JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO - O Estado de S.Paulo
A ascensão de Celso Russomanno (PRB) na corrida municipal em São Paulo é um fenômeno, mas não é um acidente. Não tem causa única, nem motivo principal. É uma conjunção de fatores. Vão de sua origem malufista até a ajuda dos adversários, passando por religião, consumismo e desejo de mudança. Tudo misturado no momento certo deu em Russomanno.
Ele é um fenômeno (por ora) porque, pelo retrospecto, teria uma chance em 93 de chegar ao segundo turno. Em 2008, nas eleições das capitais, só um candidato com menos de 50 comerciais por semana conseguiu ficar entre os dois primeiros - e perdeu. A correlação entre tempo de propaganda eleitoral e sucesso nas urnas é tão forte que se deu de barato que Russomanno seria mais um sem-TV a sumir tão rápido quanto apareceu.
Embora a correlação seja estatística, essa assunção é sempre reforçada pelo marketing. Sendo os estrategistas das campanhas quase sempre marqueteiros que produzem os programas para TV, tendem a dar desproporcional importância ao palanque eletrônico e deixar tudo o mais em segundo plano.
É uma jabuticaba eleitoral. Nos EUA, os estrategistas pensam, os marqueteiros executam - para não haver conflito de interesses entre quem aloca o dinheiro e quem se beneficia dessa alocação. No Brasil, o marqueteiro cobra o escanteio e aparece na área para cabecear - às vezes contra o próprio gol. Não fosse assim, os adversários de Russomanno em São Paulo não teriam demorado tanto para acreditar que ele veio para ficar. Com dez dias de campanha na TV, petistas e tucanos ainda acreditavam que se enfrentariam no segundo turno. Só depois de a segunda bateria de pesquisas mostrar que Russomanno não só resistia como ameaçava crescer mais que a ficha caiu.
De onde veio esse fenômeno?
Não haveria Russomanno se o eleitor paulistano não estivesse farto do prefeito Gilberto Kassab (PSD) e quisesse mudar. O candidato do PRB lidera entre quase todos os segmentos do eleitorado, mas vai especialmente bem entre aqueles que acham o governo do atual prefeito ruim ou péssimo. Russomanno conseguiu personificar o desejo de mudança, mesmo sendo muito conhecido.
Não haveria Russomanno se ele tivesse aparecido agora para a política. O eleitor quer novidade, mas não quer surpresa. E Russomanno orbita o mundo político há 32 anos. Só acha que ele nasceu ontem quem não está prestando atenção. O candidato do PRB veio à luz sob José Maria Marin (atual presidente da CBF), batizou-se sob Paulo Maluf (foi assessor do braço direito e caixa do malufismo, Calim Eid) e crismou-se apadrinhado pelo último vice-presidente do regime militar, Aureliano Chaves.
Comunicador. Não haveria Russomanno se ele não fosse um exímio comunicador. Na mais recente troca de padrinho, deixou o ninho do decadente Maluf para acomodar-se sob o bispado de Edir Macedo na TV Record e no PRB, partido cujo presidente trabalha na Igreja Universal do Reino de Deus e na emissora de TV. No seu "Patrulha do Consumidor", Russomanno usa o que aprendeu apresentando memoráveis bailes de carnaval na Gazeta e o "Aqui Agora" do SBT.
Não haveria Russomanno se ele não caísse no gosto de alguns nichos do eleitorado, como os evangélicos. Eles são donos de quase 30% dos votos paulistanos. Apesar de outros candidatos terem negociado o apoio de seus pastores, bispos e apóstolos, o eleitor evangélico optou majoritariamente por Russomanno - seja porque ele vai bem entre os pobres, onde há mais pentecostais, seja porque o seu discurso "família" lhes cai bem. Ou seja: os líderes evangélicos estão sendo conduzidos por seu rebanho.
Não haveria Russomanno se o Brasil não tivesse sofrido uma explosão do mercado interno e o eleitor não tivesse virado consumidor antes de virar cidadão. Afora Lula, que detonou o processo, nenhum outro político brasileiro compreendeu e soube usar tão bem o consumismo de massa a seu favor. O discurso de defesa dos direitos do consumidor foi adaptado com maestria por Russomanno à política - e de quebra lhe rendeu um cadastro com centenas de milhares de eleitores registrados no seu Inadec.
Não haveria Russomanno se não fossem os adversários. Não só o deixaram em paz até anteontem, como ajudaram ao ponto de lhe arrumar um vice. Tucanos apostando que ele só atrapalharia os petistas e vice-versa. Criaram um clima de disputa tão pesado quanto repetitivo, até saturarem o eleitor com suas picuinhas. A cada vez que José Serra (PSDB) ataca o PT ou o contrário, um eleitor olha Russomanno com mais simpatia - além jogar o rival no colo do candidato do PRB num eventual segundo turno.
E aonde o fenômeno vai chegar? Só o eleitor sabe.