terça-feira, 19 de março de 2013

Semente salva - XICO GRAZIANO



O ESTADÃO - 19/03

Cobrança de royalties sobre sementes agrícolas. Esse assunto causou recentemente uma desgastante briga de braços entre produtores nacionais de soja e a multinacional Monsanto. Judicializada, a querela exigiu conhecimentos de botânica nos tribunais. Uma mistura de Agronomia com Direito.

Os sojicultores não questionaram, propriamente, o direito de patentes sobre produtos oriundos do melhoramento genético e da biotecnologia, nesse caso, da soja transgênica RR1. Reconhece-se que os pesquisadores e seus laboratórios, do setor público ou privado, sejam remunerados pelas tecnologias inovadoras que desenvolvem. A experiência mundial garante que o pagamento de royalties estimula as descobertas científicas.

No Brasil, esses direitos intelectuais são definidos na Lei da Propriedade Industrial (n.º 9.279/96), que regula as patentes em geral, e na Lei de Proteção de Cultivares (n.º 9.456/97), na qual se regra a produção de mudas e sementes dos vegetais. Embora aceitas amplamente, existem, como sempre, controvérsias jurídicas. A principal delas advém do fato de existirem tratamentos diferenciados entre as sementes transgênicas e as convencionais.

Estas últimas, obtidas pelo processo tradicional do melhoramento genético, se enquadram na Lei de Proteção dos Cultivares. Na Embrapa, que lidera a pesquisa agronômica, existem centenas de variedades de cereais, hortaliças e frutas protegidas com o direito exclusivo de produção das sementes básicas, de alta qualidade. Por meio de convênios, a instituição pública pode repassar sua atribuição a firmas sementeiras, remunerando-se pelos investimentos realizados na obtenção da tecnologia. Beleza.

Já os produtos da engenharia genética, por serem considerados uma "invenção" tecnológica, acabaram se enquadrando na lei das patentes industriais. Dessa forma, empresas que as desenvolvem têm garantido o direito de cobrar royalties pela sua utilização. A Monsanto, que descobriu o gene RR e o incorporou ao genoma da soja, fornecendo à lavoura resistência contra certo herbicida, deteve por 20 anos a exclusividade na produção das sementes dessa leguminosa.

O argumento dos sojicultores, ao acionarem a Monsanto na Justiça, residia no prazo de vencimento da patente, ocorrido, segundo eles, desde 2010. A batalha nos tribunais trouxe à tona, para os juristas, uma curiosidade do mundo agrícola: a chamada semente salva. Ela se caracteriza quando os produtores rurais guardam grãos de sua própria colheita para utilizá-los como sementes na safra seguinte. A prerrogativa legal visa a combater o abuso do poder econômico, bem como a exagerada dependência do agricultor, permitindo-lhe escapar das compras contínuas das empresas produtoras de sementes.

Pois bem, foi sobre estas - as sementes salvas da soja - que nasceu a polêmica contra a Monsanto. Aconteceu o seguinte: os produtores rurais adquiriram sementes da soja RR1, pagando normalmente os royalties, embutidos no preço da saca comprada. Mas após colherem sua produção retiveram certa quantidade de grãos, destinados ao plantio seguinte. Só que a empresa, com base no seu direito de patente, exigiu também o pagamento de royalties sobre a semente salva dessa segunda colheita. Mas como cobrar isso?

Em acordo com as tradings e cooperativas que comercializam soja, passaram a examinar o DNA dos grãos vendidos e, em caso positivo para o gene RR1, recolhiam uma taxa de 2% sobre o valor negociado no mercado. No princípio, os agricultores engoliram, a contragosto, o mecanismo que onerava sua pós-colheita. Depois, resolveram partir para a briga, vencendo liminarmente a causa.

Se juridicamente o assunto parece complexo, quando se incluem as questões da agronomia ele se torna mais complicado ainda. Fica, porém, interessante. É curioso saber que a utilização de sementes salvas não funciona bem em todos os vegetais. Botanicamente, existem espécies, como a soja, cuja polinização ocorre dentro da mesma flor, na mesma planta. Nesse caso, quanto impera a autofecundação, os descendentes nascem mais homogêneos, geneticamente parecidos entre si. São as espécies endógamas.

Existe, porém, outro grupo de plantas nas quais, ao contrário, as estruturas botânicas favorecem a polinização cruzada. Nesse caso, o pólen fertilizante vem, trazido pelo vento ou por insetos, de flores distantes. Nessas espécies, os descendentes sujeitam-se ao processo de segregação genética, resultando maior diversidade entre filhos e pais. O milho funciona assim, caracterizando uma espécie alógama.

Se você plantar o caroço de uma manga deliciosa, por exemplo, o pé nascido dificilmente dará frutos iguais àquele que o encantou pelo sabor. Isso porque aquela semente foi gerada por fertilização cruzada, e a mistura de genes provocará uma descendência incerta, podendo ser igual, melhor ou pior que a mangueira-mãe. Por isso, na maioria das fruteiras se utiliza a técnica da enxertia ou da estaquia, por meio das quais se cria um clone da planta selecionada. Aí não tem erro.

Os sojicultores, em Mato Grosso principalmente, comemoraram sua vitória contra a gigante multinacional. Deixarão de recolher royalties sobre as sementes salvas de soja transgênica, utilizando-as com tranquilidade no plantio seguinte. Um perigo, porém, se esconde nesse assunto: a pirataria.

Agricultores espertos guardam grãos, de soja ou algodão, não para os utilizarem na sua própria lavoura, mas para venderem como sementes no mercado, o que é totalmente proibido. Escondida sob o manto das sementes salvas, a malandragem pirata tem crescido, pondo em risco a qualidade das lavouras brasileiras. Um caso de polícia para a fiscalização resolver.

COTAS -Desembarques na Normandia - JOÃO PEREIRA COUTINHO

COTAS RACIAIS nas universidades: os argumentos são conhecidos.

Para o pensamento progressista, as cotas são uma forma de corrigir injustiças passadas, abrindo as portas das melhores universidades a candidatos negros, ou hispânicos, ou nativos-americanos etc.

Para temperamentos mais conservadores, as cotas são uma nova forma de racismo, ainda que invertido, ao reduzir a singular individualidade de cada um à mera pigmentação da pele.

E são, claro, um atentado às mais elementares noções de mérito.

Os argumentos são conhecidos, repito. Mas o que dizer quando duas bíblias do progressismo americano -o "New York Times" e a revista "Atlantic"- publicam matérias altamente críticas sobre as políticas afirmativas no país?

Aconteceu. Nenhuma delas repete argumentos gastos porque a discussão deixou de ser ideológica. Passou a ser empírica: estarão as políticas afirmativas a produzir efeitos contrários aos pretendidos?

Ambas respondem que sim e dão nome ao descalabro: "mismatch". Ou, traduzindo o conceito, alunos impreparados que entram em universidades de elite através de preferências raciais têm desempenhos acadêmicos sofríveis.

E esse "mismatch" não se limita aos anos de formação. Ele acompanha os indivíduos para o resto das suas vidas profissionais.

O problema é particularmente pronunciado nas ciências, nas engenharias e nas matemáticas, o que não admira: o conhecimento nas "ciências exatas", relembra o "New York Times", é um conhecimento contínuo, onde é necessária uma forte preparação de base para haver progressos contínuos também.

Sem essa preparação, chegar a universidades de elite apenas pela cor da pele é uma espécie de desembarque pedagógico nas praias da Normandia.

A "Atlantic" quantifica essa carnificina: os alunos negros continuam a preferir mais cursos de ciências ou de engenharia do que os brancos; mas o "mismatch" faz com que a desistência entre negros seja o dobro da verificada entre os brancos.

O mesmo acontece depois da universidade: em direito, por exemplo, os alunos negros são reprovados no exame de acesso à profissão quatro vez mais do que os alunos brancos; o "mismatch" explica metade desses fracassos. O que fazer perante os números aterradores das políticas afirmativas?

Escondê-los tem sido uma opção, o que significa arruinar silenciosamente a vida de milhares de pessoas para que as consciências progressistas possam dormir com as suas vaidades intactas.

Outra opção, sugerida sem um pingo de vergonha pelo "New York Times", é "convidar" as instituições de elite a serem um pouco menos de elite. No fundo, "convidar" Harvard a não ser Harvard -uma forma de corrupção intelectual e um caminho para o atraso científico do país.

Mas existe uma terceira via: defender a velha ideia de que competências médias devem frequentar universidades médias.

A "Atlantic", aliás, revela uma curiosa experiência: em 1998, a prestigiada UCLA deixou de usar critérios raciais nas suas admissões. Resultado imediato: queda acentuada de alunos negros (menos 50%) e hispânicos (menos 25%). Escândalo e protestos.

Porém, o mais espantoso é que, nos anos seguintes à abolição dos critérios raciais e, apesar da queda, o número total de negros e hispânicos graduados pela UCLA era semelhante ao número de negros e hispânicos que terminaram os seus cursos antes da abolição. Por quê?

Razões várias. Cito duas. Primeiro, porque a UCLA acabou por atrair os melhores alunos negros e hispânicos que assim puderam frequentar uma universidade sem o "estigma" das políticas afirmativas.

E, mais importante ainda, porque aumentou o número de alunos negros e hispânicos que iniciaram a sua formação em universidades mais modestas -e só depois se transferiram para a UCLA.

Sim, ideologicamente, sou contra discriminações positivas (ou negativas) porque sou incapaz de reduzir qualquer ser humano a um "grupo" ou uma "raça". E não creio que seja função da universidade prosseguir agendas igualitárias. Apenas científicas.

Mas existem evidências empíricas que reforçam as ideológicas: a igualdade de oportunidades deve ser uma igualdade de base na formação de qualquer indivíduo.

Pretender corrigir no fim o que vem torto desde o início é destruir vidas adultas com ilusões politicamente corretas.

Brasil desenvolve plástico solar



Pesquisadores brasileiros desenvolveram painéis plásticos capazes de gerar eletricidade a partir da luz do Sol. A descoberta é parte de uma tendência em alta no Brasil: o desenvolvimento e a inserção de tecnologias verdes. O plástico é fino e flexível, com aparência bastante comum, mas se trata de um painel de geração de energia fotovoltaica. O material, que em nada se parece com as pesadas e caras placas de silício que imaginamos ao pensar nesta fonte de eletricidade, foi criado por cientistas do CSEM Brasil, instituto com sede em Minas Gerais.

Composto por polímeros comuns, aos quais são incorporadas células fotovoltaicas orgânicas, este material é transparente, com pequenas faixas nas quais estão impressos os polímeros orgânicos à base de carbono. A tecnologia para produzir estas células já era conhecida na Europa e nos Estados Unidos, e agora também é no Brasil. O “plástico solar” pode representar, afirmaram seus inventores, uma pequena revolução na forma de gerar energia limpa a partir do Sol.

“Embora a capacidade de geração seja bastante parecida, por seu pequeno tamanho pode ter usos quase impossíveis para as placas de silício”, disse ao Terramérica o presidente do CSEM Brasil, Tiago Maranhão Alves, engenheiro físico que participou diretamente das pesquisas. Esta técnica pode ser empregada para fazer funcionar componentes elétricos dos automóveis, em dispositivos eletrônicos como telefones celulares, mouses de computadores e teclados sem fio.

Porém, os brasileiros estão concentrados em desenvolver painéis solares, que podem revestir superfícies mais ou menos extensas, como janelas. “Um painel de dois ou três metros quadrados pode ser suficiente para gerar energia em uma casa onde vive uma família de quatro pessoas”, explicou Alves. “Como a relação custo-benefício é boa, pode ser uma opção para levar energia a áreas remotas que não têm serviço elétrico. No Brasil, com mais de 192 milhões de habitantes, há cerca de um milhão de lugares nessas condições”, acrescentou o cientista.

A facilidade do transporte é sua principal vantagem em relação às placas de silício. “Como é simples transportá-las, os custos logísticos são baixos. Além disso, a pessoa pode levar com ela quando mudar de casa”, destacou Alves. O plástico pode ser usado ainda para revestir prédios e recintos como aeroportos ou estádios esportivos, evitando a necessidade de reservar uma área para instalar os painéis solares.

Para alcançar a fórmula que tem o material brasileiro, foram investidos US$ 10 milhões e se prevê que o investimento duplicará no próximo ano. “Agora vamos estudar a melhor forma de dar escala ao produto. No estado atual já é possível comercializá-lo, mas o preço deve ser analisado caso a caso”, explicou Alves. Os recursos investidos, que também possibilitaram a criação do CSEM Brasil, procedem de uma sociedade entre a administradora de investimentos FIR Capital e o Centre Suisse d’Electronique et de Microtechnique. Além disso, o projeto obteve apoio da Fundação de Fomento à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig).

O projeto ainda é mantido reservado, pois está sujeito a segredo comercial. “Este é um mercado de milhares de milhões de dólares, e muitos centros estão atrás desta tecnologia”, pontuou o engenheiro. O anúncio dos pesquisadores de Minas faz parte de uma tendência crescente no Brasil: os investimentos em tecnologias limpas. A Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), empresa estatal vinculada do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, implantou no ano passado o Programa Brasil Sustentável, que distribuirá o equivalente a US$ 10 milhões em linhas de crédito para iniciativas que considerarem a preservação dos recursos naturais.

Segundo a Finep, o programa responde a uma demanda percebida pela instituição, que nos últimos anos destinou US$ 2,3 milhões a 480 projetos com alguma característica verde, 25% deles concebidos para geração de energias limpas. Para o professor e doutor em administração de empresas André Pereira de Carvalho, o aumento de recursos para este tipo de pesquisa se deve a que, tanto os fundos privados de investimento como as instituições públicas, perceberam que esta é uma área lucrativa.

“Estas organizações avaliam principalmente se o produto é bom, possui uma fórmula difícil de ser copiada e tem potencial para ser produzido em escala. Isto vale para qualquer versão, seja uma empresa de tecnologias da informação ou de tecnologias verdes”, explicou ao Terramérica Carvalho, que coordena estudos sobre inovação para a sustentabilidade.

No entanto, se comparado com Estados Unidos, Japão ou Alemanha, o Brasil está nas fraldas em matéria de negócios verdes, mas promete aprender a caminhar a grande velocidade. “Há alguns anos, o empreendedor que queria investir neste setor encontrava muitas dificuldades. Hoje ainda existe a desconfiança de olhá-lo como um mercado mais caro e de nicho, mas já é mais simples obter financiamento”, ressaltou Carvalho. Envolverde/Terramérica

IPS.