domingo, 14 de maio de 2017

200 mil caminhões estão parados nas garagens, OESP


Número de veículos que estão ociosos nas transportadoras de carga equivale a dois anos e meio de produção
Cleide Silva, O Estado de S.Paulo
14 Maio 2017 | 05h00
Cerca de 200 mil caminhões estão parados nas empresas de transporte de cargas do País. O número equivale a dois anos e meio de produção, levando-se em conta o que foi fabricado de 2014 a 2016.
A crise econômica que resultou na queda generalizada do consumo e a paralisação de obras por parte de construtoras envolvidas na Lava Jato, assim como da Petrobrás, levou a uma ociosidade recorde de veículos que transportam alimentos, eletroeletrônicos, materiais de construção e veículos, entre outros itens.
Pesquisa realizada em janeiro pela Associação Nacional de Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística) constatou que mais da metade das transportadoras brasileiras tinham, em média, 10% de suas frotas paradas. Pelos cálculos do presidente da entidade, José Hélio Fernandes, havia no início do ano pelo menos 200 mil veículos encostados.
O número pode ter caído nesses últimos meses, em razão da demanda por transporte de grãos, mas, ainda assim, a ociosidade é elevada, avalia Fernandes.
A TSA Cargo, com sede em Guarulhos e filiais em Santos e Campinas, no Estado de São Paulo, mantém quase 20% de sua frota de 180 veículos encostada em quatro pátios. A empresa atua principalmente no transporte de mercadorias importadas ou destinada à exportação. De 2013 para cá, o faturamento caiu à metade, para cerca de R$ 3,5 milhões.
“O setor está em colapso, na UTI, respirando com aparelhos”, define Paulo Scremim, presidente do grupo criado há 25 anos. Dos 420 funcionários que tinha em 2013, quando a crise se aprofundou, a TSA mantém atualmente 270. “Tive de demitir pessoal qualificado, alguns deles estavam na empresa havia 20 anos”, informa o empresário. “Assim que ocorrer uma recuperação do mercado, vou recontratar o que for possível.”
De acordo com o presidente do Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas de São Paulo (Setcesp), Tayguara Helou, além dos caminhões parados, aqueles que continuam operando circulam com pouca carga, impedindo assim que a operação seja superavitária. “O desdobramento disso será a falta de capacidade do setor em investir em renovação de frota, infraestrutura, treinamento de pessoal e melhoria da qualidade.”
Helou ressalta ainda que, para não retornar de uma entrega com o caminhão vazio, empresas com frota própria (que não utilizam transportadoras) aceitam “qualquer preço” para transportar mercadorias e, com isso, puxam para baixo o preço do frete. “Transportar carga mal remunerada é um perigo constante, pois a empresa perde a capacidade de fazer a manutenção nos veículos e de operar com pessoal mais qualificado”, afirma.
Sócio da Braspress –, empresa de transporte de cargas fundada há 40 anos por seu pai e hoje com 93 filiais por todo o Brasil e frota de 2.350 veículos próprios e 1,6 mil terceirizados –, Helou afirma “nunca ter visto crise tão forte no setor”. Para Fernandes, da NTC&Logística, somente quando a indústria aumentar a produção e o comércio reagir, “a roda voltará a rodar”.
Para o sócio da consultoria PricewaterhouseCoopers, Marcelo Cioffi, mesmo que o mercado melhore ao longo dos próximos meses, “as transportadoras primeiro vão colocar os veículos que estão parados na rua, para depois renovar a frota”.
A recuperação da produção, portanto, pode levar mais tempo, já que transportadoras e empresas com frota própria detêm 65% da frota de caminhões que circulam pelo País. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) tem registrados 1,67 milhão de caminhões aptos a realizar fretes, segundo dados atualizados neste mês.
Renovação. Roberto Cortes, presidente da fabricante de caminhões e ônibus MAN Latin América, cita o exemplo dos atacadistas que, segundo ele, tradicionalmente renovavam suas frotas a cada dois anos. “Ultimamente, eles deixaram de ir às compras” por causa da redução da entrega de mercadorias em geral.
Na área de logística, a frota em uso normalmente tinha entre dois e três anos, mas agora a idade está na faixa dos seis anos o que, na opinião de Cortes, não é condizente com o negócio desse segmento. “Quando o nível de confiança melhorar e a questão política se equalizar, esses clientes vão voltar, pois não é interessante para eles manterem caminhões velhos”, diz o executivo.

A caixa-preta do Sistema S, Celso Ming OESP




Reforma trabalhista deixou intacta a dinheirama que os sindicatos empresariais usam como bem entendem



Celso Ming, O Estado de S.Paulo
14 Maio 2017 | 05h00
A reforma trabalhista deve acabar com a obrigatoriedade da contribuição sindical e com as sinecuras dos sindicatos oportunistas. Mas deixou intacta a dinheirama do Sistema S, que os sindicatos empresariais usam como bem entendem.
Trata-se do conjunto de serviços administrados pelos organismos oficiais dos empresários cujas iniciais começam com S: Sesi, Senai, Sesc, Senar, Senac, Sest, Senat, Sebrae, Sescoop. É um bolão de recursos 4,5 vezes maior do que o do imposto sindical. Em 2016, os sindicatos patronais e dos trabalhadores receberam R$ 3,6 bilhões, enquanto só o Sistema S ficou com R$ 16 bilhões – excluindo-se a contribuição colhida paralelamente pelo Sesi e o Senai.

Sistema S
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O Sistema S nasceu há 75 anos, como parte das instituições getulistas destinadas a incentivar a industrialização. Seus recursos provêm da cobrança de contribuições das empresas, de 0,2% a 2,5% das folhas de pagamentos, e têm por objetivo financiar iniciativas que garantam qualificação profissional, educação, cultura, serviços de saúde e lazer para os trabalhadores.
Hoje, seu funcionamento se caracteriza pela produção de alguns serviços de excelência que, no entanto, escondem o principal. Em 2015, ano do balanço mais recente, o Senai, matriculou 3,4 milhões de pessoas em cursos profissionalizantes e de tecnologia. O Sesc ofereceu milhares de espetáculos de teatro e de shows artísticos. Mas é um resultado obtido em ambiente marcado pela falta de transparência, como concluíram investigações do Tribunal de Contas da União, o TCU. O edifício da Fiesp na Avenida Paulista, um dos pontos mais valorizados de São Paulo, foi construído inteiramente com recursos do Sesi e do Senai.
Certas sugestões de que os sindicatos partilhassem a administração desses recursos foram sumariamente rejeitadas. Prevaleceu um acordo tácito: os sindicatos continuariam a usar como quisessem os recursos do imposto sindical e os empresários fariam o mesmo com os do Sistema S. Com o fim da obrigatoriedade do imposto sindical, esse acordo deve ficar capenga.
Uma busca rápida no site do TCU mostra que tramitam pelo menos 29 processos sobre falta de informações ou de prováveis desvios de recursos. Na semana passada, o Senado enviou mais dois requerimentos de investigação ao TCU e ao Ministério da Transparência. O senador Ataídes Oliveira (PSDB-RO), autor dos requerimentos, sustenta ponto de vista que levanta preocupação: “O Sistema S é um caso de desvio de recursos públicos maior do que o da Petrobrás”.
Ataídes observa que Sesi, Sesc, Senai e outros “S” mantêm dezenas de milhões de reais em aplicações financeiras e investimentos imobiliários, notoriamente desvios de função, enquanto a aplicação do princípio de gratuidade, uma das obrigações do sistema, mal alcança 15% dos cursos ofertados. Exemplo disso é o Sebrae, encarregado de oferecer serviços aos pequenos e médios empresários. As investigações do TCU mostram que, nos últimos quatro anos, só 4,9% da receita bruta da instituição foram destinados a cursos gratuitos.
FALTA DE TRANSPARÊNCIA
Um dos desafios é obrigar as entidades paraestatais a seguir o modelo de gestão da iniciativa privada, com normas de compliance e governança. O TCU verificou que 83% das entidades do setor não possuem auditoria interna e 78% não são dotadas de conselho fiscal. 
Para o economista e presidente do Insper, Marcos Lisboa, a forma de seguir critérios de transparência é garantir a fiscalização dos balanços por auditores independentes. “A população paga um imposto a entidades privadas, que usam os recursos sem prestar contas a ninguém.”
Além da reforma trabalhista, a reforma da Previdência pode provocar mudanças. Uma das propostas já em discussão prevê a destinação de 30% dos recursos do Sistema S para aposentadorias públicas e despesas com saúde e assistência social.
Se isso acontecer. o Congresso terá a oportunidade de abrir a caixa-preta do Sistema S que há anos segue intocada. / COM RAQUEL BRANDÃO E MARIANA DURÃES, ESPECIAL PARA O ‘ESTADO

Reforma trabalhista acaba com homologação na rescisão, tema de 30% dos processos na Justiça, OESP



Defensores da ideia argumentam que o tema não é motivo de discórdia e, por isso, pode ser facilitado; dados da Justiça do Trabalho, porém, indicam o contrário



Fernando Nakagawa, O Estado de S.Paulo
12 Maio 2017 | 18h43

TRABALHO i
Relator cita que apenas 1,8% dos contratos encerrados em 2015 teve reclamação trabalhista quanto ao pagamento de verbas rescisórias Foto: Marcos Santos/USP Imagens
BRASÍLIA - Com a promessa de reduzir a burocracia para trabalhadores e empresas, a reforma trabalhista propõe acabar com a homologação obrigatória das rescisões de contrato. Assim, não será mais necessário ir ao sindicato após a demissão, o que muitas vezes é o procedimento usado para verificar se os valores pagos ao empregado estão corretos. Defensores da ideia argumentam que o tema não é motivo de discórdia e, por isso, pode ser facilitado. Dados da Justiça do Trabalho, porém, indicam o contrário: dos cinco temas mais reclamados pelos trabalhadores, quatro são relacionados à rescisão.
"A obrigatoriedade da homologação fazia sentido quando era necessário conferir se os trabalhadores, a maioria de pouca qualificação décadas atrás, estavam realmente recebendo seus direitos", cita a argumentação do relator do projeto na Câmara, Rogério Marinho (PSDB-RN). "Contudo, hoje as rescisões são pagas por meio de depósito bancário ou cheque identificado. Por isso, não é mais necessária terceira pessoa para atestar se o pagamento foi realmente realizado".
Na argumentação entregue aos deputados, o relator cita ainda que apenas 1,8% dos contratos encerrados em 2015 teve reclamação trabalhista quanto ao pagamento de verbas rescisórias.

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Saiba o que pode mudar no seu emprego com a reforma trabalhista

Números do Tribunal Superior do Trabalho (TST), no entanto, mostram um quadro mais controverso. No fim de 2016, as varas da Justiça do Trabalho em todo o Brasil acumulavam processos com 16,9 milhões de questionamentos sobre a relação patrão e empregado. Desse estoque, 30,1% dos processos dizem respeito à rescisão dos contratos e, entre os cinco temas mais reclamados na primeira instância, quatro são relacionados a esse procedimento final da relação trabalhista.
Segundo o TST, a principal reclamação na Justiça Trabalhista é exatamente o questionamento sobre os valores pagos na rescisão - tema que tem 693,9 mil processos. Em seguida, está o aviso prévio (693,5 mil processos), verba rescisória sobre auxílio-doença (613 mil) e multa de 40% sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (602,1 mil). Todos os quatro itens são procedimentos relacionados à rescisão de contrato.
"Na homologação, o empregado que desconhece a legislação tem assistência do sindicato para corrigir eventuais erros. Sem a homologação, o trabalhador estará sozinho e não conseguirá questionar o tema", diz o coordenador nacional de combate às fraudes nas relações de trabalho do Ministério Público do Trabalho, Paulo Joarês.
O presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo, Livio Enescu, diz que a mudança é "perigosa" para o trabalhador porque "retira a capacidade fiscalizatória" sobre o encerramento dos contratos. "Os pagamentos poderão ser feitos incorretamente ou pode haver fraude no FGTS, aviso prévio e compensação pelo banco de horas", exemplifica.