SÃO PAULO — Um projeto de lei aprovado pela Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) irá facilitar a diminuição das penas de presidiários que leem a Bíblia. Inicialmente barrado pelo então governador Geraldo Alckmin (PSDB), o projeto voltou ao Legislativo paulista, que derrubou o veto do tucano.
A nova lei, aprovada no último dia 29, faz parte da política de remição de penas recomendada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Todos os condenados têm direito a abreviar seu tempo na prisão por meio do trabalho, do estudo ou da leitura. Neste último caso, cada obra lida possibilita a remição de quatro dias de pena, com o limite de doze obras por ano. O projeto foi apresentado por quatro deputados estaduais do PRB, partido ligado à Igreja Universal.
Para a advogada Maíra Zapater, professora de Direito Penal da FGV-SP, o projeto não deve mudar muito na prática dos estabelecimentos prisionais. A criminalista destacou que, em um ambiente de superlotação dos presídios brasileiros, medidas de redução da pena são bem-vindas.
— Não sei se precisaria estar previsto ali (a Bíblia). Não há uma vedação, o preso pode ler Harry Potter se quiser. Na prática, o que a gente vê são os estabelecimentos penitenciários arranjarem mais formas de conseguirem a remição de pena. A diminuição por trabalho, por exemplo, nunca foi suficiente: os presos querem trabalhar, mas não tem trabalho o suficiente — disse.
De acordo com o projeto, a Bíblia, que antes contaria como apenas um livro e, portanto, daria direito a quatro dias de diminuição da pena como um todo, será considerada uma coletânea de livros e, portanto, cada um de suas divisões, como Gênesis, Salmos, Provérbios e os evangelhos do Novo Testamento, contarão como uma obra literária separada. Ao todo, o texto sagrado cristão tem 66 livros.
"Sendo a Bíblia a obra literária escolhida, esta será dividida em 39 livros segundo o Velho Testamento e 27 livros integrantes do Novo Testamento, considerando-se assim a leitura de cada um destes livros como uma obra literária concluída", explica o projeto.
Assim como em relação a outros livros, o condenado apresentará uma resenha a respeito do assunto, que deverá ser avaliada por uma comissão.
De acordo com a criminalista Maíra Fernandes, ex-presidente do Conselho Penitenciário do Rio de Janeiro, o projeto de remição de pena foi pensado com o objetivo de incentivar a leitura de obras literárias, não de livros religiosos.
— Sou totalmente a favor porque a remição por leitura enriquece. É uma forma de liberdade, desenvolve a criatividade, o indivíduo pode ir para outros mundos que o livro leva. Mas não foi criada para ser o estímulo a leitura de determinada religião. Senão vamos entrar na discussão sobre qual religião deve ser estimulada.
Em seu veto, apesar de reconehcer os "nobres propósitos do legislador, expostos na justificativa que acompanha a medida", o então governador Geraldo Alckmin vetou boa parte do projeto porque o considerou inconstitucional a obrigação sobre a regulamentação da remição da pena por leitura caberia à esfera federal e não à estadual.
Para Adriana Martorelli, presidente da comissão de política criminal e penitenciária da OAB-SP, a aprovação do projeto surpreendeu.
— Sorte dessa pessoa que gosta de ler a Bíbla. É muito boa (a remição), mas acho estranho porque vai ter que colocar também o livro dos espíritas, o Corão — afirmou.
Adriana afirmou que, no estado de São Paulo, há 10 livros considerados aptos para a remição de pena. Caso o condenado leia outro, deve pedir a homologação da Vara de Execução Penal para sua diminuição de pena.
Segundo o ex-governador, 165 das 168 unidades prisionais já contam com salas de leitura para que os presos tenham acesso à remição da pena.
"Em razão do trabalho desenvolvido pela Secretaria da Administração Penitenciária, 1.035 (um mil e trinta e cinco) presos foram beneficiados com a remição de pena em razão da leitura no ano de 2016, conforme dados revelados pelos Grupos Regionais de Ações de Trabalho e Educação - GRATEs vinculados à Pasta", afirmou Alckmin.
Em nota, a Secretaria da Administração Penitenciária informou que "já cumpre a remição de pena por leitura nos presídios paulistas desde 2013 e que cumprirá qualquer determinação judicial"
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