segunda-feira, 13 de junho de 2011

Distribuir X dividir, por José Roberto de Toledo (Blog)

Ao longo da última década, caiu em um terço a desigualdade de renda entre municípios no Brasil. Os rendimentos dos moradores das 557 localidades mais pobres cresceram duas vezes mais rápido do que os das 557 localidades mais ricas. Resultado: o andar de baixo ficou mais parecido com o andar de cima.
Não que o Brasil tenha se transformado na Noruega, pois a renda média das cidades que formam os 10% do topo ainda é quatro vezes maior do que a dos 10% da base. Mas a aproximação dos extremos é boa notícia porque vai contra a tendência histórica brasileira. Dez anos atrás a diferença era de seis vezes.
O encurtamento da distância entre lugares ricos e pobres se deu pelo crescimento acelerado da renda dos municípios do Norte e, principalmente, do Nordeste. Entre 2000 e 2010, o rendimento médio das cidades nordestinas cresceu a uma velocidade 54% maior do que o das do Sudeste, por exemplo.
Os números divulgados até agora pelo IBGE sobre o Censo 2010 associados a outros estudos e pesquisas indicam que as molas que impulsionaram os municípios mais pobres foram as políticas federais de distribuição de renda, como o Bolsa Família, e os repetidos aumentos do salário mínimo acima da inflação.
Essas políticas se tornaram viáveis por causa da estabilização econômica e do controle da inflação ocorridas no período anterior. Mas a redução da disparidade regional só acelerou nos últimos dez anos. Houve uma reversão em relação à década de 90, quando as desigualdades ficaram imutáveis (Nordeste versus Sudeste), ou se aprofundaram (entre Sul e Norte).
As consequências dessa mudança brusca foram sentidas em múltiplas dimensões da sociedade brasileira, dos fluxos migratórios à geopolítica.
Na demografia, diminuiu a evasão populacional dos municípios mais pobres do Nordeste para os mais ricos do Sudeste. Com um cenário menos desigual, muitos viram uma oportunidade para voltar a seus Estados natais. Essa migração de retorno diminuiu a pressão por serviços básicos nas metrópoles do Sudeste. Ganharam quem voltou e quem ficou.
Na economia, o aumento da renda do andar de baixo fez girar um círculo virtuoso de consumo que propiciou o surgimento de um inédito mercado de massa. Pela primeira vez em muito tempo, o PIB (produto interno bruto) do Nordeste cresceu acima do das outras regiões do País.
Na política, PT e aliados se beneficiaram da memória imediata da população e faturaram a mudança cooptando eleitores que antes votavam nos seus adversários. Petistas e socialistas conquistaram governos e prefeituras importantes nos maiores estados nordestinos, como Bahia, Pernambuco e Ceará. Os votos do Norte e Nordeste ajudaram Lula a reeleger-se e a fazer sua sucessora.
E daí?
Não cola mais o argumento segundo o qual a única maneira de equilibrar o peso econômico do Sul/Sudeste é aumentar o peso político do Norte/Nordeste. Os desequilíbrios regionais estão diminuindo e isso não tem nada a ver com a desproporção representativa na Câmara dos Deputados e no Senado.
Ao contrário, a desigualdade entre pobres e ricos está menor apesar de o sistema eleitoral desrespeitar o princípio de uma pessoa um voto. As políticas nacionais de estabilização e promoção da renda básica provaram-se muito mais eficientes no combate às iniquidades regionais do que iniciativas divisionistas e paroquiais.
Destacados de Goiás, os municípios de Tocantins não tiveram desenvolvimento mais rápido do que os dos estados vizinhos. Palmas, a nova capital, sugou os recursos enviados pela União. Funcionou como ralo financeiro e populacional, drenando moradores das outras cidades tocantinenses. Sua renda é 2,5 vezes maior do que a média das demais.
Não é gastando com palácios e inchando burocracias estaduais que os moradores dos pretendidos novos estados de Carajás, Tapajós, Gurguéia e Maranhão do Sul vão melhorar de vida. A divisão beneficia apenas a pequena elite política que administra os recursos públicos. Concentra em vez de distribuir.
A União não faz necessariamente a força, mas sem ela não há redução de desigualdades regionais. Já o divisionismo é atalho conhecido para beneficiar poucos em detrimento de muitos. Além de reforçar o discurso xenófobo e separatista em estados que vão ajudar a pagar a conta. É óbvio: dividir não soma.

Pós-consumismo, do blog José Roberto de Toledo

O brasileiro é antes de tudo um consumidor. Na economia, o consumo das famílias impulsionou o maior salto econômico do País em um quarto de século. Na Justiça, a maior parte da pilha acumulada é de ações movidas por consumidores insatisfeitos. Na política, o bolso do eleitor decidiu todas as campanhas presidenciais recentes.
As razões que comandaram esse processo são conhecidas: décadas de estagflação, séculos de exclusão. A histórica falta de renda e de crédito para a maioria da população criou uma demanda reprimida de dezenas de milhões de não-consumidores. Gente que só podia olhar a vitrine.
Quando o dique rompeu, a onda de consumo encheu as lojas, inundou os tribunais e levou de enxurrada tudo o que dificultava o acesso às gôndolas dos mercados. Não se pode dizer que ela lavou a política, mas fez naufragar alguns partidos. Outros emergiram.
As consequências de o Brasil estar se tornando uma nação de consumidores ávidos vão muito além do provinciano confronto PT-PSDB. É uma questão de prioridades, do que é mais importante para os habitantes de Pindorama.
Isso tem impacto direto sobre o exercício da cidadania. Tome-se a pesquisa que a Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas faz a cada três meses em todo o Brasil sobre a confiança no Judiciário e o que motiva alguém a pisar num tribunal.
Pouco menos de metade dos brasileiros adultos declarou já ter movido algum tipo de ação na Justiça. Desses, 1 em cada 3 foi movido por cobranças indevidas, serviços pagos e não realizados, ou seja, por julgarem que seus direitos de consumidor não foram respeitados.
Nenhum outro tipo de demanda judicial provocou a abertura de tantos processos. Nem mesmo as ações trabalhistas (25%), como pedidos de indenização. Tampouco as queixas relativas ao direito da família, como divórcios, pensões, guarda dos filhos.
Do ponto de vista do movimento da Justiça brasileira, o consumidor vem antes do trabalhador, do cônjuge, dos pais. Não se faz aqui juízo moral, não se pretende tachar esse movimento de bom ou ruim. Antes, é preciso constatar sua amplitude.
Fernando Henrique se elegeu presidente após controlar a inflação. Reelegeu-se quando os neoconsumidores temeram que ela voltasse. Quatro anos de estagnação econômica depois, os mesmos eleitores arriscaram uma mudança. Sob Lula, o consumo explodiu. Ele se reelegeu, fez a sucessora.
A cronologia que antepõe o acesso ao consumo à vitória eleitoral soa simplista, mas é factual. Difícil encontrar correlação mais forte nas eleições presidenciais. Em todas, ganhou o candidato que conseguiu vender a si mesmo como o caminho mais seguro do consumidor até o mercado.
Estão erradas todas as pesquisas que sempre apontam educação, saúde e segurança como os temas que mais preocupam os brasileiros? As pessoas mentem aos pesquisadores? Não e não (ao menos a maioria). Mas nem sempre o que se diz a si próprio ser o mais importante é o que se faz primeiro. O mesmo vale para o eleitor.
É politicamente correto declarar que o interesse individual deve se submeter ao coletivo. Mas não é apenas em Brasília que a ordem dessas prioridades é invertida. Na solidão da cabine de votação também.
O resultado da urna não é uma declaração de boas intenções, mas a soma dos interesses individuais da maioria. Se o principal símbolo de status social são os bens que cada um possui, não deveria espantar que o candidato que parecesse mais apto a distribuí-los a mais gente vença.
Pode-se imaginar que isso é uma etapa. Que quando a maioria puder comprar os mesmos carros, roupas e grifes, os sinais de diferenciação social tenderão a mudar.
Pesquisas mostram que uma das ambições do neoconsumidor é ser socialmente aceito nos ambientes que passou a frequentar. Saber “se comportar” é uma preocupação. É sinal de que priorizar de fato a instrução será o passo seguinte ao acesso ao consumo?
Pode ser otimismo, mas é também uma necessidade coletiva. Nenhum país conseguiu sustentar seu crescimento econômico sem investir na qualificação de sua mão-de-obra, ou seja, na educação da população.

Conar restringe propaganda enganosa de empresa ”verde”


08 de junho de 2011


Órgão que autorregula publicidade quer coibir banalização do tema sustentabilidade nas campanhas

Foto © Marc Dumas www.mixmarc.com

Andrea Vialli – O Estado de S.Paulo
A partir de 1.º de agosto, a publicidade veiculada no Brasil não deverá mais enaltecer os atributos “verdes” de um produto ou serviço se as empresas não puderem comprovar essas qualidades. O Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) definiu ontem um conjunto de normas para regulamentar a publicidade que contenha apelos de sustentabilidade.
O objetivo é coibir a banalização da propaganda sobre o tema e evitar que o consumidor fique confuso em relação ao que é um produto verde ou sustentável. “Um anúncio que cite a sustentabilidade deve conter apenas informações ambientais passíveis de verificação e comprovação”, diz a norma. Segundo Gilberto Leifert, presidente do Conar, não se trata de um boicote a esse tipo de publicidade.
“Não estamos buscando punir essas empresas, mas sim elevar o nível da publicidade sobre sustentabilidade”, diz. Leifert ressalta que países como Canadá, França e Inglaterra já limitam a publicidade ambiental, com o objetivo de reduzir o chamado greenwashing – termo que define a propaganda enganosa de atributos verdes de produtos ou serviços.
De acordo com as novas recomendações, as empresas também devem seguir critérios ao anunciar benefícios sociais e ambientais de determinados produtos. “Não serão considerados pertinentes apelos que divulguem como benefício socioambiental o mero cumprimento de disposições legais”, segundo os critérios.
Segundo Leifert, as empresas que descumprirem as normas ficam sujeitas a punições que variam de advertência à suspensão da campanha publicitária e divulgação pública do descumprimento da regulamentação.
Caso emblemático. A discussão sobre a regulamentação da publicidade verde tomou força após a suspensão, em abril de 2008, de duas campanhas publicitárias da Petrobrás. O Conar suspendeu as campanhas, que ligavam o nome da empresa a ações de responsabilidade ambiental, após pedido de análise de um grupo de instituições governamentais e ONGs.
As instituições acusavam a estatal de anunciar um comprometimento com o ambiente que não seria verdadeiro, pois na ocasião a empresa resistia em reduzir o teor de enxofre no diesel, fator de agravamento da poluição nos centros urbanos.
Após a suspensão das peças publicitárias, a empresa aceitar firmar um acordo com o Ministério Público Federal para reduzir o poluente no combustível.
Oportunismo. Na avaliação de Mariana Ferraz, advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a medida é bem-vinda, pois traz clareza a empresas e consumidores. “Hoje vemos uma enxurrada de greenwashing na publicidade. As empresas se vendem como verdes, dizem que plantam árvores, mas ninguém fiscaliza essas ações”, afirma.
“Agora os consumidores poderão utilizar o Conar para denunciar empresas que estejam mentindo nesse campo”, completa a advogada.
Segundo Mariana, recente pesquisa sobre bancos realizada pelo Idec com consumidores mostrou que é grande o ceticismo em relação às boas práticas sociais e ambientais das instituições financeiras. “Nesse caso específico, o consumidor vê a publicidade verde como um oportunismo.”.
De acordo com a advogada, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) já prevê punições a empresas que veiculam propaganda abusiva.