e 2014. Segundo o autor, a emissora desembolsou 340 milhões de euros (aproximadamente R$ 1,4 bilhão). 
Na quarta referência à emissora, a obra reproduz o depoimento de Alejandro Buzarco, ex-homem forte da companhia de marketing argentina Torneos y Competencias, na Justiça dos Estados Unidos.
Em novembro de 2017, ele afirmou que a Globo e o grupo mexicano Televisa pagaram propina a um dirigente da Fifa durante negociação para compra de direitos de transmissão da Copa do Mundo.
“Recentemente meu agente ligou para um responsável da Globo Livros, e eles disseram que meu livro menciona a Globo, mas não muito, só um pouco no final. Mas eles disseram que não querem publicar até o caso criminal ser encerrado”, diz Bensinger.
As declarações sobre as supostas propinas pagas pela Globo foram amplamente noticiadas na época. A emissora divulgou uma nota à imprensa em que afirmou “veementemente” que “não pratica nem tolera qualquer pagamento de propina”.
“Após mais de dois anos de investigação [o Grupo Globo] não é parte nos processos que correm na Justiça americana”, disse a empresa em comunicado em novembro de 2017. 
Folha procurou a Globo Livros em 20 de dezembro de 2018 e questionou a editora sobre as declarações de Bensinger e se havia uma previsão de publicação do livro no Brasil. A assessoria de imprensa informou que divulgaria uma nota sobre o caso —o que não ocorreu até a publicação desta reportagem.
Colaborou Maurício Meireles

Apetite da China por agro brasileiro vai além da soja e se diversifica em 10 anos, Mauro Zafalon ,FSP

Importações dos asiáticos ficam relevantes também nas carnes, no algodão e na celulose

Cresce rapidamente a diversificação das importações chinesas de produtos agropecuários brasileiros.
As compras do país asiático, quase sempre concentradas em soja, hoje já têm boa participação também em outros itens da agropecuária.
Há uma década, as carnes brasileiras estavam fora do radar dos chineses. Em 2018, eles ficaram com quase um quinto dessas proteínas exportadas pelo Brasil.
O apetite da China é tão grande que o país já é líder na compra de carnes bovina e suína. No caso da carne de frango, eles se aproximam da líder Arábia Saudita.
Embora o presidente Jair Bolsonaro não veja com bons olhos o potencial de investimento da China nas empresas brasileiras, essa voracidade dos chineses é positiva para o agronegócio brasileiro.
O algodão também passou a ser objeto de desejo deles. Em 2008, eles compravam 3% da fibra exportada pelo Brasil. No ano passado, o volume chegou a 28%.
A cotonicultura cresce muito no Brasil. O país eleva a produtividade e aumenta o volume produzido. Os chineses, que já vêm intensificando as compras do produto brasileiro, avisaram que também estão interessados na produção futura de algodão.
A China aumenta, ainda, a participação na celulose brasileira. A produção interna cresce, e o volume fornecido pelo país sobe ano a ano. Em 2018, os chineses ficaram com 42% da vendas feitas pelo Brasil desse produto.
A soja está na liderança das exportações brasileiras, e 82% do produto comercializado externamente foi para a China no ano passado.
A compra de óleo de soja pelos chineses, porém, é bem menor hoje do que há uma década.
Em 2008, os chineses importaram o correspondente a US$ 830 milhões em óleo de soja do Brasil. No ano passado, foram apenas US$ 163 milhões (R$ 602 milhões). Com isso, o Brasil diminui o potencial de industrialização de soja.
O Brasil ganha espaço, embora timidamente, no açúcar e no café. A China vem impondo uma taxa elevada para as importações de açúcar.
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Caminhões são abastecidos com soja em porto de Nantong, na China - Reuters
O resultado foi um recuo nas vendas do produto para apenas US$ 218 milhões no ano passado. Em 2016, chegaram a gastar US$ 824 milhões.
As exportações brasileiras de café, produto que começa a ser apreciado pelos chineses, ficaram em apenas US$ 44 milhões no ano passado.
A menos que os chineses façam com o café o que fazem com a soja —importam o grão para processamento interno—, as exportações brasileiras dessa bebida vão sempre ser restritas.
Isso porque o Brasil não desenvolveu, até agora, indústrias de café com fôlego para exportar o produto torrado e moído. A presença das tradicionais cafeterias internacionais será cada vez maior no gigante asiático.
Vaivém das Commodities
A coluna é assinada pelo jornalista Mauro Zafalon, formado em jornalismo e ciências sociais, com MBA em derivativos na USP.