FOLHA DE SP - 16/10
Desde maio, quando Michel Temer (PMDB) ainda ocupava de forma interina a Presidência da República, o Congresso aprovou —ou está prestes a aprovar— projetos de lei e propostas de emenda à Constituição em número e relevância suficientes para modificar a vida econômica e política do país.
Como as medidas são também de interesse ou de iniciativa do Planalto, o desempenho indica, até aqui, a capacidade do governo de construir uma coalizão parlamentar ampla e fiel.
A demonstração de força tende a influenciar a percepção de lideranças políticas e agentes econômicos a respeito da viabilidade do programa de mudanças em curso. O próximo teste decisivo virá com a reforma da Previdência.
Chama a atenção que os projetos já aprovados ou em fase final de discussão constituem um programa. As providências adotadas em parte espelham itens da "Ponte para o Futuro" e da "Agenda Brasil", documentos apresentados na segunda metade do ano passado por lideranças do PMDB.
De maior impacto político, foi aprovada em primeiro turno, com maciça votação na Câmara, a emenda constitucional que impõe limites à expansão dos gastos federais. No entanto, outras modificações significativas ocorreram durante este governo que completa apenas cinco meses.
O Congresso modificou as leis do petróleo de modo a desobrigar a Petrobrasde tomar parte de todas as explorações do pré-sal. Trata-se de um alívio para a empresa endividada, que poderá decidir seus investimentos com base na rentabilidade, e de um incentivo para a retomada de investimentos, ora em escassez crítica.
Num outro flanco estão dispositivos que tendem a racionalizar a administração pública.
Aprovou-se a norma que facilita a gestão do Orçamento, a Desvinculação de Receitas da União (DRU), até 2023. Por sua vez, a alteração de leis de elaboração e execução do Orçamento, velhas de três décadas, está em tramitação final.
Há, além disso, uma nova lei de governança das estatais, que tende a melhorar a administração e o crédito das empresas, e a lei do setor elétrico, que facilita a privatização, entre outras providências.
Outros projetos promovem alterações que conjugam impacto em setores relevantes com reforço do apoio político ao governo.
As alterações no Simples, regime de tributação reduzida para empresas menores, aliviam a carga de impostos e criam laços do Planalto com milhões de empreendedores.
Também aumenta o lastro político do Executivo a lei de renegociação da dívida dos Estados —nesse caso, porém, Temer cedeu demais a governos irresponsáveis.
O conjunto dessa obra provisória terá em parte impactos imediatos. A probabilidade maior de aprovação de reformas saneadoras das finanças federais sustenta a ainda frágil retomada de ânimos econômicos. Deve permitir uma campanha mais agressiva de redução de juros, a qual o Banco Central talvez inicie nos próximos dias.
O bom desempenho no Parlamento encoraja o governo a propor uma reforma da Previdência ampla, embora o tema seja impopular. Assim como no caso do limite de gastos, estão em jogo pactos socioeconômicos fundamentais.
Antes mesmo de se conhecer o destino de tal reforma, outras devem entrar na agenda. Até março do ano que vem precisa ser votada a medida provisória que reorganiza o ensino médio.
Prevê-se, ainda no fim deste ano, o início da tramitação de uma reforma política que pretende dar cabo da multiplicação excessiva de partidos políticos e, talvez, alterar o sistema eleitoral. Em caso de sucesso, haverá reconfiguração partidária até 2022.
No âmbito econômico, estão na pauta mudanças na velha Lei de Licitações e na terceirização do trabalho, além da aprovação de parte menor da reforma tributária, mudanças no PIS/Cofins.
O programa de mudanças, em tempo tão curto, não é trivial. A aprovação final do teto de gastos, ademais, colocaria o país em outra rota econômica e política.
A fim de que seja viável, a limitação da despesa federal demanda reforma previdenciária e da eficiência do setor público em geral.
Em caso de sucesso, com a retomada do crescimento e a racionalização do governo, terá havido grande revisão de pactos sociais e a reversão da tendência de décadas de expansão do Estado.
O ambiente sem dúvida é nebuloso: não se descartam reviravoltas judiciais ou policiais; a recessão pode solapar a já pequena popularidade do presidente.
Até agora, porém, a força política de Michel Temer e sua coalizão é crescente. Se levado a cabo, o programa acelerado de reformas terá dado outro aspecto ao país até o final do ano que vem.