quinta-feira, 3 de maio de 2018

Escombros de edifício em SP anunciam falência do setor público, FSP

Os escombros do edifício da União que desabou no centro de São Paulo são um monumento à falência do setor público brasileiro.
Decrépito e sem investimentos, o prédio estava cedido a outra esfera de governo, a Prefeitura de São Paulo, que também não cuidou de seu uso e conservação por falta de recursos.
O próximo presidente da República terá, em 2019, a menor margem para investimentos e gastos com custeio da máquina desde 1997 --o equivalente a 3,09% do PIB.
No ano passado, o investimento de União, estados e municípios combinado já foi o menor em quase 50 anos. 
O baixo valor (aquém do custo de depreciação) para a conservação de hospitais, escolas, estradas e de outros equipamentos está, na prática, “comendo" nossa já precária infraestrutura.
Por mais distante que pareça, na base dessa penúria estão os gastos com nossa Previdência. Em ritmo crescente, ela consome hoje 57% do Orçamento da União, sete vezes mais que o gasto com saúde (excluindo funcionários).
Só a Previdência do setor privado teve R$ 50 bilhões em gastos a mais em 2017, o equivalente ao dobro do que o governo federal investiu em obras e na conservação de bens públicos. Com o envelhecimento da população e aposentadorias precoces, essa conta só aumenta.
O Datafolha já aferiu que 71% dos brasileiros são contra reformar a Previdência. Mas um percentual igual a esse procura atendimento pelo SUS, segundo o Ministério da Saúde.
Essas expectativas conflitantes levam o Brasil no caminho de um país de aposentados, com cada vez menos serviços públicos. Mais à frente, possivelmente de aposentados sem receber, como o Rio mostrou ser possível.
Nas últimas décadas, aumentar impostos foi sempre a opção para manter a Previdência e os serviços. Isso foi possível porque o ritmo de concessões de aposentadorias, e de uso dos serviços públicos, era menor.
Hoje, seria necessária uma dose tão cavalar quanto inviável de tributos para driblar o problema.
Os otimistas apostam que, passada a eleição, presidente e Congresso novos atacarão o problema da Previdência, descomprimindo o Orçamento e aliviando a situação dos investimentos em infraestrutura e custeio da máquina.
Como o prédio no largo do Paissandu demonstrou, não fazê-lo terá consequências trágicas para quem vive aqui dentro.
Fernando Canzian
É vencedor de quatro prêmios Esso e autor de 'Desastre Global-Um ano na pior crise desde 1929'.

    STF decide por unanimidade restringir foro especial de parlamentares, FSP


    Dos 11 magistrados, 7 votaram para que o Supremo julgue apenas crimes relacionados à função parlamentar e durante o mandato



    Os ministros Edson Fachin, Dias Toffoli e Gilmar Mendes em sessão do STF que discute o foro especial a parlamentares
    Os ministros Edson Fachin, Dias Toffoli e Gilmar Mendes em sessão do STF que discute o foro especial a parlamentares - Pedro Ladeira/Folhapress
    Letícia Casado
    BRASÍLIA
    Por unanimidade, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta quinta-feira (3) restringir o foro especial para deputados federais e senadores. Agora, a corte vai processar e julgar apenas casos em que os crimes tenham sido cometidos em razão do cargo e durante o mandato.
    Entre os casos que estão no Supremo, cada ministro vai decidir se envia o inquérito para outra instância. 
    Os magistrados também definiram que os casos que estiverem na fase de intimação para as alegações finais –depois da colheita de provas – o processo não vai mais mudar de instância, mesmo que o político renuncie ao cargo. 

    Dos 11 magistrados, 7 votaram para que o Supremo julgue apenas crimes relacionados à função parlamentar e durante o mandato. Esta foi a posição de Luís Roberto Barroso, relator da ação, Marco Aurélio, Rosa Weber, Edson Fachin, Luiz Fux, Celso de Mello e a presidente do tribunal, Cármen Lúcia.

    Os outros quatro votaram para que a corte julgue crimes cometidos durante o mandato – independentemente se o delito tem relação com a função parlamentar. A divergência foi aberta por Alexandre de Moraes e seguida por Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.
    Além disso, Toffoli propôs estender a restrição de foro especial a todas as autoridades do país. Segundo ele, a medida atingiria 16 mil casos, incluindo “um número expressivo” de casos relativos a crimes cometidos por prefeitos antes da diplomação. Gilmar Mendes se manifestou a favor.

    Hoje o processo tramita de um tribunal a outro, de acordo com o cargo que o investigado ocupa: se ele comete um crime sem ter mandato e depois é eleito deputado federal ou senador, por exemplo, o processo vai da primeira instância para o STF, mas quando deixa o cargo, o caso volta ao outro tribunal.
    Essas idas e vindas entre diferentes instâncias da Justiça, apelidadas de "elevador processual", sobrecarregam os tribunais superiores e atrasam o desfecho dos processos, aumentando a chance de os crimes prescreverem (ficarem sem punição), segundo Barroso.
    Esta foi a quinta sessão em que os ministros discutiram o alcance do foro especial em um período de um ano.

    JULGAMENTO

    Gilmar foi o único a votar nesta tarde. Durante duas horas ele fez diversas críticas ao sistema Judiciário e alertou que a restrição do foro não a única medida que pode ser tomada para reduzir a impunidade no país. Ele criticou o tempo de férias dos magistrados e benefícios de procuradores.
    “Não temos nem sequer estatísticas confiáveis da atuação da justiça criminal no Brasil. Os poucos dados existentes não são reconfortantes. A primeira instância do Poder Judiciário é notória por sua disfuncionalidade”, disse Gilmar.
    Gilmar já havia criticado o fim do foro especial nos moldes propostos por Barroso. Em seu voto, disse que “a limitação proposta é incompatível com a Constituição e não traz a almejada perspectiva de uma melhora na persecução penal”.
    “Tenho que, neste caso, o STF não está verdadeiramente interpretando a Constituição Federal, mas a reescrevendo. Para disfarçar o exercício do poder constituinte, tenta dar-lhe o verniz da interpretação jurídica das normas constitucionais”, afirmou.
    “Medidas investigatórias e cautelares, como ficam? Poderia um juiz de primeira instância quebrar sigilo de qualquer um?”, questionou.
    Gilmar disse ainda que, a partir de 2001, quando deixou de ser necessária a autorização do Legislativo para o STF processar congressistas, a corte ficou sobrecarregada.
    “O julgamento do mensalão [do PT] paralisou o STF por meses. Somente o julgamento da ação penal tomou 53 sessões, ao longo de quatro meses e meio. No total, foram 69 sessões. O tribunal fez o que pôde para adaptar-se à nova realidade, movendo julgamentos para as turmas e convocando magistrados instrutores”, afirmou.
    Ele comparou o mensalão petista, que tramitou no STF, com os do PSDB e do DEM, que foram para instâncias inferiores.
    “Notório é o caso do mensalão tucano, originalmente denunciado perante esta corte. A denúncia, oferecida em 2007, foi recebida, tendo sido instaurada a ação penal 536. Houve declinação da competência para a primeira instância, com o processo instruído, em 2014. Apenas na semana passada, a causa teve embargos infringentes julgados no Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Ainda cabem embargos de declaração e recursos extraordinário e especial”, afirmou.
    “O mensalão do DEM, investigado em 2009, até o momento, não gerou notícia de solução de ações penais”, acrescentou Gilmar.
    “Ainda assim, está claro que a prerrogativa de foro, com a amplitude dada pela Constituição Federal, tornou-se insustentável”, disse o ministro.

    AJUSTES

    Quando o julgamento acabou, Barroso disse a jornalistas que os ajustes vão ser feitos à medida que os casos surgirem.
    “Há muitas situações em aberto. Acho que há um princípio geral que estabelecemos, mas é preciso que venham outros casos com próprias peculiaridades para definir cada situação”, acrescentou.
    A decisão vai passar a valer depois que for publicada, “mas agora todo mundo já sabe”, disse Barroso.
    “Eu mesmo estava esperando essa decisão para baixar casos no meu gabinete. Nos novos, eu já estava começando a baixar”, acrescentou.
    “É preciso repensar sistema de justiça criminal, mas foro trazia problemas de politização [dos processos]. Nenhum país do mundo funciona como tribunal penal de primeiro grau como aqui”, disse Barroso.
    Em seu voto, Gilmar foi muito crítico com as possíveis consequências que a restrição ao foro pode ter.
    “Além do verniz de técnica jurídica, a nova interpretação vem embalada em argumentos consequencialistas. É apresentada como a solução para desafogar os tribunais, acelerar a punição de poderosos, afastar influências políticas dos processos penais”, disse.
    “A preocupação com o andamento dos trabalhos do STF, supostamente assoberbado pelo número de investigações e processos contra parlamentares federais, é válida. Mas o diagnóstico de que o Supremo Tribunal falha no exercício da competência penal originária é construído sem a correta avaliação das bases empíricas”, afirmou.