segunda-feira, 15 de junho de 2015

Seres erráticos (oportunidades perdidas)


Publicado por Luiz Flávio Gomes - 10 horas atrás
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É da condição humana ser errático.[1] Nos últimos dias, Lula é a bola da vez. Seu instituto teria recebido milhões de uma das suspeitas empreiteiras que, na nossa cleptocracia (Estado governado por ladrões), costumam (antidemocraticamente, antirrepublicanamente) “doar” dinheiro para todos os institutos e partidos que possam satisfazer seus inconfessáveis interesses. Mas no mundo errático que sempre vivemos, somente o líder petista neste instante seria o torto ou todos nós também o seríamos? Errático é, antes de tudo, quem faz mau uso da liberdade. É errático quem usa a liberdade de eleição para eleger seu senhor de engenho (seu carrasco, seu algoz ou um inimigo dos interesses gerais). Essa liberdade de eleição, típica das democracias eleitorais (como a nossa), não eliminam os amos (os novos senhores de engenho de todas as cores ideológicas) nem acaba com a escravidão ou servidão (Marcuse). Oportunidades perdidas.
Nós somos, na essência, seres abertos, mas frequentemente vivemos em “jaulas de ferro” (Weber), que nós mesmos inventamos. Temos em muitas ocasiões chance de nos projetar, de crescer, de nos educar, mas preferimos nos submeter servilmente. Com graça, o filósofo renascentista italiano Pico de la Mirándola (1463-1494), rebelde considerado herege pela Igreja Católica (antes da sua conversão), narrou o seguinte:
“Concluída sua obra (de construção do universo), o grande Artífice queria alguém que admirasse a beleza da sua criação (…) inventou o humano e deu-lhe uma forma indeterminada. Disse a Adão: ‘Não dei a você nenhum posto fixo, nem uma imagem peculiar, nem um emprego determinado. Às demais criaturas prescrevi uma natureza regida por certas leis. Você marcará sua natureza segundo a liberdade que entreguei a você, pois não está submetido a nenhum regra fixa da natureza; não fiz você nem celeste nem terrestre, nem mortal nem imortal. Você mesmo haverá de forjar a forma que prefira para você, pois é o árbitro da sua honra, seu modelador, seus desenhista. Com suas decisões você pode se rebaixar até igualar-se com os brutos ou pode levantar até as coisas divinas.” [2]
Seres errticos oportunidades perdidas
Os que possuem chance de crescer (pessoal ou coletivamente), de se elevar (moral e eticamente, por exemplo), mas não o fazem, são seres (ou países) profundamente erráticos, que se fecham quando deveriam ser abertos, que se aniquilam quando poderiam se emancipar, que paralisam suas vocações quando poderiam se modelar exemplarmente. Quando tomado pelo comodismo se torna estacionário. Nesse estado, nem se rebaixa nem se levanta, nem abraça a vileza nem se orgulha das alturas, porque não se empenha por construir-se, por elevar-se, por transcender-se. Não retrocede nem avança. Vive, muitas vezes, em movimento, mas não cria novidade qualitativa nenhuma. Não modifica o tabuleiro da sua existência nem cria jogadas que poderiam lhe transformar vertiginosamente.
Não cria uma imagem de mundo diferente nem abre para si um estilo de vida distinto. Gira sempre sobre o mesmo eixo. Com frequência falsamente. Sua atividade se esgota na atividade mesma. Vê que tudo está se tornando líquido (Bauman), mas não se move para alterar o rumo dos acontecimentos. Vive indignado, mas nada constrói para modificar sua situação. Fica angustiado com o vazio, mas nada faz para preenchê-lo. De novo nada produz. Não inova. Esquece que quem não se regenera, degenera (E. Morin). Que quem não cresce, decresce. Quando se mobiliza é para administrar as carências. O ser errático estacionário é fruto de uma sociedade estacionária, [3] que se movimenta para nada alcançar em termos de mudanças relevantes.
[1] SÁEZ RUEDA, Luis. Ser errático. Madrid: Editorial Trota, 2009, p. 11 e ss.
[2] Em SÁEZ RUEDA, Luis. Ser errático. Madrid: Editorial Trota, 2009, p. 31.
[3] SÁEZ RUEDA, Luis. Ser errático. Madrid: Editorial Trota, 2009, p. 32.

Réquiem para os combustíveis fósseis?, por José Goldemberg no OESP


Ao adotar essas reduções, o comunicado dá um significado concreto ao que se entende por desenvolvimento sustentável, que até agora tem sido um conceito vago.15/06/2015 - O Estado de S. Paulo - José Goldemberg
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Réquiem é a música que se ouve nos funerais e é oferecida para o repouso da alma.  Os chefes de Estado do G-7 (Estados Unidos, Alemanha, França, Inglaterra, Japão, Canadá e Itália), reunidos na Alemanha na semana passada, adotaram uma resolução que corresponde na prática a um funeral programado do uso dos combustíveis fósseis até o fim deste século.

O comunicado final do encontro afirma que são necessários cortes profundos na emissão dos gases causadores do aquecimento mundial e, consequentemente, das mudanças climáticas.  No fim do século as emissões seriam “próximas de zero” e, mais especificamente, reduzir-se-ão – em colaboração com todos os outros signatários da Convenção do Clima – de 40% a 70% relativamente aos níveis de 2010, até 2050.  As emissões de gases causadores do efeito estufa originam-se na queima de combustíveis fósseis (carvão mineral, petróleo e gás natural).  

Ao adotar essas reduções, o comunicado dá um significado concreto ao que se entende por desenvolvimento sustentável, que até agora tem sido um conceito vago.  Agora um calendário existe para a adoção das ações necessárias para atingi-lo.  

A importância da decisão do G-7 é significativa porque representa um endosso completo dos estudos científicos do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), da ONU, que envolve todos os países do mundo e tem sido questionado por alguns “céticos”.  É desses estudos que decorre a necessidade de reduzir fortemente as emissões para impedir que a elevação da temperatura média da Terra ultrapasse em 2 graus centígrados a temperatura média atual.

 Além disso, o comunicado enfatiza a importância de se promover a adoção de energias renováveis – eólica, de biomassa e solar –, bem como a eliminação de subsídios para os combustíveis fósseis.

Não deixa de ser um pouco surpreendente que os países do G-7 tenham tomado agora uma posição tão firme quanto à redução das emissões.  Outras tentativas de adotar resoluções do mesmo tipo foram feitas em reuniões anteriores e todas elas fracassaram.  

É óbvio, portanto, que a resolução do G-7 não caiu do espaço, mas resultou da evolução que está ocorrendo silenciosamente em muitos países onde as evidências dos problemas causados pelas emissões estão se tornando claras.  Os avanços científicos, por sua vez, estão dando robustez à realidade do “efeito estufa”.

 Alguns exemplos dessa evolução são os seguintes:

Seis grandes empresas europeias produtoras de gás e petróleo, entre as quais a francesa Total, propuseram a adoção de uma taxa sobre as emissões de carbono, o que favorece a “descarbonização” do sistema produtivo, com uma redução do consumo de carvão, que já está ocorrendo na Europa e na China.  Muitas outras empresas já incluem um preço para o carbono emitido ao tomarem decisões sobre seus futuros investimentos, porque consideram evidente que isso vai acontecer, mais cedo ou mais tarde, e querem antecipar-se às decisões que serão adotadas pelos governos.  

O custo das energias renováveis tem caído dramaticamente e elas representam uma fração crescente do consumo total de energia.  

Muitas grandes empresas – como a Unilever (anglo-holandesa), L’Oréal (francesa), Ikea (suíça), Enel (italiana) – estão reduzindo as suas emissões por motivos variados, um dos quais é a reputação da companhia como uma empresa “verde”.  Essa reputação valoriza as suas ações nas bolsas de valores internacionais.


O fundo soberano da Noruega, com cerca de US$ 1 trilhão, está se afastando de investimentos em combustíveis fósseis no mundo todo.

Todos esses fatores estão aumentando a possibilidade de que a Conferência de Paris, no fim deste ano – cujo objetivo é adotar novos compromissos mundiais para a redução das emissões de gases-estufa –, tenha sucesso, completando, assim, o trabalho da Conferência do Rio, em 1992 que adotou a Convenção do Clima.  

Há, porém, uma condição que é essencial para que isso aconteça: que os países em desenvolvimento, além do G-7, adotem medidas sérias a respeito da redução de suas emissões de gases de efeito estufa.  Sem a participação dessas nações a meta de limitar o aumento da temperatura da Terra em 2 graus centígrados até o fim do século não vai ser alcançada.  Os países do G-7, que estão agora seriamente engajados na redução das emissões, representam apenas 24% do total emitido.  

Dos 76% restantes, 65% se originam nos países em desenvolvimento, entre eles a China, que representa quase um terço do total.  Além disso, alguns países industrializados que não fazem parte dos G-7 são grandes emissores e emitem 13% do total global, entre eles a Rússia.

Para atingir as metas almejadas pelos países do G-7 seria preciso que todos se engajassem seriamente, adotando energias renováveis e métodos mais eficientes de produzir e utilizar energia.  

A China já se adiantou nesse processo ao assumir o compromisso de deixar de aumentar suas emissões em 2030 e reduzi-las daí para a frente.

Há, pois, uma grande oportunidade para a diplomacia brasileira de reconquistar o papel de liderança que o Brasil teve em 1992: a de convocar uma conferencia dos países em desenvolvimento para propor as medidas adequadas a eles.  O Brasil é um dos países com menor participação de combustíveis fósseis na sua matriz energética e tem muito a mostrar na área de energias renováveis.  Seria um magnífico contraponto ao que os países do G-7 fizeram e mostraria ao mundo que as nações em desenvolvimento estão dispostas a participar do esforço global de redução das emissões – já que o aquecimento global afeta a todos – e a fazer sua parte, não apenas ficar no papel passivo de pleitear recursos internacionais para fazê-lo.

 José Goldemberg é professor emérito da Universidade de São Paulo (USP), foi secretário de meio ambiente da Presidência da República por ocasião da adoção da convenção do clima, em 1992

15 Junho 2015 | 03h 00

Relatório mundial sobre bioenergia e sustentabilidade é apresentado na Fiesp, da FAPESP


15 de junho de 2015

Por Samuel Antenor | Agência FAPESP – Os principais pontos do relatório Bioenergy & Sustainability: bridging the gaps, lançado em abril na FAPESP, foram apresentados na última quinta-feira (11/06), na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), em São Paulo.
O relatório é uma iniciativa da FAPESP em conjunto com o Comitê Científico para Problemas do Ambiente (Scope, na sigla em inglês), agência intergovernamental ligada à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
A apresentação do relatório fez parte do Festival Internacional de Biotecnologia (Biofest), organizado pela Federação e pelo Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), durante a Semana de Meio Ambiente Fiesp/Ciesp.
Participaram da discussão Celso Lafer, presidente da FAPESP, Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fundação, Rodrigo Loures, presidente do Conselho Superior de Inovação e Competitividade da Fiesp, e Eduardo Giacomazzi, coordenador adjunto do Comitê da Cadeia da Bioindústria da Fiesp.
Conduzida por Glaucia Mendes Souza, membro da coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa em Bioenergia (BIOEN)  e coeditora da publicação, a apresentação também contou com participação de pesquisadores dos programas FAPESP de Pesquisas em Caracterização, Conservação, Restauração e Uso Sustentável da Biodiversidade (BIOTA)  e Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG), que elaboraram alguns dos capítulos do relatório.
A versão final da publicação é resultado do trabalho de 137 especialistas de 24 países, ligados a 82 instituições, que trabalharam sob a coordenação dos pesquisadores ligados aos programas da FAPESP. Baseado em mais de 2 mil referências e estudos, o relatório fornece uma análise abrangente tanto das tecnologias quanto das práticas atuais de produção de bioenergia no mundo, incluindo sistemas, mercado e potencial de expansão sustentável para esse setor.
Além de abordar os principais pontos do relatório, a proposta da apresentação na Fiesp foi a de abrir para o setor industrial a discussão sobre como o conhecimento científico e tecnológico voltado para a expansão da produção e do uso da bioenergia pode oferecer contribuições ao desenvolvimento industrial e à bioeconomia.
Para Glaucia Mendes Souza, o relatório mostra a necessidade de que as políticas sejam integradas, para que toda a cadeia da bioenergia possa ser beneficiada nesse processo. Ela ressalta que é preciso ter uma visão coordenada e integrada das várias iniciativas, incluindo a produção de biomassa, onde está a maior parte do custo de produção da bioenergia. Segundo a pesquisadora, as oportunidades para o setor produtivo são abrangentes e bastante significativas.
“Há um grande potencial a ser desenvolvido, passando pela logística de produção, biorrefinarias, tecnologias de conversão, comércio internacional de combustíveis, certificação, além dos aspectos sociais, de governança e dos esforços de financiamento”, observou.
O papel da indústria
As apresentações foram feitas em dois módulos, Cadeias de Abastecimento e Segurança Ambiental e Desenvolvimento Sustentável e Inovação, nos quais foram discutidos aspectos sobre uso da água, emissões de gases do efeito estufa, segurança climática e ambiental, tecnologias de conversão, motores e segurança alimentar, entre outros.
Para Celso Lafer, a elaboração do relatório reflete a maneira como os três programas da FAPESP combinam o avanço do conhecimento e sua aplicação na esfera das políticas públicas. “Esse relatório é fruto do reconhecimento desses programas em nível internacional, que permitiu, no âmbito do Scope, chegar a um relatório significativo, de interesse internacional. Esperamos agora que a Fiesp, ao ter acesso a esse conhecimento, possa colocá-lo em prática, em benefício de São Paulo e do Brasil.”
Rodrigo Loures acredita que a indústria tenha um papel importante nesse processo, que envolve bioenergia, segurança alimentar e produção industrial. “Queremos pensar em colaboração com a comunidade científica e os gestores públicos em como desenvolver novas tecnologias, colocá-las no mercado e transformar esse conhecimento em riqueza e ações que concorram para um mundo melhor, ancorado na questão da sustentabilidade”, disse.
Para aprofundar esse debate, ele anunciou que a Federação está preparando uma conferência internacional sobre bioeconomia, que deverá reunir pesquisadores, gestores e profissionais da indústria no final de 2015, na sede da Fiesp, em São Paulo.
Potencial da Bioenergia
Carlos Henrique de Brito Cruz falou no evento sobre necessidades e obstáculos para o uso sustentável da bioenergia. Segundo ele, há atualmente no mundo um interesse crescente sobre o potencial da bioenergia, do ponto de vista da ciência, mas também da economia.
“Em 2014, 19% de toda a energia usada no Brasil veio da cana-de-açúcar. Isso mostra o quanto é viável reduzir a dependência de petróleo como fonte de energia, não apenas aqui, mas também em outros países que precisam diminuir sua dependência em relação ao petróleo por razões econômicas, políticas e ambientais”, observou.
De acordo com Giacomazzi, a Fiesp quer construir uma agenda para discussão em torno do tema da bioenergia, envolvendo ciência e setor industrial em São Paulo.
Para ele, a economia de base biológica requer que tecnologias, parcerias inovadoras e políticas para uso e expansão da bioenergia sejam definidas com base no conhecimento científico. “Esperamos que esse debate estimule a indústria para uma nova visão, aproveitando as competências científicas para o desenvolvimento regional, mostrando como esse potencial pode se transformar em oportunidades para o setor produtivo.”
Também participaram do debate na Fiesp Maria Victoria Ramos Ballester, do Centro de Energia Nuclear da Agricultura (Cena) da Universidade de São Paulo (USP); Isaias de Carvalho Macedo, do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Estratégico da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); Paulo Artaxo, do Instituto de Física da USP; Manoel Regis Leal, do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (LNBio); Luiz Augusto Cortez, da Faculdade de Engenharia Agrícola da Unicamp; e Francisco Nigro, da Escola Politécnica da USP, coautores do relatório.
A íntegra do relatório Bioenergy & Sustainability: bridging the gaps, com 779 páginas, está disponível online para leitura e download no endereço bioenfapesp.org/scopebioenergy/index.php/chapters.
A próxima apresentação do relatório será feita em Bruxelas, na Bélgica, no dia 17 de junho, quando estarão presentes alguns dos principais tomadores de decisão quanto ao uso da bioenergia nos principais países. Mais informações:www.eusew.eu/component/see_eventview/?view=see_eventdetail&mapType=hlpc&eventid=4514
 

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