domingo, 12 de julho de 2015

Além do ajuste 12/07/2015

Além do ajuste

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Não há como dourar a pílula. A crise política e econômica é das mais graves, e as incertezas quanto aos seus desdobramentos provocam desânimo adicional em investidores e consumidores. Um ciclo vicioso que asfixia o país.
Embora as circunstâncias tornem mais difícil a tarefa de distinguir ruídos breves das tendências e oportunidades duradouras, é urgente encontrar caminhos capazes de dar maior envergadura às expectativas nacionais. É crucial identificar uma nova agenda de desenvolvimento para o Brasil.
Se um quadro como o atual não se desenha com apenas um erro, nenhum traçado estará completo se não levar em conta um equívoco decisivo: o diagnóstico que o governo Dilma Rousseff (PT) fez a respeito das mudanças no panorama internacional a partir de 2011.
Para o país, o principal não era o baixo crescimento das nações ricas, mas o movimento de redução dos preços das matérias-primas. O buraco nas transações com o restante do mundo cresceu e atingiu 4,5% do PIB em 2013 e 2014.
No ambiente doméstico, o impacto interno esperado era o esgotamento do empuxo de consumo financiado por transferências governamentais e crédito facilitado.
O fim dessa dinâmica observada na década passada demandava uma gestão diferente na economia, mais direcionada para o crescimento da produtividade e menos fundada nas benesses oficiais.
A presidente Dilma, no entanto, resumiu seu primeiro mandato a uma tentativa de resistir a essa orientação. Aplicou o que imaginava ser um remédio: gastos públicos crescentes, intervenções setoriais e leniência com a inflação.
Tratava-se de veneno, contudo. Os sintomas não tardaram: PIB estagnado ou encolhendo e inflação sempre elevada. O desemprego até se manteve baixo por um tempo, mas à custa de desequilíbrios crescentes que agora cobram a fatura.
Como se a dose já não fosse suficientemente alta, o estelionato eleitoral torna a recuperação mais tormentosa. A sociedade brasileira não foi preparada para a mudança de rumo. Sem credibilidade, Dilma tornou-se refém da conjuntura.
Pelo menos no curto prazo, o rumo é claro. Não há alternativa a não ser persistir na arrumação das contas e no controle da inflação.
A situação das finanças é a mais complexa. Em quatro anos, um superavit primário (saldo das receitas e despesas antes do pagamento dos juros) de 3% do PIB se transformou em deficit de 1,5%.
O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tenta voltar ao azul e atingir até 2016 um saldo de 2% do PIB, o mínimo necessário para estabilizar a dívida. A recessão e a irresponsabilidade do Congresso, porém, tornam o aperto mais difícil.
Na batalha da inflação, o Banco Central deve sair-se vitorioso –aliás, corre o risco de exagerar na artilharia–, tendo em vista a contração da economia, que ajustará salários e empregos.
Como resultado, a inflação deve cair em breve e abrir espaço para um ciclo de cortes de juros –a taxa Selic, que chegou a 7,25% em 2012, hoje está em 13,75%.
Mas é preciso ir além do ajuste e construir uma estratégia de longo prazo. Depois de esgotado o ciclo do consumo, que não criou –nem poderia– condições perenes de crescimento, quais podem ser os novos vetores de dinamismo? Há pelo menos dois candidatos.
Um deles é a indústria, o setor mais prejudicado nos últimos anos –a produção manufatureira regrediu ao nível de 2006.
A atual combinação de câmbio desvalorizado com menores pressões salariais pode aos poucos abrir nova perspectiva. Para aproveitá-la, será preciso formar consenso em torno de maior abertura econômica e integração comercial com as cadeias mundiais de produção, além de simplificar os tributos que mais oneram a produção, como PIS/Cofins e ICMS.
É uma agenda para vários anos, mas que precisa começar o quanto antes. Há, felizmente, sinais favoráveis tanto na orientação menos protecionista de empresários como na aparente disposição do governo de buscar acordos comerciais.
Outro vetor possível é a infraestrutura. Verdade que o horizonte próximo parece comprometido em decorrência da Operação Lava Jato. Mas o país tem um deficit de investimento de 3% do PIB ao ano que precisará ser coberto. O novo plano de concessões do governo dá conta de 10% das necessidades até 2018. É um início viável.
Se for possível reestabelecer os marcos de regulação e destravar a burocracia, haverá financiamento privado para cumprir essa etapa e preparar o país para saltos maiores.
Indústria e infraestrutura, ademais, têm potencial para dinamizar a produtividade e a geração de empregos de qualidade.
Não se trata de agenda simples, sobretudo porque mobilizar forças produtivas e sociais para a nova etapa de expansão econômica depende de liderança política –um recurso escasso no mercado brasileiro.

Um teste para seu DNA golpista


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Golpe, a praga que envenenou a República, voltou ao cotidiano. Há genes golpistas nas almas mais puras. Milton Campos (1900-1972), um liberal exemplar, serviu como ministro da Justiça à ditadura envergonhada do marechal Castello Branco. O golpismo afeta cabeças à direita ou à esquerda. Como ninguém gosta de ser chamado de golpista, derrubado o governo que se detesta, inventa-se outra palavra e saúda-se a nova ordem.
Sempre é bom lembrar que o governo mais estável da história nacional, o de D. Pedro 2º, durou 49 anos e nasceu com o golpe parlamentar que proclamou sua maioridade aos 14 anos.
Aqui vai um teste com dez episódios para que cada um possa examinar seu DNA. Indo em direção ao passado, marque a situação em que ocorreu um golpe. Ele pode ter sido parlamentar, vindo do Congresso, militar, trazido pelos tanques, ou misto.
1969: O presidente da República, marechal Costa e Silva, teve uma isquemia cerebral e estava incapacitado. Os três ministros militares chamaram o vice Pedro Aleixo, disseram que não assumiria e formaram uma Junta Militar. Seriam chamados de "os três patetas". Foi golpe?
1968: O marechal Costa e Silva baixou o Ato Institucional nº 5, fechou o Congresso e suspendeu liberdades públicas. Golpe?
1964: Depois de uma revolta militar, o presidente do Congresso declarou vaga a presidência da República e extinguiu o mandato de João Goulart. Os vitoriosos chamaram o movimento de "Revolução". Durante a ditadura, falar em golpe podia trazer problemas. Hoje, falar em "Revolução" é politicamente incorreto.
1961: Depois da renúncia de Jânio Quadros, os ministros militares recusaram-se a empossar o vice-presidente João Goulart. Com o país à beira de uma guerra civil, em poucos dias o Congresso votou uma emenda parlamentarista, mutilando os poderes de Jango, que só então assumiu. Até agora o teste havia sido fácil. Foi golpe?
1955: O presidente Café Filho teve um infarto e assumiu o deputado Carlos Luz. Ele demitiu o ministro da Guerra, Henrique Lott, e em poucas horas foi deposto pela tropa. O Congresso votou o impedimento de Luz e empossou o presidente do Senado, Nereu Ramos. Café tentou reassumir, a tropa voltou a se mover e o Congresso votou seu impeachment. Foi golpe?
1945: A tropa depôs o ditador Getúlio Vargas, que convocara eleições para eleger seu sucessor. Elas deveriam ser realizadas no dia 2 de dezembro, mas Getúlio foi deposto em outubro e tomou posse o presidente do Supremo Tribunal Federal. O general Eurico Dutra foi eleito e em 1946 instalou-se uma Assembleia Constituinte. Foi golpe?
1937: Com o apoio da tropa, Getúlio Vargas fechou o Congresso, suspendeu a eleição presidencial que marcara e criou o Estado Novo. Fácil.
1930: Candidato derrotado na eleição presidencial, Getúlio Vargas liderou uma revolta e a guarnição do Rio de Janeiro depôs o presidente Washington Luiz. Foi golpe ou foi a "Revolução de 1930"?
1891: O marechal Deodoro da Fonseca renunciou ao cargo e assumiu o vice, Floriano Peixoto. A Constituição mandava que fossem realizadas novas eleições. Floriano botou pra quebrar e governou até 1894. Chamaram-no "Marechal de Ferro". Deu golpe?
1889: No 49º ano de seu reinado, D. Pedro 2º foi deposto pela guarnição do Rio de Janeiro e banido do país com toda sua família. Proclamou-se a República. Golpe?
Quem marcou que houve golpe em todos os dez casos tem algo de Joaquim Nabuco ou Sobral Pinto no seu DNA. Fernando Henrique Cardoso marcou nove casos, excluindo o episódio da emenda parlamentarista de 1961. Quem não viu golpe em 1889, 1930 e 1945 tem uma inclinação para apoiar "golpes para o bem". Quem aceitou as intervenções de 1937, 1964, 1968 e 1969 é um golpista de plantão.
Em todos os dez episódios listados houve um ingrediente que felizmente saiu do baralho em 1985, com a eleição de Tancredo Neves: a anarquia militar. Salvo no golpe de 1969, nunca houve intervenção militar sem que houvesse civis pedindo-a. Em quase todos os casos haviam perdido eleições ou temiam perdê-las.
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VOLTA AO PASSADO
De um psicanalista de botequim: "A frequência com que Dilma Rousseff tem se referido aos seus dias de cadeia e tortura nos anos 70 pode indicar a força de sua personalidade, mas também pode ser uma regressão a um tempo em que ela se sentia só e vulnerável."
VOZES d'ÁFRICA
Representantes do Ministério Público têm viajado para países africanos onde as empreiteiras metidas na Lava Jato conseguiram negócios bilionários.
BLINDAGEM
Um dos mais talentosos criminalistas de São Paulo, advogado de empreiteiras, reconheceu há algumas semanas que até agora o trabalho do juiz Sergio Moro não deixou brechas para a anulação de suas sentenças nas instâncias superiores.
DOCUMENTOS DOS EUA
Pérola colhida num dos documentos do tempo da ditadura liberados pelo governo americano: No final de 1968 e no início de 1969, os superiores do capitão Carlos Lamarca receberam três avisos de que ele e um sargento estavam aliciando soldados.
Um par de denúncias veio de um cabo e de sua mulher. A outra, de um soldado. Resolveu-se manter o assunto fora do conhecimento do comando do Exército. Lamarca saqueou o arsenal do quartel e desertou no final de janeiro.
Ficou tudo no nível das conversas. Se não fosse um telegrama da Defense Intelligence Agency, o frango ficaria esquecido.
A CRISE
Um movimentado restaurante da avenida Atlântica tinha 35 funcionários em dezembro do ano passado. Hoje está com 19 e seu faturamento caiu à metade.
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O GRUPO DE CUNHA
Um deputado jura ter ouvido do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que por ter votado contra ele num projeto, estaria excluído do "nosso grupo".
Resta saber o que vem a ser "nosso grupo".
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JUSTIÇA EFICAZ
O Judiciário funciona e é rápido nos Estados Unidos. Por iniciativa do Departamento de Justiça americano, um tribunal federal bloqueou a propriedade da "Esmeralda da Bahia" até que o Judiciário brasileiro confirme que ela foi extraída, exportada e transportada ilegalmente para os Estados Unidos.
Trata-se da maior pedra com formação de esmeraldas já encontrada no mundo. Um dos seus nove cilindros tem cerca de um metro de altura. Vale milhões de dólares como peça de museu.
Sua história é a narrativa de um Estado que funciona e de outro, gigante pela própria natureza, que dorme eternamente em berço esplêndido. A pedra foi extraída em 2001 num garimpo ilegal da Bahia. Em 2005, foi exportada para os Estados Unidos como se fosse material asfáltico. Em 2011, o gigante adormecido foi avisado pelo governo americano de que essa pedra aparecera por lá numa briga de comerciantes que se diziam seus donos.
Três anos depois, o governo brasileiro resolveu disputar a propriedade da pedra e contratou o advogado americano John Nadolenco. A fatura foi liquidada em questão de meses. Enquanto a Justiça da Califórnia decidia qual dono americano poderia ficar com a pedra, ele pediu a um tribunal de Washington que mantivesse a posse da esmeralda sob custódia da polícia de Los Angeles até que ela pudesse ser devolvida ao Brasil. Ganhou.
A "Esmeralda da Bahia" só voltará ao Brasil quando terminar o processo que a Viúva move contra os brasileiros que a extraíram e mutretaram sua exportação fraudulenta. Ele só foi iniciado em 2014 e tramita na Justiça Federal de Campinas. 

Cai investimento em rodovias de São Paulo


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Os investimentos do governo do Estado de São Paulo nas rodovias diminuíram neste ano em decorrência da queda na arrecadação.
No início do ano, eram realizadas obras de expansão e duplicação de estradas que demandavam do Estado cerca de R$ 200 milhões por mês.
O DER (Departamento de Estradas de Rodagem), porém, pediu para as empresas reduzirem os cronogramas das obras para que o governo conseguisse realizar os pagamentos. Desde então, os valores mensais caíram para cerca de R$ 50 milhões, segundo o Sinicesp (Sindicato da Indústria da Construção Pesada do Estado de São Paulo).
"O pagamento é feito conforme o cronograma, e houve uma redução drástica nos cronogramas", diz Helcio Farias, executivo da entidade.
Mesmo com a diminuição no ritmo das obras, o Estado não tem conseguido pagar as companhias em dia. Aproximadamente R$ 70 milhões (devidos a 60 empresas) estão atrasados há mais de 30 dias.
Os trabalhos de manutenção das rodovias também são reembolsados fora do prazo desde o começo do ano.
O setor de construção pesada enfrenta dificuldades com a crise. Nos 12 meses encerrados em maio, 14,4 mil vagas foram fechadas no Estado. Hoje, são 103,4 mil empregados.
O DER afirmou, por nota, que os pagamentos atrasados serão realizados nesta semana e que "implementou a adequação do cronograma de obras, realizadas com recurso do Tesouro do Estado, tendo em vista a atual disponibilidade orçamentária."
Segundo o órgão, em 2015 foram iniciadas 25 obras com aporte de R$ 842 milhões.
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Reforma na carteira
A indústria nacional de materiais de construção reduziu em 4% o quadro de empregados em abril deste ano, na comparação com o mesmo período de 2014, segundo estudo da FGV encomendado pela Abramat (que representa o setor).
Foram demitidas cerca de 35 mil pessoas no período. Em abril de 2015, a indústria somava 828,4 mil postos de empregos formais.
Somente no Estado de São Paulo, houve uma diminuição de 15 mil vagas. A retração foi superior à média nacional, com 5,8%.
Os desligamentos são reflexo do baixo desempenho dos mercados imobiliário e de infraestrutura.
"As pessoas estão inseguras para comprar ou reformar um imóvel e as empresas postergam a construção de shoppings e edifícios, enquanto as obras de infraestrutura estão paralisadas", diz Walter Cover, presidente da entidade.
No primeiro semestre de 2015, as vendas de materiais para construtoras caíram 10%, em relação ao mesmo período de 2014.
Segmentos como de instalações elétricas, cerâmicas e acabamentos tiveram reflexos mais tênues, por causa da entrega de imóveis que começaram a ser construídos em 2013.
"O volume de empregos deve continuar caindo até o final do ano, a menos que haja uma reversão total nesse cenário", diz Cover.
-0,7% foi a variação no número de empregos no país em abril deste ano ante o mês anterior
50% é a participação do varejo no volume de vendas do setor
239,9 mil era o número de funcionários da indústria no Estado de São Paulo em abril deste ano
29% é a participação de São Paulo no quadro nacional de funcionários
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