sábado, 1 de dezembro de 2018

O imperador e o presidente, Luís Francisco Carvalho Filho, FSP

Falta a Bolsonaro o tempero da cultura democrática

Não considero as fake news o problema atual da humanidade e não acredito que Hillary Clin- ton e Fernando Haddad perderam eleições para o populismo de direita por causa de informações falsas em redes sociais.
Disputas eleitorais são forjadas pela mentira. Candidatos conservadores e progressistas prometem o que não cumprem. Mentir mais não é necessariamente pior do que mentir menos. É cínico, mas ainda não se inventou nada melhor do que a rotatividade de poder que o regime democrático, sempre imperfeito, proporciona.
Historicamente, a disseminação de falsidades se intensifica com a aceleração tecnológica.
No império, o padrão de gravidade era a distribuição de impressos ou manuscritos por mais de 15 pessoas e o discurso em reuniões públicas. Além do sistema monárquico e da figura celestial do imperador, era preciso proteger "as verdades fundamentais da existência de Deus e da imortalidade da alma".
Com a república, a afixação de papéis ofensivos em "lugar frequentado" e, depois, o rádio e a TV multiplicaram os efeitos das inverdades. A Lei de Segurança Nacional de 1969 não tolerava nem guerra psicológica adversa nem divulgação de notícia falsa ou tendenciosa ou de fato verdadeiro truncado ou deturpado.
Com a internet, a boataria é instantânea. Que ninguém se iluda: não há como preservar o país da circulação de fatos sabidamente inverídicos e do impulsionamento de conteúdos nocivos.
As fake news prosperam porque seus destinatários anseiam por elas. Tem gente que acredita em Lula ou em Bolsonaro, em bispo católico ou protestante, em Sri Prem Baba, em Black Friday, em escola sem partido, em horóscopo. Acredita quem quer. Não há como impedir, previamente, "abusos" da liberdade de expressão. Nem a censura ferrenha nos salvaria de crenças esquisitas e estúpidas.
A reportagem da Folha sobre comercialização de disparos ofensivos pelo WhatsApp, que tanto aborreceu o círculo íntimo do capitão, é importante porque revela nova modalidade de abuso do poder econômico e não pelo conteúdo tosco que seus seguidores compartilhavam.
Ainda falta ao bolsonarismo o tempero da cultura democrática (se a escolha do ministro da Educação mostra a persistência de aspirações sombrias do candidato, o consumo de "pão com leite condensado" causaria náuseas em Rê Bordosa, inesquecível personagem de Angeli), mas é interessante observar a submissão paulatina do presidente eleito ao decoro do cargo e aos ritos republicanos.
Aparentemente, Bolsonaro vai aprendendo que ser presidente não é ser imperador. Sabe que a respeitabilidade da "augusta figura" dependerá do comportamento político. Já emite sinais de fisiologia, compensa o passado de proscrito no Exército com generosa distribuição de cargos para generais, e ainda implica com o jornalismo adverso.
Bolsonaro (mencionado por Steve Bannon, estrategista de Trump, como "Botolini") tem filhos demais. Sabe que amigos e familiares costumam atrapalhar a vida de governantes quando se embriagam pelo poder, pela bajulação ou pela picaretagem.
A perspectiva do impeachment é o contrapeso constitucional eficiente.
Não é à toa que o general Mourão, cercado de desconfiança durante a campanha, pelas sucessivas bobagens que pronunciou, reapareça, depois de eleito, como titular do discurso do equilíbrio e do bom senso. É o vice, que não é bobo, tentando pavimentar a estrada para o hipotético afastamento de Jair Bolsonaro.
lfcarvalhofilho@uol.com.br
Luís Francisco Carvalho Filho
Advogado criminal, presidiu a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (2001-2004).

sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Fim de feira vai para novo pátio de compostagem da Mooca, em SP, FSP

São Paulo ganhou a sua terceira área de compostagem de restos de feira e poda de árvores no último dia 23. A cada semana, o pátio vai receber cerca de 60 toneladas de frutas, legumes e verduras vindos de 44 feiras livres dos bairros Água Rasa, Belém, Brás, Mooca, Pari e Tatuapé.
São 2,8 mil toneladas de resíduos orgânicos por ano que deixam de ir para os aterros sanitários. O terreno de 4,5 mil m² na Mooca (rua Cirino de Abreu) foi dividido em nove leiras de compostagem —os canteiros onde se misturam os orgânicos frescos com as podas de árvore, palhas e folhagens secas— que devem produzir 420 toneladas de composto a ser usado como fertilizante em parques e praças da cidade.
Novo pátio de compostagem de restos de feira e podas de árvores aberto no último dia 23 de novembro na Mooca
Novo pátio de compostagem de restos de feira e podas de árvores aberto no último dia 23 de novembro na Mooca - Divulgação/Amlurb
Assim como o pátio da Lapa, inaugurado em 2015 e que recebe restos de 52 feiras, e o da Sé, aberto em setembro de 2018, recebendo restos de 32 feiras e do mercado Kinjo Yamato, o da Mooca tem capacidade para receber 20 toneladas por dia, mas a legislação atual só permite o recebimento de 10 toneladas diárias.
“Estamos trabalhando com a Cetesb para que seja ampliado o máximo permitido. A legislação é de uma época em que não havia essa experiência de compostagem urbana com o resíduo orgânico segregado na fonte. Neste modelo, vão restos sem contaminação e, portanto, não há geração de odor e nem vetor de doença”, afirma diz Edson Tomaz de Lima Filho, presidente da Autoridade Municipal de Limpeza Urbana (Amlurb). “Vão apenas os resíduos de feira e das podas de árvores, sem os contaminantes do lixo orgânico doméstico.”
A cidade gera uma quantidade enorme desses resíduos de ótima qualidade, que podem ser separados na geração e compostados da mesma maneira, em unidades espalhadas pelos bairros, de forma segura: são 883 feiras e mais 38 sacolões e mercados. A compostagem regionalizada tem a vantagem de diminuir também as emissões de dióxido de carbono, ao evitar o deslocamento de caminhões.
Somando os três pátios em operação, são mais de 100 feiras e um grande mercado usando os resíduos de forma produtiva e desviando-os da rota dos aterros. Diariamente, São Paulo envia a esses locais 12 mil toneladas de resíduos, sendo de 51% de material orgânico, 35 % de material passível de reciclagem e 14% de rejeitos, o lixo do lixo.
Novo pátio de compostagem de restos de feira e podas de árvores aberto no último dia 23 de novembro na Mooca, em SP
Novo pátio de compostagem de restos de feira e podas de árvores na Mooca, em SP - Divulgação/Amlurb
O presidente da Amlurb diz que até o fim de 2018 devem ser abertos ainda pátios em Hermelino Matarazzo e São Mateus. O plano é ter 17 pátios de compostagem até o fim do mandato, em 2020. Para a compostagem do lixo doméstico, a prefeitura tem duas iniciativas em estudo. Uma delas é selecionar um bairro da cidade para implantar segregação mais refinada de orgânico para compostagem.
A outra é a construção de um ecoparque, que teria capacidade de receber 1.200 toneladas por dia de resíduo residencial. O parque teria unidade de compostagem, reciclagem e uso de rejeitos para geração de energia. Também não está descartado o incentivo à compostagem doméstica, que foi experimentada e aprovada na experiência Composta São Paulo, que distribuiu cerca de 2.000 minhocários para famílias que se cadastraram, forneceu treinamento e acompanhou o aprendizado dos voluntários através de um site, em 2014. 

Mas, segundo Rafael Golin, coordenador do núcleo de orgânicos da Amlurb, a ideia é impulsionar a compostagem em grandes condomínios, para atingir mais moradores.

PEV PARA AUMENTAR RECICLAGEM

A implantação de Postos de Entrega Voluntária (PEV) combinada com uma iniciativa de educação ambiental por bairro é a estratégia da Amlurb para aumentar a reciclagem na cidade, em locais onde não há coleta seletiva.
Há duas semanas, foi aberto em Parelheiros um PEV modelo e, na próxima segunda, dia 3, uma outra unidade deve começar a funcionar em São Miguel Paulista. A coleta seletiva de São Paulo atinge apenas 70% das ruas da cidade com serviço porta a porta. “A seletiva em São Paulo é cara. Para ampliar para 100% da cidade, a prefeitura gastaria mais R$ 3 milhões por mês. Com a metade dessa verba, dá para fazer o projeto de implantação dos PEVs. As concessionárias fariam o transporte entre os PEVs e as cooperativas ou recicladoras”, diz o presidente da Amlurb. “A meta é que cada cidadão tenha um local para destinar os recicláveis a cerca de 200 metros da sua casa”, afirma.
O projeto dos PEVs prevê a instalação de 50 unidades, com capacidade para mil litros de carga. O tempo de instalação é de duas semanas e os materiais são destinados à cooperativa Cooperpac. Em duas semanas de uso, o PEV de Parelheiros coletou 300 quilos por dia de recicláveis, o que projeta 6,3 toneladas por mês. Segundo a Amlurb, está sendo estudada a instalação de PEVs em Unidades Básicas de Saúde (UBSs) e pontos comerciais, como lojas e postos de combustíveis.
Mara Gama
Jornalista e consultora de qualidade de texto.

Máquina tira emprego, mas gera trabalho mais humano, dizem especialistas, FSP

Fabro Steibel, diretor-executivo do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro, Guilherme Thiago de Souza, gerente de engenharia e desenvolvimento da Roboris do Brasil, Luiz Arruda, diretor da consultoria WGSN Mindset, e o mediador Fernando Canzian, repórter especial da Folha, em São Paulo - Reinaldo Canato/Folhapress
Leonardo Neiva
SÃO PAULO
Enquanto revoluções tecnológicas do passado usavam a tecnologia como complemento ao trabalho humano, a que acontece atualmente trata da completa substituição do homem pelas máquinas em grande parte dos cargos existentes. A mudança, no entanto, abre caminho para que a sociedade trabalhe com competências mais humanas.
“Se um robô pode fazer uma tarefa, ele vai fazer. E fará melhor, mais rápido e com maior desempenho do que o homem”, afirmou Guilherme Thiago de Souza, gerente de engenharia e desenvolvimento da empresa Roboris do Brasil.
Essa mudança, segundo o engenheiro, acaba com uma série de empregos, mas faz com que as empresas comecem a procurar profissionais que tenham bem desenvolvidas áreas de raciocínio, faculdades cognitivas e colaboração.
Souza falou em debate durante o seminário O Futuro do Emprego e o Emprego do Futuro, realizado pela Folha, com patrocínio do Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) e apoio do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), em São Paulo. O repórter especial da Folha Fernando Canzian mediou a discussão.
De acordo com Luiz Arruda, diretor da consultoria WGSN Mindset, que pesquisa tendências de comportamento, o problema é que essas novas demandas do mercado não são atendidas pelos modelos tradicionais de educação.
A situação, porém, estaria se modificando de forma lenta e espaçada no país. Arruda afirmou ter mapeado iniciativas interessantes por todo Brasil que aplicam conceitos como startups, “design thinking” e gamificação com o objetivo de desenvolver competências como criatividade, inteligência emocional e comunicação nos jovens.
“Mas, se ninguém oferece a solução, as novas gerações têm um ferramental extenso para descobrir por elas mesmas. Assim, hoje, muitos jovens se organizam para empreender e conseguir o que podem não ter alcançado na escola”, disse.
Para Fabro Steibel, diretor-executivo do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro, no caso do Brasil, uma iniciativa essencial para o desenvolvimento da educação ainda é investir em infraestrutura tecnológica nas escolas públicas.
“Esquecemos que metade dos colégios públicos brasileiros não tem internet e a outra metade só tem o suficiente para o diretor conseguir mandar e-mail. Precisamos nos mirar no exemplo da Estônia, que unificou digitalmente suas escolas em 1998 e hoje alcança resultados expressivos em educação”, declarou Steibel.
Para ele, não é difícil oferecer melhores condições de desenvolvimento e aprendizado para a população mais pobre do país. Bastaria o poder público oferecer infraestrutura e tecnologia para lugares onde já há uma mobilização popular forte e colaborativa e alta capacidade de utilização de recursos, como na favela da Rocinha, segundo o executivo. “O problema é que o Estado chega a esses lugares muito mais tarde do que aos outros”, afirmou.