Parece ser difícil errar o alvo, mas cerimônia de posse de Bolsonaro motivou ataques questionáveis
Jair Bolsonaro há muito representa uma vidraça enorme, fácil de acertar com críticas de todo lado, tantos os motivos que ele deu.
Agora que essa vidraça se tornou importante, parece difícil errar um alvo desse tamanho. Mas não é missão impossível, como se tem visto. A cerimônia de posse motivou ataques bastante questionáveis, quando não factualmente errados.
Exemplo desse último tipo é a comparação de imagens das posses de Lula, Dilma e Bolsonaro que circulou por redes sociais. Mostra rampas diferentes —Lula e Dilma no Planalto, com gente ao fundo, e Bolsonaro na do Congresso, com o gramado fechado. Na verdade, fotos feitas no momento dos discursos registram uma Praça dos Três Poderes mais cheia no evento desta semana.
Outras são de miopia gritante. É o caso da crítica que aponta a ausência do termo mulher no discurso de Michelle Bolsonaro no parlatório. Esse conceito de feminismo deve guardar parentesco com o do socialismo de Bolsonaro, tamanha a falta de sentido dos dois. Michelle, com seu surpreendente ato na posse, coloca-se vários quilômetros à frente de quem a ataca.
É fato que Bolsonaro fez discurso de campanha, e o tom adotado na frente do Planalto não parece mesmo o mais inteligente para governar. Mas cobrar um presidente por falar o que pensa que é bom e o que pensa que é ruim após o estelionato eleitoral desta década soa contraditório.
Também no front político, a ausência do PT e do PSOL e dos governadores do Nordeste na cerimônia nada ajuda na maturidade política do país. Evo Morales mostrou-se bem mais safo em Brasília.
A oposição faria melhor seu papel se canalizasse a energia de críticas frágeis para bater firme no que importa. Como a ausência de menção, nos dois discursos de Bolsonaro, à desigualdade social. O governo diz que foi um lapso. Pode ter sido ato falho, pode sido proposital, não faz diferença —num país como este, não se trata de um silêncio aceitável.