Ao longo da última década, caiu em um terço a desigualdade de renda entre municípios no Brasil. Os rendimentos dos moradores das 557 localidades mais pobres cresceram duas vezes mais rápido do que os das 557 localidades mais ricas. Resultado: o andar de baixo ficou mais parecido com o andar de cima.
Não que o Brasil tenha se transformado na Noruega, pois a renda média das cidades que formam os 10% do topo ainda é quatro vezes maior do que a dos 10% da base. Mas a aproximação dos extremos é boa notícia porque vai contra a tendência histórica brasileira. Dez anos atrás a diferença era de seis vezes.
O encurtamento da distância entre lugares ricos e pobres se deu pelo crescimento acelerado da renda dos municípios do Norte e, principalmente, do Nordeste. Entre 2000 e 2010, o rendimento médio das cidades nordestinas cresceu a uma velocidade 54% maior do que o das do Sudeste, por exemplo.
Os números divulgados até agora pelo IBGE sobre o Censo 2010 associados a outros estudos e pesquisas indicam que as molas que impulsionaram os municípios mais pobres foram as políticas federais de distribuição de renda, como o Bolsa Família, e os repetidos aumentos do salário mínimo acima da inflação.
Essas políticas se tornaram viáveis por causa da estabilização econômica e do controle da inflação ocorridas no período anterior. Mas a redução da disparidade regional só acelerou nos últimos dez anos. Houve uma reversão em relação à década de 90, quando as desigualdades ficaram imutáveis (Nordeste versus Sudeste), ou se aprofundaram (entre Sul e Norte).
As consequências dessa mudança brusca foram sentidas em múltiplas dimensões da sociedade brasileira, dos fluxos migratórios à geopolítica.
Na demografia, diminuiu a evasão populacional dos municípios mais pobres do Nordeste para os mais ricos do Sudeste. Com um cenário menos desigual, muitos viram uma oportunidade para voltar a seus Estados natais. Essa migração de retorno diminuiu a pressão por serviços básicos nas metrópoles do Sudeste. Ganharam quem voltou e quem ficou.
Na economia, o aumento da renda do andar de baixo fez girar um círculo virtuoso de consumo que propiciou o surgimento de um inédito mercado de massa. Pela primeira vez em muito tempo, o PIB (produto interno bruto) do Nordeste cresceu acima do das outras regiões do País.
Na política, PT e aliados se beneficiaram da memória imediata da população e faturaram a mudança cooptando eleitores que antes votavam nos seus adversários. Petistas e socialistas conquistaram governos e prefeituras importantes nos maiores estados nordestinos, como Bahia, Pernambuco e Ceará. Os votos do Norte e Nordeste ajudaram Lula a reeleger-se e a fazer sua sucessora.
E daí?
Não cola mais o argumento segundo o qual a única maneira de equilibrar o peso econômico do Sul/Sudeste é aumentar o peso político do Norte/Nordeste. Os desequilíbrios regionais estão diminuindo e isso não tem nada a ver com a desproporção representativa na Câmara dos Deputados e no Senado.
Ao contrário, a desigualdade entre pobres e ricos está menor apesar de o sistema eleitoral desrespeitar o princípio de uma pessoa um voto. As políticas nacionais de estabilização e promoção da renda básica provaram-se muito mais eficientes no combate às iniquidades regionais do que iniciativas divisionistas e paroquiais.
Destacados de Goiás, os municípios de Tocantins não tiveram desenvolvimento mais rápido do que os dos estados vizinhos. Palmas, a nova capital, sugou os recursos enviados pela União. Funcionou como ralo financeiro e populacional, drenando moradores das outras cidades tocantinenses. Sua renda é 2,5 vezes maior do que a média das demais.
Não é gastando com palácios e inchando burocracias estaduais que os moradores dos pretendidos novos estados de Carajás, Tapajós, Gurguéia e Maranhão do Sul vão melhorar de vida. A divisão beneficia apenas a pequena elite política que administra os recursos públicos. Concentra em vez de distribuir.
A União não faz necessariamente a força, mas sem ela não há redução de desigualdades regionais. Já o divisionismo é atalho conhecido para beneficiar poucos em detrimento de muitos. Além de reforçar o discurso xenófobo e separatista em estados que vão ajudar a pagar a conta. É óbvio: dividir não soma.